Odescalabro das finanças federais e a situação de calamidade financeira estadual não devem ser as únicas preocupações do contribuinte carioca. Apesar do discurso de que as contas da prefeitura do Rio são equilibradas, o déficit esperado para 2016 deve dobrar em relação ao de 2015. Há queda na arrecadação municipal, e a despesa de último ano de governo segue turbinada.
A maior preocupação para os cariocas, no entanto, deve ser com o futuro. O legado de dívidas que o atual prefeito vai deixar para seu sucessor é de tirar o sono. As diversas Parcerias-Público-Privadas (PPPs) celebradas com as empreiteiras, que cartelizaram as grandes obras públicas na cidade, são uma ameaça perigosa.
Consideremos apenas as obras do Porto Maravilha, do VLT, do Parque Olímpico, dos BRTs e das Escolas do Amanhã, que representam investimentos estimados em R$ 17 bilhões, para ter uma visão realista da situação.
No Porto, há dois consórcios, um que constrói (Porto Rio) e outro (Porto Novo) que vai operar os serviços. Ambos são controlados pelo Grupo Odebrecht, com 37,5%; OAS, com 37,5%; e Carioca, com 25% do total.
No VLT, o consorcio é controlado pelo Grupo Odebrecht, com 24,9%; a OAS/Invepar, 24,9%; a CCR, 24,9%; e a RioPar, 24,9%. Esclareça-se que a Invepar é controlada pela OAS. A CCR é da Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e da Soares Penido. A RioPar é controlada pela Fetranspor (empresas de ônibus) e tem como principais negócios a participação na CCR-Barcas e na RioCard, que emite os bilhetes únicos do estado e da prefeitura do Rio.
O Parque Olímpico foi construído pela Parque Rio e vai ser operado depois dos Jogos pela Rio Mais. Ambas são controladas por Grupo Odebrecht, com 33,4%; Andrade Gutierrez, 32,4%; e Carvalho Hosken, 33,2%.
Os BRTs TransOeste, TransCarioca, TransOlímpica e TransBrasil formam um bolo que vai custar mais de R$ 5 bilhões, e cujas fatias variam de proporção, mas estão sempre distribuídas entre Odebrecht, OAS, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e Carioca. As empresas de ônibus, também cartelizadas em consórcios, administram as estações e operam os serviços.
Finalmente, a construção de 136 Escolas do Amanhã, representando investimentos de R$ 1,2 bilhão, foi distribuída da seguinte forma: Odebrecht, 27,2%; OAS, 16,8%; Carioca Engenharia, 39,2%; e Construtora Zadar, 16,8%.
Como se pode observar, houve direcionamento dos contratos em favor das grandes empreiteiras, em detrimento das empresas cariocas de menor porte. Há também sinais de que os preços desses empreendimentos ? com obras de arte caríssimas (como as várias pontes estaiadas, por exemplo) e fornecimentos suspeitos de superfaturamento ? estão acima do que seria razoável os contribuintes cariocas pagarem.
É incompreensível que o Ministério Público do estado ? diante de tantas irregularidades nas PPPs, com licitações direcionadas para empresas escolhidas a dedo ? faça ?cara de paisagem?. Isso, apesar das inúmeras denúncias, especialmente no GLOBO, e dos currículos daquelas empreiteiras na Lava-Jato.
Será que o MP do estado está esperando que as delações de Curitiba deem a pista para começar a investigar? Os cariocas e fluminenses exigem que o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro cumpra seu papel institucional de ser o fiscal da lei e protetor dos contribuintes contra os desvios de dinheiro público.
Luiz Alfredo Salomão é diretor da Escola de Políticas Públicas e Gestão Governamental e Antonio Carlos Barbosa é engenheiro mecânico e economista