Cascavel - Quando agosto chega, vem acompanhado do combo conhecido: cabelo desgrenhado, nariz coçando, casa suja e pano de pó que pede férias. Não é à toa que em Cascavel o mês é chamado de “oficial da ventania”. O ar fica pesado, as folhas voam como confete fora de hora e os moradores viram atletas domésticos tentando manter a casa limpa e a saúde em dia.
Dados do Simepar (Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná) apontam que a capital do Oeste é também a “Capital dos Ventos”, liderando o ranking da ventania. Além do incômodo do pó e da sujeira, outro reflexo desta ventania — que destrói o cabelo das mulheres — é com as frondosas árvores da cidade que, ao balanço do vento e com a estrutura frágil devido ao tempo, acabam desmoronando e trazendo prejuízos.
No dia 4 de agosto, às 11h, uma das principais vias da cidade teve que ser bloqueada pelo Corpo de Bombeiros devido à queda de uma grande árvore, bastante conhecida na cidade por estar há anos sendo apoiada por um “cinturão”. Dizem os vizinhos que o dono do prédio que fica na Rua Minas Gerais esquina com a Rua João Pessoa não queria que a árvore fosse cortada e, por isso, estaria dificultando o corte por parte do Município.
Naquela segunda-feira, o vento típico de agosto, que chegou um pouco mais forte — atingindo 63,7 km/h — levou a árvore com tudo ao chão. Ela acabou caindo inteira, quebrada na raiz, e várias equipes passaram o dia todo no trabalho de remoção da “jacarandá”, que deixou os moradores de toda a região sem energia elétrica. Por sorte, ninguém se feriu; somente danos materiais em quatro veículos que estavam estacionados na via foram causados pela “força da natureza”.
Árvores cansadas, moradores preocupados
O jacarandá foi apenas um dos casos de queda do ano, já que outras tantas árvores caem em diversas regiões da cidade, causando preocupação para motoristas e moradores. Muitas delas, principalmente as de grande porte, podem estar com a saúde comprometida e risco eminente de queda. Atrás de mais informações, a reportagem do Hoje Express fez vários questionamentos à Prefeitura de Cascavel sobre a situação.
A Sema (Secretaria Municipal de Meio Ambiente) de Cascavel ainda não tem dados consolidados nem do número, nem das espécies de árvores que caíram este ano e também ano passado. Além disso, segundo a Prefeitura, mesmo depois das quedas, que se tornaram constantes, “não realizou avaliação técnica específica para identificar a causa, mas, no entanto, estima que aproximadamente 90% das árvores que caíram não possuíam protocolo prévio de solicitação de retirada”.
Como se sabe, para que o cidadão possa cortar ou solicitar o corte de uma árvore, independentemente de onde ela esteja no imóvel, é necessário ter a liberação do Município. Segundo a Sema, todo pedido de corte ou poda de árvores inicia-se com a abertura de protocolo junto à secretaria. Com o registro feito, então, é realizada uma avaliação técnica por profissionais habilitados. Caso o pedido seja deferido, é definido o grau de prioridade do serviço, conforme o risco e a situação constatada.
E aí não tem prazo definido para o serviço ser realizado. E dependendo da prioridade e da demanda existente, é preciso contar com a “sorte” (e ventos fracos) e ter muita paciência.
Quem paga a conta?
Uma dúvida que fica no ar — assim como os ventos — é quem paga a conta, já que a pessoa que estaciona o veículo em via pública e tem prejuízos com a queda de uma árvore pode acionar judicialmente o Poder Público para ter os custos reparados. Questionada sobre o tema, a Sema disse que as “informações referentes a valores pagos em indenizações por prejuízos decorrentes de quedas de árvores estão sob responsabilidade do setor jurídico e não estão consolidadas na Sema”.
Outra dúvida de muitos moradores é para onde vai a lenha das árvores. De acordo com a secretaria, toda a lenha resultante de cortes e podas é destinada ao Provopar, conforme determina a Lei Municipal nº 6.482/15. No entanto, não soube informar qual o valor arrecadado já que, de acordo com eles, a comercialização é feita diretamente pela instituição, sem informação (ou controle) por parte do Município.
Tomógrafo funciona?
Com mais de 88 mil árvores na cidade, em 2023 a Sema adquiriu um “tomógrafo” por R$ 152 mil, equipamento que consegue avaliar a saúde da árvore, informação necessária para deferir ou indeferir um pedido de corte. Questionada sobre a sua utilização, a resposta foi que o “tomógrafo é utilizado sempre que se faz necessária uma análise mais criteriosa e detalhada da condição estrutural da árvore, garantindo maior precisão na avaliação”.
O aparelho promete revelar se o tronco está saudável ou oco, como um raio-X botânico. Bonito na teoria, mas na prática o equipamento depende de equipe especializada — e o serviço continua mais lento que fila de cirurgia eletiva.
Justiça “organiza”, mas não segura os ventos e as quedas
Desde maio deste ano, o Município está proibido de cortar árvores sem o parecer técnico prévio de um profissional de Engenharia Florestal, Agronomia ou Biologia, sendo que cada árvore cortada de forma irregular pode gerar multa de R$ 10 mil. A decisão judicial atendeu a um pedido de liminar do Ministério Público do Paraná em ação ajuizada pela 9ª Promotoria de Justiça, para impedir a derrubada de árvores sem critério.
O MPPR descobriu que, embora Cascavel tenha Plano Municipal de Arborização desde 2015, até 2022 só 35% do diagnóstico das árvores foi feito. Planos de plantio, poda e substituição? Não saíram do papel. O Viveiro Municipal, que deveria ser readequado, segue do mesmo jeito. Resultado: ação civil pública exigindo que a Prefeitura faça o diagnóstico completo, apresente cronograma de cortes com aval do Comam (Conselho de Meio Ambiente) e construa um viveiro digno da cidade das ventanias.
A Sema diz que cumpre a determinação judicial, revisa o plano de 2015 e atualiza o levantamento das árvores. Enquanto isso, a ventania não espera despacho: derruba folha, levanta saia, bagunça cabelo e, de vez em quando, joga uma árvore no chão para lembrar quem manda.
Em resumo: agosto sopra forte, mas o galho sempre cai do lado mais fraco, geralmente sobre o carro de alguém. Melhor estacionar longe das sombras suspeitas e torcer para que o tomógrafo municipal não precise ser chamado às pressas.