Agronegócio

Alerta no campo: soja pode ser dizimada pela ferrugem 

Mapa da Ferrugem revela alta concentração de casos no Paraná

Alerta no campo: soja pode ser dizimada pela ferrugem 

Céu Azul – O Mapa do Consórcio Antiferrugem, administrado pela Embrapa Soja com sede em Londrina, está tomado por pontos vermelhos distribuídos por todo o Paraná. Ele indica que na safra 2018/2019 o Estado foi o campeão brasileiro em diagnósticos de ferrugem asiática na soja, com pelo menos uma centena de registros. Na região, destaque para Céu Azul, com oito lavouras infestadas pelo fungo.

O sistema de monitoramento está mais apurado e isso também contribuiu para a elevação de registros, mas outra condição se soma à preocupação: se há casos, é porque o fungo está agindo e os dados mostram que isso ocorre cada vez em maior número de lavouras e com maior potencial de devastação. Uma área atacada pela ferrugem, se não controlada, pode ser totalmente destruída em poucos dias. Como no início ela é de difícil detecção, é o monitoramento acirrado que vai impedir o avanço da doença, que começa a agir pelo caule e se espalha por toda a planta, tirando dela os nutrientes necessários para se desenvolver.

Para evitar condições como essas, desde o início do ano, quando reassumiu a pasta, o secretário de Estado da Agricultura, Norberto Ortigara, e um corpo técnico ligado à pesquisa e ao setor produtivo têm pedido ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para que medidas de contenção sejam adotadas em todo o País, evitando assim a disseminação dos esporos que provocam a doença e que podem comprometer a produção inteira de oleaginosa.

Dentre as medidas solicitadas está a adoção do vazio sanitário em todo o Brasil, obedecendo às janelas de produção de cada região, o chamado zoneamento. Por enquanto, a medida ainda não sai do papel, mas o Paraná se prepara para mais um vazio sanitário. Isso significa que nos 399 municípios não pode haver planta em desenvolvimento no campo por um período de 90 dias, de 10 de junho a 10 de setembro.

A colheita para quem plantou até 31 de dezembro de 2018 – data limite para semeadura no Paraná – teve seu prazo encerrado no fim de maio e lavouras comerciais que ainda estiverem no campo já estão sujeitas às autuações, antes mesmo do início do vazio.

Veja o mapa da ferrugem no Brasil:

Brasil precisa ser mais rígido com urgência

 

Para o secretário de Agricultura, Norberto Ortigara, o tema precisa ser debatido com rigidez e urgência, ao risco de o Paraná e o Brasil deixarem de ser os principais produtores do grão em todo o mundo e de o cereal ser a fonte tão expressiva de riquezas.

Para se ter ideia, o complexo soja é o que mantém, há mais de uma década, o superávit da balança comercial brasileira com crescente avanço das exportações, além de um gigantesco mercado interno para alimentar nas cadeias de aves, suínos, bovinos, peixes, leite e dezenas de outros segmentos voltados ao complexo carnes e alimentação humana.

O Brasil é hoje o maior produtor do grão no planeta com uma safra que neste ano deve chegar a 123 milhões de toneladas, a segunda maior da história e vez ou outra intercala a posição de liderança com os Estados Unidos.

Três providências imediatas

“A gente precisa ser mais agressivo na fiscalização. Existem vários brasis, lamentavelmente. E depois que a ferrugem apareceu, há mais de 12 anos, ela tem avançado sobre as lavouras e precisamos tomar três providências com urgência se quisermos continuar sendo grandes na produção desse grão”, alerta o secretário da Agricultura do Paraná, Norberto Ortigara.

A primeira é o incentivo e a sequência das pesquisas, a segunda se pauta na observância de tempo sem a planta nas lavouras, evitando assim o hospedeiro do fungo. “A planta é a hospedeira, somos rígidos aqui no Paraná e temos o vazio sanitário, travamos embates sérios e acalorados por conta dessa firmeza, mas ou a gente faz assim em todo o Brasil, ou vamos perder o jogo. Santa Catarina, que tem divisa seca com o Paraná, por exemplo, não tem o vazio. O Mato Grosso está produzindo semente numa segunda safra. Vale a pena colocar a produção inteira brasileira em jogo por uma segunda safra?”, questiona o secretário.

