Ao sondar a atriz e poeta Bruna Lombardi para integrar o governo Temer, a senadora Marta Suplicy, com certeza, jogou uma casca de banana em direção à presidente afastada. E, ao repetir o convite a Daniela Mercury e Marília Gabriela, descascou todo o cacho. Por certo, buscava uma imagem ? e imagem vale mil palavras: todos iriam cotejar a elegância flamejante das três com o figurino verde-oliva-goiás-velho da senadora Kátia Abreu em sua posse como ministra, em 2015. A vestimenta trazia ainda o detalhe intrigante de dois botões enormes vermelhos, à semelhança de uma comenda, assim como um cintinho na mesma cor.
Dias depois, a presidente afastada lancetou que o Ministério de seu ex-vice não tinha nem mulheres nem negros. E, mais algumas horas depois, espetou que era uma equipe de velhos, ricos e brancos. Ela certamente não pensou em Jaques ?Passivo? Wagner ao fazer tal pronunciamento à nação de menos R$ 170 bilhões em caixa.
A ideia de cotas tomou conta do tempo livre da presidente afastada. Não percebeu a maldade perpetrada por Marta Suplicy, essa ingrata, em seus convites lançados ao mar. Bruna Lombardi, caso aceitasse, não cumpriria apenas a vaga de mulher, mas também de atriz, poeta, cineasta, voz maviosa e olhos verdes. Um nome, cinco cotas! (ainda não houve quem cobrasse a presença de voz delicada na Esplanada; talvez esse sindicato desatento esteja satisfeito com o tom de Henrique Meirelles).
Marta então mirou Marília Gabriela. De novo, a esperta senadora pensou em deixar em outros maus lençóis de fios petistas a presidente afastada. Seriam quantas cotas a serem preenchidas com aquele anjo loiro? Mulher, atriz, cantora amadora, olhos azuis de enlouquecer e 1,80m de altura. Mulherão. Sim, os baixinhos já conseguiram muitos cargos. De novo, cinco cotas numa tacada. Muito bom, Marta.
Gabi não quis, o que é uma pena. Sua elegância poderia servir como inspiração a Kátia Abreu, Miriam Belchior e Ricardo Berzoini.
A sondagem, então, se estendeu a Daniela Mercury. São várias as interpretações e omissões sobre esse convite à intérprete. Mulher, cantora, gay ? são três coisas óbvias e estampadas em ?Caras? a cada duas edições. Em todo caso, três cotas preenchidas. E que cotas. Jean Wyllys teria de segurar seus perdigotos quando falasse sobre o Ministério. Bolsonaro arrumaria mais um motivo para estar chateado ? e sempre é bom ver o deputado de cabelo em pé: ele não não sabe dançar axé music ou a dança da garrafa. Porém, o golpe de mestre ? mestra, desculpe! ? da senadora Suplicy foi perceber que Daniela Mercury preencheria a cota dos cabelos escuros e cacheados. A presidente afastada teria de engolir sua crítica de que se formou um ministério de velhos ? leia-se: cabelos brancos e ralos. Por fim, Temer economizaria na festa de fim de ano com um show gratuito.
Pensou-se, é certo, no nome de Caetano Veloso. Principalmente por seu lado ?eu sou neguinha? e ?Leãozinho?. Ele defenderia o Ministério diante de várias reivindicações. Mas tudo foi fogo de palha (com todo o respeito), e a ideia, deixada de lado.
De repente, alguém colocou na mesa o nome de Maria Silvia Marques. Uau. A ela seria dada a incumbência de administrar um dos maiores orçamentos da União. Uau. Isso sim seriam várias cotas. Mulher, controlada nos gastos, simpática, competente administradora pública e privada, sabedora da diferença entre faturamento e lucro (ah, Dilma), dos tiques do Eduardo Paes e da tabuada do oito. Não se é possível agradar a todos, e percebe-se uma movimentação estridente entre os números 1 e 3, que não se sentem representados na tabuada do Ministério. Ah, vá lá.
Miguel De Almeida é escritor e editor