?Tenho 60 anos, nasci em Washington D.C. e moro no
condado de Prince George, perto da capital. Sou mãe de três filhos vivos e de um
que foi assassinado por policiais. Me aposentei como executiva em um banco e ,
desde então , sou 100% ativista ? até morrer. Estou à frente da Coalização das
Mães Preocupadas ?
Conte algo que não sei.
Onde vivo, no estado de Maryland, a população negra corresponde a 30%. Porém,
em 2015, 81% dos assassinatos foram de negros desarmados. Antes de meu filho ser
morto, em 2000, eu estava abstraída da realidade sobre a violência policial.
Agora, eu quero trazer pessoas para a discussão e o esclarecimento sobre o
problema. Na coalizão da qual sou presidente, trabalhamos não só com a violência
policial, mas com a violência armada na comunidade: as pessoas de cor estão se
matando.
Na coalizão, vocês precisaram prestar assistência a vítimas
recentes da violência?
Sim. Recebemos na coalizão uma mãe que perdeu a filha, há
cerca de um ano e meio. A moça estava no carro com o bebê e o pai da criança,
quando começaram a ser seguidos pela polícia. Os agentes jogaram granadas e
depois atiraram no carro, matando o casal. Os policiais alegaram que estavam
buscando o namorado, porque ele tinha cometido algum crime, mas mataram ela
também, mesmo com o bebê, que sobreviveu. Não houve acusação, nada
aconteceu.
Houve punição no caso do seu filho?
Meu caso já foi julgado, com nenhum dos dois policiais
punidos. Através de uma ação civil, recebi uma pequena indenização e uma carta
de desculpas do Estado. Em 2000, Gary tinha acabado de perder o pai, de câncer.
Ele foi a uma festa tentar espairecer, e um dos amigos se envolveu em uma briga.
Após tentar apartar, policiais atiraram nele, quando todos já estavam indo
embora. Ele tinha 19 anos.
Seu ativismo começou após sua tragédia familiar. É doloroso
conciliar esses dois lados?
Meu filho e meu marido diziam que eu era uma
batalhadora. E, quando lembro, isso me dá força. Para mim, falar de Gary tem
poder de cura. E isso tudo é maior do que Gary, é um problema global, uma
questão de direitos humanos. Acho que Deus o tirou de mim para colocar esse
propósito em minha vida.
Você é religiosa?
Não, mas sou uma pessoa que acredita na espiritualidade, em um poder
superior. Não vou à igreja todo domingo, mas rezo todos os dia.
A retórica de Trump coloca os policiais em um lugar especial,
certo?
Eu o chamo de número 45 (NR: Trump é o 45º presidente
americano), nem consigo chamá-lo de presidente. A chegada dele nos mostra que
existe, agora, mais motivos para nos prepararmos. Ele vem dizendo que chegou o
momento de a lei e a ordem voltarem, e isso me parece ser um aval para que os
policiais matem ainda mais.
Como é a região do distrito federal americano em termos de
segregação racial e violência policial?
Washington D.C. já foi uma região predominantemente negra até os anos 1970,
1980, mas com a gentrificação, há mais brancos entrando e negros saindo. Muitos
negros vêm para condados como o que eu vivo, de Prince George, no subúrbio da
capital. Conjuntos habitacionais em D.C. estão sendo fechados.
Você acha que figuras pop como Beyoncé e Obama são importantes na
defesa do movimento negro?
Eles precisam ser fiéis a quem eles são, não podem fingir que nada está
acontecendo.