Brasil - A suspensão imediata da chamada Moratória da Soja foi concedida nesta segunda-feira (18) pela Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A decisão foi comemorada pelo setor produtivo.
O acordo, que vigorava desde 2008, impedia grandes tradings exportadoras de comprar grãos provenientes de áreas desmatadas na Amazônia Legal após aquele ano. A medida provisória atende a representações apresentadas por entidades do setor produtivo e abre um novo capítulo em uma das discussões mais polêmicas da agricultura brasileira.
A decisão ocorre após longo processo que envolveu a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a Aprosoja-MT (Associação dos Produtores de Soja e Milho do Mato Grosso), além de manifestações da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Segundo as entidades, a moratória impôs prejuízos diretos aos produtores rurais, em especial aos pequenos e médios agricultores que, mesmo atuando em conformidade com o Código Florestal, teriam enfrentado barreiras na comercialização de suas safras.
De acordo com nota técnica divulgada pelo Cade, 30 grandes exportadoras, além da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais) e da Anec (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais), são investigadas sob a acusação de formação de cartel. Segundo a Superintendência-Geral, as empresas teriam constituído um Grupo de Trabalho da Soja para monitorar o mercado e alinhar condições comerciais de compra, prática considerada anticoncorrencial pela legislação brasileira.
Multa de R$ 250 mil ao dia
A medida cautelar imposta pelo Cade é preventiva e tem como objetivo evitar a ampliação de possíveis danos até o julgamento definitivo do caso. Ficou determinado que as companhias devem suspender imediatamente qualquer troca de informações comerciais, auditorias ou relatórios vinculados ao acordo, além de retirar de seus sites os documentos relacionados à moratória. O descumprimento pode resultar em multa diária de R$ 250 mil.
O prazo estabelecido pelo Cade é de dez dias para que as empresas se desvinculem do acordo. Elas poderão ainda optar pela assinatura de um TCC (Termo de Compromisso de Cessação de Conduta), espécie de acordo que prevê o reconhecimento de práticas irregulares em troca de redução das penalidades. Caso o processo resulte em condenação, as associações podem ser multadas em valores que variam de R$ 50 mil a R$ 2 bilhões. Para as empresas, as punições vão de 0,1% a 20% do faturamento bruto do último exercício.
O caso estava sob sigilo desde agosto do ano passado e agora será encaminhado ao Tribunal do Cade. A próxima etapa será o sorteio do relator, responsável por elaborar o voto que será apreciado pelos conselheiros. Não há, até o momento, prazo definido para a conclusão do julgamento.
A decisão foi recebida com entusiasmo pela Aprosoja-MT. Em nota, a entidade destacou que se trata de “um marco histórico na defesa da livre concorrência e da produção legal no campo, que devolve segurança jurídica e dignidade aos milhares de produtores que sempre atuaram em conformidade com o Código Florestal e as leis ambientais brasileiras”.
Na avaliação da associação, a moratória vinha funcionando como uma barreira comercial injusta, restringindo o acesso ao mercado de agricultores que produzem em áreas regulares e licenciadas. “Mais do que uma vitória do setor agropecuário, essa decisão é um passo essencial para o Brasil reafirmar que sustentabilidade e legalidade não se opõem. Reforça ainda que não se pode simular políticas ambientais como pretexto para a exclusão econômica”, afirma o texto divulgado.
Ambientalistas
Apesar da comemoração por parte do setor produtivo, especialistas em meio ambiente e organizações não governamentais devem se manifestar contrários à suspensão. Ao longo dos últimos anos, a moratória foi citada em fóruns internacionais como um dos principais instrumentos de combate ao desmatamento na Amazônia. Grandes importadores da soja brasileira também acompanharam o acordo como uma espécie de garantia socioambiental para a compra do grão.
A decisão do CADE, portanto, reacende um debate que vai além do aspecto concorrencial. De um lado, estão os produtores que alegam restrições injustas ao escoamento de safras produzidas dentro da lei. De outro, a pressão de países e consumidores que associam a produção agrícola brasileira ao compromisso ambiental. O julgamento definitivo poderá, assim, influenciar não apenas a dinâmica de mercado interno, mas também a imagem do Brasil no comércio internacional de grãos.