Isso tudo culminaria no terceiro item: a perda de eficiência dos fungicidas que combatem a ferrugem, ano após ano.

Isso justificaria, por exemplo, por que muitos produtores tiveram de fazer cinco ou mais aplicações na última safra de soja na região para conter o avanço da doença. Em condições normais, elas chegariam a três ou quatro, no máximo. “Se houver controle, com menos aplicação de fungicida se reduz a velocidade da perda de eficiência desses produtos. Hoje os mais bam-bam-bam do mercado, que não preciso citar nomes, estão perdendo de 10 a 15 pontos por ano de eficiência e daqui a pouco não vão mais ter eficiência alguma. Estamos em risco totalmente desnecessário com toda a produção”, alertou. “Não há hoje no mercado nenhuma nova molécula [de fungicida] surgindo nos próximos oito ou dez anos. Volto a frisar: estamos em risco, sim. Ou a gente faz bem feito, ou não se tem mais a soja como a principal riqueza vinda do campo, nem no Paraná nem no Brasil. Estamos falando de um produto que é uma excelente fonte de proteína e de alimento. Daqui a pouco não teremos mais a soja”.

Falta de efetivo coloca em risco a fiscalização

Apesar da rigidez imposta pelo Paraná com o vazio sanitário para impedir que o fungo se aloje em plantas voluntárias e possa atacar as lavouras comerciais que começam a ser plantadas em setembro próximo, a pergunta que se pode fazer é: por que o número de casos de ferrugem asiática segue tão elevado e crescendo a cada ano?

A resposta também pode vir da própria Adapar (Agência de Defesa Agropecuária do Paraná), responsável pela fiscalização. Não há técnicos e fiscais suficientes para atuar a campo fazendo varredura das lavouras na identificação de plantas no período proibitivo. Também não há perspectivas de novas contratações, ao menos não para o vazio que se inicia no dia 10 de junho.

E como essa não é uma situação que surgiu agora, a agência tem contado nos últimos anos – sobretudo na região oeste – com as denúncias feitas pelos próprios produtores que observam o cultivo da soja em áreas próximas às suas. “Geralmente o produtor vê e, como ele não quer que a ferrugem ataque sua lavoura, denuncia e fazemos a autuação [com determinação de imediata colheita], além da aplicação das multas”, conta o fiscal Américo Onaka, da Adapar no Núcleo Regional de Cascavel.

Ele admite que não há estrutura para fazer um pente-fino, mas que também ocorrem autuações durante trabalhos de rotina dos técnicos no campo. No ciclo passado foram autuadas quatro propriedades na regional de Cascavel.

Além das denúncias, a Adapar conta com a conscientização dos sojicultores: “E isso tem ocorrido. De modo geral, o produtor tem estado mais atento e mais consciente, evitando o cultivo neste período do vazio”.

Segundo Américo, as discussões para padronização do vazio também envolveriam o Paraguai. Como o fungo não obedece fronteiras geográficas e no país vizinho não existe restrição de período para o plantio, não seriam raros os casos em que lavouras do outro lado da fronteira têm alojado o fungo que ataca as lavouras comerciais brasileiras. Essa possibilidade também vem sendo discutida, mas ainda sem definição.

A soja no Paraná

O Paraná colheu na última safra 16,2 milhões de toneladas de soja, com uma quebra de 17%, chegando a 3,4 milhões de toneladas, provocada por fatores climáticos que, neste caso, também contribuíram para a rápida proliferação dos casos de ferrugem por todo o Estado.

As perdas foram potencializadas na região oeste, sobretudo no Núcleo de Toledo, onde a quebra passou dos 30%. Em muitos municípios beira-lago de Itaipu, por exemplo, os produtores tiveram de colher 30 dias mais cedo porque as lavouras simplesmente não se desenvolveram.

Até a metade do mês de maio a comercialização do grão estava próxima de 52% e alcançava pouco mais de 8 milhões de toneladas. No mesmo período do ano passado, o índice era de 61% de venda.

Reportagem: Juliet Manfrin