RIO – A crise no sistema penitenciário brasileiro foi um dos temas abordados durante o encontro ?E agora, Brasil??. Ao responder questões levantadas pelos jornalistas Míriam Leitão e Merval Pereira sobre o assunto, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, lembrou dos ensinamentos deixados pelo educador e antropólogo Darcy Ribeiro. Assim como o estudioso, a ministra relacionou a falta de investimentos na Educação ao crescimento da violência no país.
? Nós precisamos saber o que fazer para termos educação de qualidade, para poder mudar ? disse a presidente do STF, ao destacar uma declaração dada no início dos anos 1980 por Darcy Ribeiro:
? A previsão foi feita em 1982. Darcy Ribeiro dizia naquela ocasião que ?se continuarmos a não investir em Educação e não construirmos escolas, daqui a 30 anos, além de construirmos mais e mais prisões, não caberá todo mundo (nos presídios). E agora, eu estou vivendo exatamente isso ? disse a ministra, referindo-se à sua atribuição de supervisionar o sistema prisional, como presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Ela avaliou que o país acumulou um ?tempo perdido? nos últimos anos, por não ter feito os investimentos necessários em Educação. Disse que as rebeliões ocorridas no início deste ano nos estados de Amazonas, Rio Grande do Norte e Roraima, embora passem pela falta de investimentos nas áreas educacional e social, tiveram razões diferentes:
? Para os senhores terem uma ideia dos desafios que temos no Brasil, há situações como a ocorrida no início deste ano, quando estourou a crise prisional. Eu já venho tratando do assunto desde o ano passado. Descubro que a imprensa toda fala em rebeliões em tal e tal lugares, e o Brasil não é capaz de entender que são situações completamente diferentes. O que aconteceu no Amazonas foi uma situação e o que aconteceu no Rio Grande do Norte, foi outro caso.
CADASTRO REUNIRÁ PRESOS
Além de acompanhar a crise no sistema prisional e trabalhar em socorro ao Executivo, a presidente do STF enumerou iniciativas feitas pelo Judiciário para tentar conter o crescimento do problema. Entre elas está a radiografia da população penal. Até hoje, o Brasil não tem um cadastro eficiente que possa identificar quantos e quem são os presos que ocupam as celas dos presídios.
? Não se tem o nome de todos os presos no Brasil. Estou construindo um cadastro. Se são 600 mil presos, 750 mil, nós não temos isso, em nenhum lugar ? explica Cármen Lúcia, ainda sem uma previsão para o término do trabalho. ? É uma tarefa difícil. Eu sei que, nos próximos 18 meses, nós não vamos acabar, de jeito nenhum, de cumpri-la. Vou fazer a minha parte. Costumo dizer que eu quase durmo naquele Supremo. Vou fazer milagre? Não. Eu faço Direito. Milagre é com ele lá em cima.
Problemas como a crise no sistema prisional tiram o sono da presidente do STF:
? Costumo dizer que, quando eu era menina, uma tia dizia para minha mãe: ?Eu não dormi essa noite de preocupação?. E eu, com meus 7, 8 anos, pensava: ?Perder sono por causa de preocupação??. Agora eu passo uma noite inteirinha igual a um galo de pé queimado, para cima e para baixo, dentro de casa, morrendo de preocupação com o que vai acontecer com o Brasil no dia seguinte.