Cotidiano

PEU das Vargens ganha novo texto da Prefeitura do Rio

2016 881832410-201601201649203131.jpg_20160120.jpgRIO – No fim das atividades da Câmara Municipal, em 2015, duas decisões abriram caminho para profundas mudanças nas Vargens. A aprovação da Lei Complementar 160, que flexibiliza exigências para a regularização dos condomínios, demanda histórica dos moradores; e o envio, pela prefeitura, do Projeto de Lei 140, que trata dos parâmetros para a Operação Urbana Consorciada (OUC) no local, e define o novo Plano de Estruturação Urbana (PEU) das Vargens, suspenso desde 2009. Com isso, o poder público repete o modelo realizado no Porto e tenta promover investimentos em infraestrutura, num prazo de 35 anos, por meio da iniciativa privada.

O modelo de parceria público-privada (PPP) teve um estudo, encomendado em meados de 2015 pela prefeitura e realizado pelas construtoras Odebrecht e Queiroz Galvão, ao custo de R$ 12 milhões. A operação, caso a lei seja aprovada, será viabilizada através da comercialização de Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepacs), ou seja, as construtoras pagarão contrapartidas pelo direito de erguer prédios maiores. O objetivo da prefeitura é ordenar o crescimento da região. O texto autoriza o Poder Executivo a emitir 13,4 milhões de Cepacs com valor mínimo de R$ 650 cada.

Com tantas promessas de transformação, a OUC e o PEU não são unanimidades. Para o arquiteto e urbanista Canagé Vilhena, há duas falhas no projeto de lei: a falta de representatividade e de consulta popular; e a ausência de um plano detalhado de desenvolvimento.

? O Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano do Rio, de 2011, determina que deve haver um projeto detalhado para desenvolvimento de regiões da cidade que não têm infraestrutura adequada. O PEU na verdade não contempla isso, pois é só um código de obras, e a prefeitura explora essa confusão. A OUC tem 35 anos de prazo, mas no dia seguinte à sua aprovação já será possível construir prédios de até 18 andares, dependendo do zoneamento. Acho que aqui deveria ser como no Jardim Oceânico, com uma limitação de até três pavimentos ? afirma Canagé.

O urbanista destaca outro artigo, que se refere à formação do conselho consultivo:

? Determina seis integrantes do poder público e três da sociedade civil. Só que os últimos precisam ser escolhidos pelos demais. Assim a representação popular torna-se minoritária.

Já Rogerio Appelt, presidente da Comissão de Acompanhamento do PEU, acredita que a nova proposta é razoável.

? Baixaram um pouco o gabarito em relação ao PEU anterior, mas agora existirá a obrigatoriedade da contrapartida, o que acho justo. O novo texto privilegia mais as vias secundárias. Antes se restringia à Estrada dos Bandeirantes. Outra vantagem foram os descontos, mesmo que pequenos, para quem preservar a natureza nas obras ? diz Appelt, em relação a certas isenções, como a de 10% na outorga para a construtora que criar uma reserva natural no terreno.

2016 881045256-201601170731130529.jpg_20160117.jpgSua preocupação quanto à OUC, porém, está no modelo de execução, via Cepac.

? O interesse das construtoras foi superdimensionado no Porto Maravilha, e a Caixa teve que arcar com grande parte do aporte financeiro ? diz.

Na época do lançamento do projeto, a prefeitura prometia estudar a viabilidade de questões como a universalização do saneamento básico, a macrodrenagem de canais, BRT e criação de circuito cicloviário e de parques ecológicos. O texto enviado à Câmara, porém, não detalha esses pontos.

? O projeto não entra em detalhes com relação a infraestrutura e mobilidade. Nosso papel é acompanhar e sugerir melhorias ? diz Jorge Lopes, membro da Comissão de Acompanhamento do PEU.

Segundo a prefeitura, o papel do Projeto de Lei é discutir a ocupação na região. Só a partir disso os serviços de infraestrutura serão detalhados, mas saneamento e mobilidade são prioridades, e não necessariamento serão privatizados. E rechaça a visão de que o PEU é um ?código de obras? e diz que é uma legislação que determina áreas específicas a serem adensadas, enquanto que o Plano Diretor citado ?compreende áreas de macroplanejamento?.

