BOGOTÁ e HAVANA ? Apesar de os colombianos rejeitarem o acordo de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) em plebiscito no domingo, a guerrilha anunciou nesta segunda-feira que manterá um cessar-fogo “bilateral e definitivo”, assim como anunciara o presidente Juan Manuel Santos. O revés, inesperado para o governo e para o líder máximo das Farc, Rodrigo Londoño (“Timochenko”), levou ambos a buscarem uma nova saída política para o conflito armado. farc
? Reafirmamos diante da Colômbia e do mundo que nossas frentes em todo o país permanecerão em cessar-fogo bilateral e definitivo como uma necessária medida de alívio às vítimas do conflito e em respeito ao acordado com o governo ? disse Timochenko, em um vídeo gravado em Havana, onde ocorreram as negociações de paz dos últimos quatro anos.
Mais cedo, as Farc haviam afirmado sua “disposição em retificar o acordo”, de acordo a considerar demandas dos setores que deram o voto pelo “não” ao pacto.
? Mantemos a vontade de paz e reiteramos disposição de usar apenas a palavra como arma de construção para o futuro ? disse Timochenko, que para o jornal ?El Tiempo?, indicou que a guerrilha não voltará à guerra em quaisquer circunstâncias.
Santos convocou todas as forças políticas do país a um diálogo para tentar salvar as negociações de paz, às quais também prometeu manter a trégua.
? Não me renderei. Seguirei buscando a paz até o último dia de meu mandato, porque este é o caminho para deixar um país melhor aos nossos filhos ? declarou Santos em um discurso no domingo à noite na sede da presidência, a Casa de Nariño, ao lado da equipe do governo que negociou o acordo. ? Amanhã mesmo (segunda-feira) convocarei todas as forças políticas ? e em particular as que se manifestaram hoje (domingo) pelo ?não? ? para escutá-las, abrir espaços de diálogo e determinar o caminho a seguir.
Principal nome contra a reconciliação com a guerrilha e defensor do ?não? no plebiscito, o ex-presidente Álvaro Uribe defendeu um ?grande pacto nacional?, mas insistiu em uma revisão dos pontos negociados com as Farc.
? Queremos aportar a um grande pacto nacional, nos parece fundamental que em nome da paz não se criem riscos aos valores que a tornam possível: a liberdade, a justiça institucional, o pluralismo ? disse Uribe. Os cinco pontos do acordo de paz que Uribe quer renegociar
A rejeição ao acordo está sendo considerada um duro golpe ao governo de Santos, colocando em dúvida o processo para superar meio século de violência. O resultado apertado das urnas ? 50,21% para o ?não? e 49,78% para o ?sim? ? evidencia um país dividido sobre como alcançar a paz.
ALTA ABSTENÇÃO
Quase 34,9 milhões de colombianos estavam registrados para comparecer às urnas. Mas o voto não era obrigatório e o índice de participação foi de apenas 37,43%.
Para Carlos Malamud, pesquisador sobre a América Latina do Real Instituto Elcano, a alta abstenção é explicada por vários motivos: as fortes chuvas provocadas pela passagem do furacão Matthew, que afetaram a jornada eleitoral, o triunfalismo da campanha do ?sim? e uma ?certa soberba de suas propostas?.
? A mensagem dos partidários do ?não? sobre o excesso de impunidade calou profundamente ? destacou, antes de explicar a vitória do ?não? como um êxito da campanha de medo de Uribe (2002-2010), para quem o acordo levava o país ao ?castrochavismo? de Cuba e Venezuela.
? O resultado pode ser visto como um triunfo de Uribe ? disse à AFP a analista política Arlene Tickner, da Universidade de Rosario, sobre o atual senador e ferrenho opositor de Santos.
Colombianos recusam acordo entre governo e Farc em plebiscito
GUERRA CIVIL
O desprestígio das Farc também pesou na votação, mais do que os recentes pedidos de perdão às vítimas e o compromisso com a reparação material, a destruição de seu armamento e a reconciliação do país.
O pacto com as Farc, de 297 páginas, buscava terminar com o principal e mais antigo conflito armado das Américas, um complexo emaranhado de violência entre guerrilhas, paramilitares e agentes do Estado, com um balanço de 260 mil mortos e 6,9 milhões de deslocados.
O acordo previa o ingresso das Farc na vida política de forma legal. Seus 5.765 combatentes ? segundo números da guerrilha ? iriam se concentrar em 27 lugares para seu desarmamento e posterior reinserção à vida civil.