Cascavel – O ministro extraordinário da Segurança Pública, Raul Jungmann, apresentou ontem, durante sua visita a Cascavel, dados estarrecedores sobre a insegurança brasileira. Como justificativa para a criação do Ministério, num desmembramento da Justiça e da Defesa, este último onde Jungmann esteve por 19 meses antes de chegar à Justiça, ele lembrou que somente em 2016 o Brasil registrou 61 mil homicídios. Uma média estarrecedora de sete pessoas mortas a cada hora, sendo uma mulher a cada duas horas. Além disso, foram registrados 50 mil estupros e mais de 1,6 milhão de veículos roubados. “Esses são apenas alguns números que atestam que o crime organizado e a criminalidade, antes regionais, hoje são nacionais e transnacionais que colocam em risco as nossas estruturas”, alertou.
A eclosão da calamidade, tendo sua principal vitrine o Rio de Janeiro com suas 830 comunidades controladas pelo crime organizado pondo 1,1 milhão de pessoas em regime de exceção alijados de seus direitos e garantias constitucionais, não é uma peculiaridade fluminense, estado que está há mais de um mês intervenção federal na segurança. “O que vive o Rio de Janeiro ocorre em toda a federação”, revela o ministro.
Dentre as explicações a essa afirmação está o fato de que durante os 19 meses à frente do Ministério da Defesa, Jungmann recebeu 11 pedidos de Glos (Garantias da Lei e da Ordem). São estados que não deram mais conta de manter a ordem pública e solicitaram as Forças Armadas para fazê-la. “Esta é a face da crise da segurança que vivemos no Brasil e o Ministério [da Segurança] surge dessa necessidade. Toda a sociedade vive com medo e insegura”, afirmou, ao lembrar que dez meses é pouco tempo para semear e colher os frutos.
Jungmann garante que o Ministério da Segurança tem orçamento garantido de R$ 13 bilhões, que não está contingenciado. O ministro da Segurança reforçou que a fronteira, não apenas do Brasil com o Paraguai, mas em toda sua extensão nacional, será uma das prioridades de ação.
Ministério propõe contrato de gestão com estados e municípios
O ministro Raul Jungmann garantiu que recursos adicionais serão colocados à disposição dos estados e municípios na próxima semana. “Mas queremos em troca um contrato de gestão com estados e municípios, queremos que os indicadores mudem, sobretudo relacionados aos homicídios”.
Como todos os trabalhos e as ações aparecem como emergenciais ligados à Pasta, o ministro chama a atenção para mudanças estruturais que mudem o cerne da segurança nacional: “Temos que pensar adiante. Passada a intervenção, deverão ocorrer mudanças constitucionais, a educação fica com 25% dos tributos, a saúde 15% das receitas líquidas e a segurança pública é o único setor que não tem piso, não há regulação de recursos. Desde a Constituição Federal de 1988 a segurança tem ficado para trás. Tivemos a universalização do ensino fundamental, mesmo que com suas precariedades, o SUS, apesar de suas precariedades, se não for cumprido há crime de responsabilidade. Mas e a segurança, como fica?”.
A segurança pública foi colocada nas mãos dos governadores que, dos R$ 81 bilhões aplicados em 2016, R$ 70 bilhões vieram dos cofres dos estados, R$ 9 bilhões da União e o restante dos municípios. “A única área social do País que não tinha piso e algum tipo de defesa era a segurança pública, que despencou com os governos com as crises nos estados e isso se soma à nacionalização do crime. Foi dentro de presídios e penitenciárias do Brasil que nasceu o PCC, o Comando Vermelho, o Sindicato do Crime, os Amigos dos Amigos, a Família do Norte [as maiores facções criminosas hoje em atuação no Brasil]. Em qualquer penitenciária há presos coordenando e comandando o crime que está nas ruas”, denuncia.
“Somos os recrutadores dos jovens que estão indo para o exército do crime”
O ministro Raul Jungmann reforçou a tese que tem permeado seus discursos de que o Brasil prende muito e prende mal. “Somos os recrutadores dos jovens que estão indo para o exército do crime organizado dentro do sistema prisional brasileiro. Ali deveria ser o lócus [sinônimo] de onde o Estado deveria se posicionar e manifestar sua máxima capacidade de imposição e cumprimento das regras e é justamente lá que está quem comanda o crime organizado”, alertou.
Durante o período em que esteve na Defesa, Jungmann realizou 33 vistorias em penitenciárias de sete estados onde estavam 22 mil apenados. Metade deles, ou seja, 11 mil, estava armada dentro da prisão. “Esta é a nossa realidade. Não dá para continuar jogando jovens nas prisões para que se tornem soldados do crime, mas é preciso reprimir os que se desviaram com a mão dura e firme da lei e cortar a cadeia de comando de quem traz medo e insegurança (…) Criar o ministério e determinar a intervenção foi um ato de coragem do governo e vamos responder com mais recursos, mais repasses e políticas nas diversas áreas de segurança”, reforçou.
Vant vai voltar a operar
Com a terceira maior faixa de fronteira do mundo feita com dez países e com 17 mil quilômetros de extensão, o ministro Raul Jungmann admitiu a dificuldade de controle. Mas, segundo ele, um importante mecanismo para investigação de crimes transfronteiriços que está encaixotado há pelo menos dois anos deverá voltar a alçar voos. Ele garantiu que pelo menos os dois Vants (Veículos Aéreos Não Tripulados) que estão na base no hangar em São Miguel do Iguaçu voltarão a operar. “O problema era o custo de manutenção, porque o custo maior já havia sido pago que era a compra, então vamos colocar mais recursos na Força Área Brasileira, que será uma parceria neste projeto e que tem capacidade de manutenção de aeroportos, tem gente preparada. Isso fará com que os Vants voltem a funcionar”, destacou, só que sem precisar data nem onde estariam os outros três Vants denunciados pela reportagem nesta semana e que ninguém conhece o paradeiro.
Nova operação
Ainda no sentindo de contingenciar o avanço do crime organizado pela fronteira com o Paraguai, uma das principais portas de acesso para armas, drogas e munições às facções criminosas de todo o País, o ministro anunciou que começa neste fim de semana uma operação coordenada pela PRF (Polícia Rodoviária Federal) que terá a parceria da Polícia Militar do Paraná. “O foco é o trabalho de inteligência, é ele quem golpeia o crime e quebra a cadeia de comando. Vamos trabalhar em conjunto e ostensivamente”, destacou.