
Cascavel - “A suspensão gera um sentimento inicial de revolta. Porque essa decisão não aconteceu antes? Porque só está acontecendo agora? mas também de alívio, de que outras famílias não vão sentir a dor que a gente está sentindo. Talvez esse seja o primeiro passo para não acontecer o que aconteceu com os nossos familiares. Então, um misto de revolta e alívio, mas uma sensação de que estamos no caminho certo, que as nossas dúvidas com o tempo e da forma correta, da forma legal, serão respondidas”.
A afirmação é da Bianca Faller, primeira tesoureira da Associação dos Familiares das Vítimas do Voo 2283, que acompanha de perto as notícias que se tornaram destaque desde a semana passada com a notícia da suspensão temporária da Voepass, por ausência de capacidade de garantir a segurança dos seus passageiros. A reportagem do Jornal Hoje Express conversou com ela, que representa centenas de pessoas que perderam seus entes queridos no dia 9 de agosto do ano passado, com a queda do Voo 2283, que decolou de Cascavel com destino ao Aeroporto de Guarulhos, mas caiu na cidade de Vinhedo (SP).
Fiscalização dura!
Faller disse que o grupo acompanhou as reuniões que ocorreram no Senado Federal e pediram rigidez no processo, atenção redobrada e mais fiscalização porque não desejam para ninguém o sentimento que hoje carregam. “O que fica é um sentimento de revolta muito grande por não ter sido visto antes que talvez tivessem eventuais falhas na manutenção, nas aeronaves e que talvez uma decisão de suspensão tivesse impedido os nossos familiares de entrarem naquele voo e acontecer o que aconteceu. Mas também é um alívio que essa medida foi tomada e que eles estão atentos”, disse.
Sobre a afirmação da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) que manifestou que a decisão de suspender as operações da Voepass tem vínculo com o acidente de Voo 2283, os familiares acreditam que as razões da fundamentação da decisão realmente não são atribuídas ao acidente, mas ressaltam que se não tivesse a operação assistida instaurada em razão do acidente, talvez não tivessem sido identificadas as irregularidades e falhas no sistema de segurança que comprometem o fator principal do voo: a segurança.
Entretanto, para Bianca Faller, “existe uma correlação sim”. A operação assistida só foi implementada pela Anac depois que aconteceu a tragédia e foi por meio dela que a decisão foi tomada. A agência determinou que a Voepass fizesse algumas alterações e mudanças, junto com medidas cautelares para a segurança e foi constatado, em fevereiro, que a empresa não adotou as medidas o que coloca a segurança dos voos em risco – outra vez!
“Antes tarde do que nunca”
Bianca Faller contou que nesta semana a diretoria da Associação esteve reunida com a Anac, para entender a decisão da suspensão da Voepass sete meses depois do acidente. Durante o encontro, a Agência reiterou que a decisão não há vínculo (“castigo”) entre a decisão e o acidente, mas foi resultado da operação assistida na empresa, realizada de outubro até fevereiro que constatou as falhas que comprometiam os sistemas de segurança da empresa. “Nosso questionamento que ficou, e inclusive foi apresentado, será que se não houvesse acontecido à tragédia, teria sido realizada essa operação assistida mais de perto da empresa?”, questionou.
Durante o encontro a diretoria também apresentou questionamentos técnicos dos processos de denúncia envolvendo a empresa, em relação à aeronave que caiu, como falhas no sistema de manutenção, no sistema de antigelo e degelo. A Anac informou que todas as denúncias foram investigadas e que foram sanadas as irregularidades pela empresa e que, inclusive o treinamento de todos os profissionais envolvidos no voo estava em dia.
Litígio
A Anac esclareceu também que muitas das multas que não foram pagas pela Voepass, denunciadas nesta semana, não foram quitadas porque ainda estão em litígio judicial e a Agência segue discutindo a questão. “Nossa reunião foi proveitosa porque esclareceu muitas das nossas dúvidas, mas ainda temos muitas dúvidas e sérias, mas a gente acredita que com o tempo serão sanadas. Queremos estar por dentro das investigações e estar à disposição”, finalizou.
Sem segurança, Voepass não voa!
Desde o dia 11 de março, a operações aéreas da Voepass, formada pela Passaredo Transportes Aéreos e pela Map Linhas Aéreas, estão suspensas por determinação “cautelar” da Anac. Em nota, a Anac informou que passageiros atingidos pelo cancelamento de voos da Voepass devem procurar a empresa ou a agência de viagem responsável pela venda do bilhete para reembolso ou reacomodação em outras companhias. De acordo com o comunicado, a Voepass conta atualmente com seis aeronaves e as operações da companhia incluem 15 localidades com voos comerciais e duas com contratos de fretamento.
Cascavel não teve reflexos com suspensão da Voepass
A suspensão da operação da companhia aérea Voepass não impactou a demanda do Aeroporto Regional de Cascavel já que a empresa deixou de operar na cidade desde 1º de setembro de 2024, poucos dias após o trágico acidente do Voo 2283. Atualmente, Cascavel conta com três empresas aéreas operando regularmente: Azul, Latam e a Gol, com destinos para Curitiba, Campinas e Guarulhos.
De acordo com a diretora do aeroporto, Jocemara Lopes, por enquanto não há outra empresa para ocupar o espaço deixado pela Voepass. “Temos dias com até sete voos e para diversos destinos do mundo, não tivemos impacto com a suspensão da empresa, porque logo que parou a operação em Cascavel, a Latam disponibilizou mais dois voos semanais”, informou.
Sem prejuízo
Jocemara Lopes explicou ainda que a Voepass operava com o ATR que tinha capacidade para 70 passageiros, mas que a Latam passou a operar com o A 320 que tem capacidade para até 186 passageiros. “Cascavel não perdeu com a saída da empresa, ganhou mais qualidade e mantemos a nossa média de passageiros”, disse. De janeiro a março deste ano foram 897 movimentações, número maior do que no ano passado que fechou em 854.
Vistoria da Anac
Durante esta semana os técnicos da Anac estiveram em Cascavel para fazer uma vistoria in loco nas operações. Segundo a diretora, é uma vistoria periódica que iniciou há cerca de 15 dias e que terminou nesta semana. “A Anac tem agora uma metodologia diferente e temos que cumprir tudo o que determinam, além de termos que executar um plano de gerenciamento e de segurança de forma compartilhada, isso devido a classe do nosso Aeroporto que passou de classe I para classe II”, explicou a diretora Jocemara.
Ela lembrou ainda que a mudança da categoria ocorreu no dia 4 de janeiro deste ano e que foi possível porque o Aeroporto manteve mais de 200 mil passageiros nos últimos três anos. Com isso, muda a relação com a Anac e aumenta a segurança, passando de 13 para 26 bombeiros aeródromos e de 1 para 2 caminhões de combate a incêndio. Para subir para a classe 3, a movimentação anual precisa ser superior a um milhão de passageiros e com isso, também aumentam as exigências.