O Brasil é referência mundial na área de transplantes e apresenta o maior sistema público de transplantes do mundo. Cerca de 96% dos procedimentos realizados em todo o País são financiados pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Estatisticamente, o País é considerado o segundo maior transplantador do mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos. Por meio do SUS, os pacientes recebem assistência integral e gratuita, desde os exames preparatórios, procedimento cirúrgico, acompanhamento e medicamentos pós-transplante.
Ainda assim, o assunto merece atenção. Em 2018, aproximadamente 40 mil pessoas estavam na fila de espera por um órgão, segundo dados da ABTO (Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos).
Cristiano Caveião, doutor em enfermagem e coordenador do Curso Superior de Tecnologia em Gerontologia do Centro Universitário Internacional Uninter, explica que o transplante de órgãos é um procedimento cirúrgico para a retirada de um órgão (pulmão, rim, coração, pâncreas, fígado) ou tecido (ossos, córnea, medula óssea) de uma pessoa que está doente e substituição por outro órgão ou tecido normal de um doador vivo ou morto.
“Em grande parte das situações, a doação de órgãos é a única expectativa de vida ou até mesmo a oportunidade de um recomeço para as pessoas que precisam da doação”, comenta Caveião.
O transplante de órgãos só pode ocorrer se tiver a doação, por isso é importante a conscientização da população, com o objetivo de reduzir a fila de espera e dar oportunidades de salvar vidas.
O biomédico, doutor em química e biotecnologia e coordenador do Curso de Biomedicina da Uninter, Benisio Ferreira da Silva Filho esclarece as principais dúvidas em relação ao procedimento. Confira a seguir.
Como funciona a doação pelo doador cadáver?
Essa doação ocorre após a confirmação da morte encefálica, que é a perda total e irreversível das funções cerebrais, e após a parada cardiorrespiratória. A doação pode ser realizada somente com autorização do familiar, conforme previsto na legislação. O diagnóstico de morte encefálica é realizado pelo médico especialista em neurologia, com capacitação específica.
Por que doar órgãos? E que órgãos podem ser doados?
A doação de órgãos pode salvar várias vidas. Podem ser doados os seguintes órgãos: pulmões, coração, pâncreas, fígado, rins, intestino, vasos sanguíneos, pele, ossos e tendões. Assim, um único doador poderá salvar muitas vidas. Os doadores com parada cardiorrespiratória podem doar somente tecidos, como por exemplo: córnea, vasos, pele, tendões e ossos.
E o doador vivo, o que pode doar?
Considera-se doador vivo qualquer pessoa juridicamente capaz, que atenda todos os preceitos legais, e com condições plenas de saúde. Podem doar pela lei parentes de até quarto grau e cônjuges; no caso de não parentes, somente com autorização judicial. O doador vivo pode doar rins, parte do fígado, parte do pulmão e parte da medula óssea.
Quem recebe os órgãos ou tecidos doados?
Após a confirmação da doação, a Central de Transplantes do Estado é comunicada por meio do registro de lista de espera e seleciona os doadores compatíveis.
Homem recebe primeiro transplante de pulmão no Paraná
O primeiro transplante de pulmão realizado no Paraná aconteceu nesta semana no Hospital Angelina Caron, em Campina Grande do Sul, na Região Metropolitana de Curitiba. O Estado é referência em doações de transplantes de órgãos.
“Para nós, é um imenso orgulho podermos contar com a generosidade e amor dos paranaenses que continuam doando e fazendo com que o Estado seja referência em salvar e melhorar a qualidade de vida de tantas pessoas”, disse o secretário de Estado da Saúde, Beto Preto. O procedimento foi feito pelo SUS.
Reinaldo Ferreira de Goes, 57 anos, estava havia dois anos na fila de espera por um pulmão. Esposa e mãe de seus quatro filhos, Valdelice Goes percorreu com o marido cerca de 70 quilômetros, da Lapa até Curitiba, para a cirurgia. “Ele teve um enfisema pulmonar que desencadeou esse quadro mais grave de dificuldade de respirar. Estávamos na fila e colocamos nas mãos de Deus, foi uma surpresa quando nos ligaram”, conta.
O Paraná ainda não tinha o serviço de transplante de pulmão credenciado. O médico Frederico Barth, responsável técnico do Serviço de Transplante Pulmonar do HAC, explica o processo: “É complexo e tem algumas particularidades fundamentais para a recuperação pós-cirúrgica. Além da compatibilidade sanguínea, os pulmões doados devem estar sem sinais de infecção ou indícios de lesões por trauma, e serem compatíveis em tamanho com o receptor. Esses detalhes são fundamentais, por isso a importância da conscientização e busca no aumento das doações de órgãos”.
Sobre o avanço nessa aérea, Barth explica as medidas que o hospital tomou para concretizar este fato inédito. “Há cerca de dois anos, o hospital teve o credenciamento do Ministério da Saúde para esse tipo de transplante. Desde então passamos por vários processos para que estivéssemos aptos. Isso incluiu o treinamento dos profissionais, capacitações hospitalares, aquisições de materiais específicos e a preparação dos pacientes para a cirurgia”.
Dados: 856 transplantes; 119 na fila
Segundo a ABTO (Associação Brasileira de Transplante de Órgãos), ano passado foram 121 transplantes de pulmão no Brasil e 72 de janeiro a setembro deste ano. Apenas três estados estavam aptos para o procedimento (São Paulo, Rio Grande do Sul e Ceará), somando seis equipes atuantes.
Uma série histórica divulgada pela instituição aponta que, em dez anos, o Brasil realizou 856 transplantes desse tipo. Ainda segundo a ABTO, 199 pessoas aguardam na fila de espera por um pulmão no País e oito delas são do Paraná.
Para que tudo isso fosse possível, o órgão precisou ser transportado de Foz do Iguaçu até a Curitiba pelo helicóptero do governo em uma ação integrada da Divisão de Transporte Aéreo da Casa Militar e Grupo de Operações Aéreas da Polícia Civil do Paraná (GOA/PCPR), articulada em apoio ao Sistema Estadual de Transplantes (SET/PR).
A coordenadora do SET/PR, Arlene Terezinha Badoch, explica o motivo da necessidade de apoio aéreo em casos como este. “O tempo de isquemia do pulmão é similar a um transplante cardíaco, de quatro a seis horas no máximo. Por isso a necessidade de transportarmos o órgão imediatamente”.
Recuperação
Segundo informações do Hospital Angelina Caron, o paciente está se recuperando bem após a cirurgia e já respira sem auxílio de equipamentos. Ele permanece em observação na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do hospital.
História
Fundado em 2000, o Hospital Angelina Caron é um centro médico-hospitalar de referência no Sul do Brasil e um dos maiores parceiros do SUS no Paraná. Anualmente, faz 2,07 milhões de procedimentos em pacientes de todo o País, 93% pelo SUS.
A instituição atua em todas as vertentes da medicina e é um centro tradicional de fomento ao ensino e à pesquisa. Com o Serviço de Transplantes de Órgãos entre os mais destacados e reconhecido internacionalmente, o HAC foi responsável por 252 transplantes em 2018. Segundo dados do Sistema Estadual de Transplantes, o hospital foi a instituição com mais procedimentos deste tipo no Estado.