Cotidiano

Lei do bullying reforça combate à violência em ambiente escolar

O processo de implementação de uma lei, conforme a secretaria, exige da instituição a definição de estratégias

Cascavel – Ele tem rosto, nome, sobrenome e um perfil intimidador e agressivo. A prática do bullying e o opressor podem ser reconhecidos facilmente. No entanto, a vítima que enfrenta por muitas vezes o problema sozinha, se esconde por medo.

É o caso de M.W., hoje com 28 anos, e que prefere não ser identificado na reportagem. Desde criança, principalmente na escola, sofria ataques humilhantes de colegas e recebia os temidos apelidos pelo simples fato de demonstrar sua preferência por atividades artísticas.

“O bullying sempre aconteceu de forma escancarada, e é incrível como ele determina o comportamento das crianças na escola. Lembro-me na época que sempre gostava muito de participar de ações artísticas e estar envolvido em projetos, mas, sempre rolavam piadinhas do gênero: mulherzinha, florzinha, enfim, coisas de criança”, lembra.

Para ele, essas situações moldaram seu estilo de vida e comportamento, tornando-o cada vez mais retraído e tímido, chegando ao ponto de participar de programas de recuperação de autoestima, organizados pelas equipes pedagógicas da instituição.

Problema semelhante foi enfrentado pela estudante de Jornalismo, Jéssica Thaís Lisboa, de 29 anos. Quando criança, um de seus defeitos apontados pelos agressores era o peso.

“Sempre fui muito gordinha, então eu era o ponto de referência na escola. Tipo, está vendo aquela coisa ali do lado da menina gordinha?”, conta.

Mas, os insultos não paravam por aí. Entre a pré-escola até o ensino médio, quando completou 15 anos, o que Jéssica mais ouvia eram palavras como “gorda, bolinha, fofinha”.

Isso, segundo ela, prejudicou sua autoestima, e na tentativa de acabar com aquela situação, partiu para dietas e medicamentos de redução de peso. “Minha infância e adolescência foram de certa forma marcadas pelo bullying”, lamenta. 

Prevenção

Os dois casos exemplificam traumas que crianças e adolescentes carregam ao longo de anos, e é este tipo de situação constrangedora e que gera muita aflição à vítima, que a Lei nº 13.185, em vigor desde 7 de fevereiro, que institui o Programa de Combate ao Bullying, quer evitar.

Segundo a responsável pelo projeto Justiça Restaurativa do NRE (Núcleo Regional de Educação) de Cascavel, Marli Tim Vanelli, os projetos que serão aplicados nas instituições de ensino por meio da lei, propõem um novo olhar sobre a violência, não apenas no que se refere ao bullying.

“Muitos professores e profissionais da educação do NRE de Cascavel já foram formados para atuarem com os alunos nessa prática. A proposta é de que eles possam fazer a intervenção nos momentos em que perceberem uma ação violenta a fim de orientá-los a uma nova forma de agir”, explica.

Segundo ela, esse é um processo que deve estabelecer um novo paradigma.

“Nesse caso, a violência é trabalhada a partir da responsabilização dentro dos círculos restaurativos, onde algumas perguntas simples são propostas para que cada um assuma a sua parte dentro do conflito instalado”, destaca Marli.

O papel da família

A legislação garante ações preventivas ao bullying, mas em um ambiente escolar com um número significativo de pessoas, não basta apenas a atenção dada pelos educadores. A família tem papel fundamental nesse processo.

“Eu reclamava em casa, mas, poucas vezes tomaram medidas para tentar revidar a situação. Na época, bullying não era uma expressão usada nas escolas, nem mesmo as pedagogas sabiam como lidar com isso em sala de aula. Era a famosa reunião de pais que tinha como objetivo coibir as agressões morais”, conta M.W.

De acordo com Marli, é de competência da família dar abertura ao diálogo com os filhos a fim de que possam intervir em situações de risco.

A Lei

A Lei nº 13.185 determina que “será considerada intimidação sistemática (bullying) todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo que ocorre sem motivação evidente, praticado por indivíduo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidá-la ou agredi-la, causando dor e angústia à vítima, em uma relação de desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas”.

O projeto determina que seja feita a capacitação de docentes e equipes pedagógicas para implementar ações de prevenção e solução do problema, assim como a orientação de pais e familiares, para identificar vítimas e agressores.

Superação

Tanto Jéssica quanto M.W.  conseguiram, já na vida adulta, superar os traumas ocasionados pelos agressores.

“De início é sempre complicado, mas ao passar dos anos eu amadureci e vi que aquilo não representava nada na minha vida”, comenta Jéssica.

A preparação da escola na abordagem dessas questões é essencial, conforme M.W., mas não descarta a presença dos pais neste enfrentamento.

“Hoje a escola está mais preparada para encarar este desafio, que sempre existirá, pois, o bullying, tanto quem pratica quanto quem recebe é um reflexo da imaturidade. A orientação não é um dever único da escola, precisa vir de dentro de casa. Os pais, antes da criança, devem entender o que ele é”, finaliza.