
Cascavel e Paraná - Para fechar em grande estilo o Ano Internacional do Cooperativismo, pela primeira vez na história, uma mulher assume o comando de uma das entidades mais respeitadas do cooperativismo mundial, a OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras). Em entrevista exclusiva ao Jornal O Paraná, ela fala dessa nova missão e destaca a representatividade da região Oeste no cenário cooperativista nacional.
Formada em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí – Univali, ela é pós-graduada em Direito Processual Civil, Direito Civil e Direito Público, e em Direito e Gestão dos Serviços Sociais Autônomos, pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Há 15 anos, trabalha para o fortalecimento do movimento cooperativista e, nessa jornada, ocupou diferentes posições no Sistema OCB, Organização das Cooperativas Brasileiras, como a gerência de Relações Institucionais, área que ajudou a consolidar.
Foi a primeira mulher a ocupar os cargos de gerente-geral e superintendente do Sistema OCB, posição que assumiu em setembro de 2021. Em dezembro de 2025, assumiu a presidência executiva do Sistema OCB. Tania também foi eleita, em dezembro de 2024, para a presidência do Instituto Pensar Agropecuária, e é membro do Conselho Superior do Agronegócio (Cosag) da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp). Em 2021, foi reconhecida como uma das 100 mulheres mais poderosas do agronegócio brasileiro pela revista Forbes. É pioneira em muitas instâncias do cooperativismo e atua diariamente para garantir maior participação feminina em posições de liderança.
Ela sucede Márcio Lopes de Freitas, que esteve à frente da OCB nos últimos anos. Ao falar para O Paraná, ele abordou os desafios enfrentados e destacou a consolidação do cooperativismo como força estratégica para o desenvolvimento do País. “Tivemos desafios enormes, no Brasil e no mundo, mas avançamos de forma consistente na modernização da representação cooperativista e na consolidação do cooperativismo como força estratégica para o desenvolvimento do País”.
O Paraná – Depois de ser a primeira mulher a ocupar o cargo de superintendente da OCB, como encara agora essa nova missão de ser também a primeira mulher a presidir a OCB?
Tania Zanella – Assumir a presidência executiva do Sistema OCB é uma missão que carrego com enorme senso de responsabilidade e propósito. Ser a primeira mulher nesse papel tem um significado especial, porque mostra que o cooperativismo brasileiro reconhece a força da diversidade e a importância da representatividade. Mas, acima de tudo, encaro esta função como continuidade de um trabalho coletivo. Nada no cooperativismo se constrói de forma individual. Estou aqui para somar, para fortalecer nossa agenda estratégica e para garantir que o setor siga crescendo com modernização, diálogo e visão de futuro — sempre honrando aqueles que abriram o caminho antes de nós.
O Paraná – Desde quando e de que forma o sistema cooperativista passou a fazer parte de sua vida?
Tania Zanella – Minha conexão com o cooperativismo começou cedo, ainda na época em que trabalhava diretamente com produtores rurais e vivenciava de perto os desafios do campo. Venho de uma família cooperativista: cresci em Santa Catarina, onde o movimento faz parte do cotidiano das pessoas e da economia, e meu pai sempre foi cooperado. Foi ali que percebi o quanto a cooperação transformava realidades, fortalecia famílias e gerava oportunidades em que, muitas vezes, o mercado tradicional não chegava. Quando cheguei ao Sistema OCB, em 2008, essa percepção se tornou um compromisso. Passei a atuar diariamente para que mais pessoas experimentassem o impacto positivo desse modelo, que é econômico, social e profundamente humano.
O Paraná – O cooperativismo é um dos modelos mais eficientes relacionados à agricultura e à pecuária. O que precisa ser feito para ficar ainda melhor?
Tania Zanella – O cooperativismo agropecuário brasileiro já é referência mundial, mas temos espaço para avançar ainda mais. Podemos ampliar nossa atuação em três frentes estratégicas: inovação, agregação de valor e sustentabilidade. No campo da inovação, é fundamental intensificar investimentos em tecnologias de precisão, bioeconomia, soluções digitais e práticas regenerativas. Em agregação de valor, precisamos fortalecer cadeias produtivas, expandir mercados e estimular que mais cooperativas invistam em industrialização. E, por fim, devemos continuar integrando sustentabilidade à estratégia de negócio — não como exigência, mas como diferencial competitivo. Tudo isso mantendo o que sempre nos guiou: o foco nas pessoas e no desenvolvimento dos territórios.
O Paraná – Quais são os principais desafios enfrentados pelo sistema cooperativo brasileiro diante das transformações econômicas, tecnológicas e regulatórias?
Tania Zanella – Vivemos um momento de mudanças muito rápidas, e isso exige do cooperativismo um esforço contínuo de adaptação. Entre os principais desafios, destaco a necessidade de modernizar marcos regulatórios, especialmente em setores como crédito, saúde e agro; a urgência de ampliar a segurança jurídica, garantindo previsibilidade para investimentos; o aumento da complexidade tecnológica, que demanda novas competências e forte cultura de inovação; e a pressão global por modelos produtivos mais sustentáveis. O Sistema OCB tem atuado de forma proativa nessas agendas, dialogando com o governo, com o Congresso e com os órgãos reguladores para assegurar que as cooperativas continuem competitivas e capazes de gerar desenvolvimento em todo o País.
O Paraná – Qual a importância da região Oeste do Paraná no contexto de desenvolvimento do setor cooperativista?
Tania Zanella – O Oeste do Paraná é um dos maiores símbolos da força do cooperativismo brasileiro. É uma região que combina alta produtividade agrícola, capacidade de inovação e um forte espírito comunitário. Ali, as cooperativas ultrapassam os limites de simples estruturas econômicas — são motores de desenvolvimento regional. Elas geram emprego, agregam valor, levam tecnologia ao campo e criam oportunidades para pequenos, médios e grandes produtores. O Oeste paranaense é, sem dúvida, um dos melhores exemplos de como o cooperativismo transforma um território e projeta o Brasil para o mundo.
O Paraná – 2025 foi um ano difícil por conta de alguns entraves, mas as cooperativas novamente se sobressaíram. Qual foi a fórmula para não se abater diante das adversidades?
Tania Zanella – A grande força das cooperativas sempre esteve na sua capacidade de resiliência. Em 2025, isso ficou ainda mais evidente. O setor enfrentou desafios complexos, mas manteve a estabilidade porque tem três pilares muito sólidos: gestão profissional, planejamento de longo prazo e união entre os cooperados. Em momentos de crise, enquanto muitos modelos se fragmentam, o cooperativismo se fortalece. As decisões são compartilhadas, os riscos são divididos e o foco permanece no desenvolvimento das pessoas e das comunidades. Essa combinação é, na prática, a fórmula que permite ao cooperativismo atravessar dificuldades e seguir crescendo de forma sustentável.
OLHO
“Nada no cooperativismo se constrói de forma individual; é o trabalho coletivo que sustenta o crescimento e a força do setor”
“Em momentos de crise, enquanto muitos modelos se fragmentam, o cooperativismo se fortalece ao compartilhar decisões, riscos e propósito”