
Brasília - Nesta quarta-feira (3), o decano do STF, Gilmar Mendes, assinou uma liminar que altera significativamente as regras para abertura de processos de impeachment contra ministros da Corte — medida criticada como um “freio” institucional ao controle democrático. A decisão, proferida no âmbito da ADPF 1259/2025 (e também da ADPF 1260), determinou que apenas o Procurador-Geral da República, o PGR, poderá apresentar denúncias por crimes de responsabilidade contra magistrados do STF, revogando o trecho da Lei 1.079/1950 que permitia que “todo cidadão” denunciasse. Além disso, elevou o quórum para admissibilidade das denúncias no Senado, de maioria simples para dois terços dos senadores — ou seja, 54 votos favoráveis, em vez dos 41 exigidos até então.
Para muitos juristas e parlamentares, a decisão representa um retrocesso no sistema de freios e contrapesos: segundo eles, o que era previsto como instrumento de controle institucional passa a ser inviabilizado. “O impeachment de ministro foi transformado numa quimera institucional”, disse a advogada especializada em responsabilidade civil Katia Magalhães. Já o constitucionalista Alessandro Chiarottino classificou a liminar como “absurda” e uma afronta à separação dos Poderes — afinal, entende ele, qualquer mudança desse tipo deveria passar pelo Legislativo, não por via judicial.
Além disso, a decisão do ministro impede que decisões judiciais sejam usadas como base para acusações por crime de responsabilidade. Com isso, grande parte das denúncias que fundamentavam os pedidos de impeachment, muitas motivadas por polêmicas relativas a julgamentos e controvérsias de decisões da Corte, ficam inviabilizadas.
O que antes era visto como instrumento de controle externo sobre o Judiciário — com legitimidade popular — passa a depender da anuência de uma só pessoa (o PGR) e de uma maioria elevada no Senado. Para críticos, trata-se de uma “blindagem institucional”.
Congresso reage: Entre indignação e mobilização por mudança legislativa
A reação no Congresso foi imediata e em grande parte unânime: líderes de blocos e parlamentares de diversos partidos classificaram a medida como um “golpe branco” contra a democracia e uma ofensiva contra a prerrogativa constitucional do Senado de fiscalizar o Judiciário.
Além disso, há forte pressão para que a lei do impeachment seja atualizada de forma mais ampla, de modo a tornar o controle sobre o STF mais claro e eficiente — especialmente diante de um cenário de polarização institucional crescente.
Para analistas, a decisão do STF e a reação do Congresso escancaram o nível de desarmonia entre poderes no Brasil: o Judiciário age para se blindar, o Legislativo se sente esvaziado e o controle popular perde espaço — um sinal de deterioração na relação entre os Poderes da República.
A liminar de Gilmar Mendes se soma à crise política desencadeada pela indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias, para uma vaga no STF pelo presidente Lula (PT). A nomeação, marcada por forte resistência no Senado, agravou o desgaste institucional e deixou clara a falta de sintonia entre Executivo e Legislativo.
O senador Davi Alcolumbre, presidente do Senado, reagiu cancelando a sabatina e a votação para o dia 10 de dezembro — inicialmente previstas para os dias 3 e 10 — após o governo não enviar a mensagem formal. Para aliados do Planalto, o gesto representa uma retaliação ao Executivo.
O clima entre os Poderes se torna ainda mais tenso: enquanto o STF se blindava com a liminar, o Executivo tenta emplacar sua indicação, e o Senado resiste, gerando um impasse sobre o futuro da composição da Corte. A combinação dos dois episódios revela a fragilidade dos mecanismos de governabilidade e a vulnerabilidade da harmonia entre os poderes em um momento de extrema incerteza institucional.
A voz do Senado
Davi Alcolumbre reagiu com veemência à liminar de Gilmar Mendes. Em discurso no plenário, o presidente do Senado afirmou que a decisão representa “grave ofensa constitucional à separação dos Poderes” e que, se for preciso, o Congresso responderá com mudança na Constituição para preservar suas prerrogativas.
“As prerrogativas do Poder Legislativo são conquistas históricas e fundamentais para a sociedade, e eventual frustração desses direitos sempre merecerá pronta afirmação aqui, no Senado Federal.”
Alcolumbre também questionou decisões monocráticas do STF que suspendem leis e defendeu a aprovação de emenda constitucional para restringir essas decisões individuais — ressaltando que uma lei aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente não pode ser revogada por ato de um único ministro.