Famílias recompostas, nas quais os filhos dos relacionamentos anteriores de ambos os parceiros crescem juntos, são um grande desafio. Por um lado, é necessário que as questões educacionais sejam deixadas sob a responsabilidade dos pais biológicos evitando imiscuir-se nisso. Por outro lado, não se deve educar cada filho oriundo de relações anteriores do casal de maneira diferente sob pena de a vida familiar se converter em caos. Por exemplo, se um dos pais permite que seu filho assista à TV até determinado horário e a outra parte o proíbe de fazê-lo, gera-se um conflito insolúvel na família. Por isso, é necessário estabelecer um regramento claro que oriente o modo de se comportar de todas as partes envolvidas.
Padrastos e madrastas costumam ter sérios problemas em relação a enteados e enteadas. Problemas, por exemplo, com o pai ou a mãe biológica quanto ao modo de lidar com enteados e enteadas; disputas sobre as regras que regulam as visitas; falta de respeito e consideração de padrastos e madrastas em relação aos pais biológicos e vice-versa; ciúmes em relação aos ex-parceiros, entre outros.
Padrastos e madrastas muitas vezes se comportam com se fossem responsáveis integralmente pelo comportamento dos enteados, incluindo o rendimento escolar. Por exemplo, se o enteado foi responsável por algo grave na escola, não é a madrasta ou o padrasto que deve decidir sobre as medidas de acompanhamento, e sim o pai e/ou a mãe biológica. Qualquer outra coisa unicamente despertará a raiva do filho em relação aos pais adotivos.
O ciúme é um grande veneno nas famílias recompostas quando padrastos ou madrastas se mostram incapazes de reconhecer que têm o companheiro atual à custa do fracasso do relacionamento anterior. Quando, em vez disso, padrasto e madrasta conseguem adotar uma postura respeitosa em relação aos pais biológicos, honram os ex-parceiros, deixam aos pais biológicos a responsabilidade pela educação dos filhos, mostram-se atenciosos em relação ao contato dos pais biológicos com seus filhos, neste caso uma relação cordial e proveitosa pode se desenvolver.
Os casais de famílias recompostas precisam ter consciência de que o enteado percebe que o padrasto dificilmente consegue amar a ele do mesmo modo que aos seus filhos. Não é preciso que o enteado ame o padrasto ou a madrasta. É suficiente que o “papai” ou a “mamãe” ame seu novo parceiro. Por isso, não cabe também que se exija do enteado que chame seu padrasto de pai ou a madrasta de mãe. Vamos complementar essas questões na próxima reflexão na qual trataremos da adoção.
Finalmente, uma palavra sobre a questão se o novo parceiro deve adotar o filho que o outro parceiro traz de sua relação anterior. Esse procedimento é, muitas vezes, justificado sob o seguinte argumento: para que o filho do primeiro casamento possa ter o mesmo sobrenome e não se sinta “excluído”, deve adotar o quanto antes o sobrenome do padrasto. No entanto, precisamente porque o filho do primeiro casamento leva o mesmo sobrenome dos meio-irmãos de um dia para o outro, alguém fica excluído: o pai biológico desse filho! Hellinger se coloca contra a prática de adotar o sobrenome do padrasto: “Isso não é bom porque, então, o filho terá de renegar o pai ou a mãe natural. […] Um filho acha muito difícil renegar os pais” (Hellinger, B. A simetria oculta do amor, p. 122).
JOSÉ LUIZ AMES E ROSANA MARCELINO são terapeutas sistêmicos e conduzem a Amparar.
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