Política

Novo Código Eleitoral corre contra o tempo e contra os pontos que “travam” a votação

Novo Código Eleitoral corre contra o tempo e contra os pontos que “travam” a votação

Brasil e Brasília - Brasília – A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado pode retomar, no segundo semestre, a votação do novo Código Eleitoral (PLP 112/2021), adiada novamente após longo debate na última reunião, em 9 de julho. Relatado pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI), o projeto, de autoria da deputada federal Soraya Santos (PL-RJ), reúne e atualiza sete leis sobre o processo eleitoral brasileiro, mas ainda enfrenta divergências em temas centrais como fake news, voto impresso e quarentena para agentes públicos que desejam se candidatar.
O relator segue confiante de que a proposta seja votada ainda neste ano. Com 877 artigos, o texto busca consolidar toda a legislação eleitoral vigente. “É um código moderno, que reúne normas espalhadas em várias leis. Serão revogadas sete leis para criar uma legislação única”, explicou Castro em entrevista à TV Senado.
Ele afirmou que mais de 90% do conteúdo já tem apoio entre os senadores, mas reconheceu que os três temas mais sensíveis precisarão de negociação ou de votação em separado.

Impasses no Código Eleitoral

Impasses
O primeiro ponto de discórdia é a regulamentação da divulgação de fake news durante campanhas. Para o relator, o direito à liberdade de expressão não pode ser confundido com permissão para espalhar informações falsas que interfiram no resultado das eleições. “Não existe liberdade absoluta. O mundo inteiro está discutindo isso. A União Europeia já impõe multas milionárias a políticos que divulgam conteúdo falso. Os Estados Unidos também têm projetos nesse sentido”, destacou.
Outro impasse é a proposta de quarentena obrigatória para agentes públicos como juízes, promotores, policiais, delegados e militares. Pelo texto atual, essas categorias teriam de se afastar do cargo dois anos antes das eleições.
A medida divide opiniões. Para Marcelo Castro, tais carreiras exigem isenção e não podem ser confundidas com a atividade político-partidária. “São funções que devem prezar pela imparcialidade. Um delegado não pode investigar um adversário político e, depois, ser seu concorrente nas urnas”, justificou.
O terceiro item é a retomada da discussão sobre o voto impresso. O relator reafirmou que o sistema eletrônico brasileiro é seguro, já foi auditado em diversas ocasiões e nunca apresentou fraudes. “Foram quinze eleições com urna eletrônica e nenhuma fraude comprovada”, afirmou.
Ele defende que insistir nessa pauta atrasa o debate e reforça discursos infundados de desconfiança no processo eleitoral.

Análise e Perspectivas

Prazo curto
Na avaliação do consultor legislativo Arlindo Fernandes, especialista em Direito Constitucional e Eleitoral, há ambiente para construir acordos e votar o novo código, desde que as divergências sejam destacadas para deliberação separada. “É um projeto longo, mas com amplo consenso na maior parte do texto. Os itens controversos podem ser votados nominalmente”, explicou.
Segundo Arlindo, o texto revoga legislações antigas, como o Código Eleitoral (1965), a Lei dos Partidos Políticos (1995), a Lei das Eleições (1997) e a Lei da Ficha Limpa (2010), entre outras. Ele lembra que, para que o novo código entre em vigor nas eleições de 2026, o Congresso precisa concluir a votação até o início de outubro. “É uma corrida contra o tempo. O Senado precisa votar em agosto, para que a Câmara analise as mudanças e a sanção presidencial ocorra dentro do prazo de um ano antes do pleito”, detalhou.

Fake news e legislação
Sobre as críticas à criminalização da divulgação de fake news, Arlindo esclareceu que a tipificação já existe no atual Código Eleitoral e é distinta dos crimes contra a honra previstos no Código Penal. “Divulgar fatos sabidamente inverídicos com objetivo eleitoral é um crime específico, de natureza eleitoral, e não se confunde com calúnia, injúria ou difamação”, observou.

Quarentena
O consultor também rebateu as críticas à quarentena exigida para algumas carreiras públicas. Para ele, a medida reconhece a importância institucional dessas funções. “Não se trata de penalizar juízes, promotores ou militares, mas de reconhecer que essas categorias são essenciais ao Estado. Justamente por isso, precisam de um tratamento diferenciado”, argumentou.

Participação feminina
Outro tema que tem gerado debate na CCJ é a reserva de vagas para mulheres. O texto do relator mantém a exigência de 30% de candidatas nas chapas, mas também reserva 20% das vagas efetivamente eleitas às mulheres. 

O que tem motivado as críticas é a retirada da punição para partidos que não conseguirem cumprir o percentual de candidaturas. Segundo Arlindo, a nova regra prevê apenas a perda da vaga não preenchida, sem impugnação da chapa. “É importante esclarecer que se o partido não encontrar candidatas, terá menos candidatos, mas não será penalizado de forma mais grave”, completou. 

Tramitação
O PLP 112/2021 foi aprovado na Câmara em 2021 e aguarda votação na CCJ. Caso aprovado, seguirá ao Plenário. Por se tratar de lei complementar, exige pelo menos 41 votos favoráveis.
A expectativa do relator é que a votação na comissão ocorra ainda em agosto, garantindo tempo hábil para promulgação antes de outubro e validade nas eleições de 2026.

Limites à Justiça Eleitoral
Alguns senadores têm manifestado desconforto com o que chamam de “protagonismo excessivo” da Justiça Eleitoral. O projeto determina que mudanças na jurisprudência do TSE obedeçam ao princípio da anualidade, produzindo efeitos apenas em eleições realizadas após um ano da publicação de novas regras.
Segundo Arlindo Fernandes, o substitutivo apresentado por Marcelo Castro busca limitar as resoluções do TSE sem ferir a separação dos Poderes. “Propostas inconstitucionais, como permitir ao Congresso sustar decisões judiciais, foram retiradas pelo relator. O texto atual respeita o equilíbrio entre os Poderes”, ressaltou.

Voto impresso testado 

Sobre o voto impresso, Arlindo lembrou que o Brasil já testou esse sistema em 2002, sem nenhuma divergência entre os votos registrados e os votos impressos. “Foi um exercício técnico. Mais de cinco milhões de votos foram impressos em algumas regiões, e não houve um único caso de inconsistência”, disse. 

Para ele, retomar a impressão em todos os votos tornaria o processo mais lento, caro e vulnerável a problemas técnicos, sem oferecer ganhos reais à segurança do sistema. Este promete ser mais um ponto de muita polêmica e debates. Como é de conhecimento público, a oposição ao Governo Lula e também alguns partidos de centro defendem a impressão do voto para fins de verificação e auditoria.