Condomínios: legalização está próxima

Se a OUC ainda não é um projeto totalmente factível para os moradores, a aprovação da lei para regularização dos condomínios das Vargens vem mobilizando muita gente na região. Na semana passada, uma reunião foi realizada na sede da Associação de Moradores de Vargem Grande, para esclarecimentos gerais. Segundo Rogerio Appelt, a sensação é de que os técnicos da Secretaria municipal de Urbanismo (SMU) ainda não estão totalmente a par da nova legislação. A orientação da comissão de acompanhamento, então, foi de que os interessados se limitem a dar entrada no processo de legalização, sem a contratação de projetos por arquitetos. Os protocolos devem ser abertos até junho.

? Eu não tenho dúvidas de que a lei traz questões novas, que ainda não foram totalmente compreendidos pelos técnicos da SMU ? diz ele.

2016 881830850-201601201642203123.jpg_20160120.jpgA Lei 160 foi aprovada no dia 15 de dezembro do ano passado. A proposição da lei foi enviada por Eduardo Paes em março de 2015 e o texto final aprovado, que também contempla Itanhangá, foi definido após audiências públicas e ajustes específicos promovidos pela Comissão de Assuntos Urbanos da Câmara dos Vereadores, presidida pelo vereador Chiquinho Brazão (PMDB). Procurada, a SMU esclareceu que a lei ainda está em fase de regulamentação, sendo estudada pelos técnicos.

O grande trunfo da nova legislação, dizem os moradores, é a flexibilização de uma série de exigências para a regularização dos condomínios construídos até 2013. Em contrapartida, haverá pagamento de mais-valia. Appelt estima que existam mais de 500 condomínios irregulares nas Vargens atualmente.

A saga pela legalização do condomínio Serra Dourada, onde vive o comerciante Franco Cesário, começou em 2004, mas o processo não foi adiante por causa da exigência de urbanização externa.

? Pela lei antiga precisaríamos urbanizar um trecho de cerca de dois quilômetros. Somos 19 casas ao todo e era inviável dividir um custo desse tamanho, que estava na casa dos milhões de reais. ? explica Cesário, que participou das reuniões durante a elaboração da lei. ? Se eu quisesse vender a minha casa, não poderia. Não legalmente. Porque o comprador não teria o registro.

Nas Vargens, é comum encontrar pessoas que têm registros dos loteamentos, mas não o registro individual dos imóveis. Há mais de um ano, porém, o Ministério Público proibiu que cartórios registrassem frações de terreno, pois configuraria parcelamento irregular do solo, o que esfriou ainda mais o mercado imobiliário no local. Para Appelt, essa medida foi coerente:

? Dessa forma, impediria o nascimento de uma escritura irregular. O prejuízo é que não se poderia mais vender casas legalmente. Mas com a nova lei você regulariza o condomínio e depois lança o registro da unidade.

2016 881831967-201601201645183126.jpg_20160120.jpgSíndico do Atlântico Sul, Mauro Monteiro também celebra os possíveis efeitos da nova legislação. O preço do metro quadrado nos bairros está em ascensão e pode aumentar ainda mais. De acordo com pesquisa do portal imobiliário Viva Real, numa comparação entre o último trimestre de 2013 e o de 2015, o metro quadrado em Vargem Grande aumentou 20,6% e o de Vargem Pequena 23,7%. Monteiro acredita que agora os imóveis da região poderão ser valorizados em cerca de 55%.

? Alguns corretores nos passaram essa estimativa. O país está em crise e moramos num local privilegiado. Esse é um ganho que nem todos imaginavam ? explica Monteiro, acrescentando que seu condomínio está com a situação adiantada. ? São 95 unidades e 99% estão com a papelada entregue. Aqui nós temos urbanização, mas sem essa lei o processo demoraria muito mais. Seria difícil, mas não impossível. O bom é que ganhamos tempo.

Marcello Machado, morador do Condomínio Bosque Verde, tenta a regularização há oito anos. Ele espera que, agora, a prefeitura consiga agilizar os processos.

? Falta comunicação entre os órgãos públicos. Seria interessante que a prefeitura deslocasse técnicos para essa demanda ? opina.