Cotidiano

Guinga lança disco com músicas 'do jeito que foram compostas'

65522671_O cantor violonista e compositor Guinga.jpgRIO ? A ideia andava cercando Guinga há algum tempo, mas passou a ocupar de fato seus pensamentos a partir de algumas conversas, em caminhadas pela orla de Ipanema, com o compositor carioca de música de vanguarda (e violonista) Sérgio Rojas. Disse-lhe, certo dia, o sábio amigo: a morte não é o contrário da vida, mas do nascimento. O contrário da vida é a impermanência.

? É por isso que eu sou compositor, ninguém quer passar despercebido nessa vida. E envelhecer é a capacidade de ficar invisível. Por isso é que o homem procura tanto pelo poder. Nunca fiz sucesso, mas ao menos sou bem-sucedido como compositor, respeitado pelos colegas e por pessoas do povo ? divaga Guinga, violonista, cantor e um dos mais refinados compositores da música popular brasileira, que acaba de lançar, na Alemanha, mais um de seus álbuns ?Canção da impermanência?.

A exemplo de ?Roendopinho? (álbum de 2014, o primeiro que gravou para o selo alemão Acoustic Music), o novo disco de Carlos Althier de Souza Lemos Escobar tem apenas registros solo, de voz e violão. Um disco simples, ?como se estivesse no quarto tocando as músicas que acabei de fazer?, com músicas compostas por ele sozinho (a exceção é ?Doido de Deus?, que Thiago Amud letrou, mas que entrou no álbum em versão instrumental) ao longo desses últimos quatro anos. ?Despedida do Garoto?, ?São Dorival? e ?Domingo de Nazareth?, por exemplo, Guinga fez nos últimos quatro meses.

? É uma prova de que continuo compondo. Quando você vai ficando velho, o filtro vai ficando mais cruel, a inspiração diminui. Mas componho da mesma forma de quando era moleque, não perdi a inocência ? garante o artista, que chegou ano passado aos 66 anos de idade. ? Acredito na inspiração, mas sempre que ela vier, vai me encontrar trabalhando. Sozinha, a inspiração não se completa.

O despojamento que Guinga mostra em ?Canção da impermanência? é, para ele, cada vez mais uma necessidade.

? Eu precisava fazer mais discos assim, mostrando as músicas do jeito que elas foram compostas. Ao longo do tempo, fui perdendo muitas das fitas com as versões originais das minhas músicas, as que eu mandava para os letristas ? conta. ? E meus outros discos foram feitos com muitos arranjos. Alguns deles melhoraram as músicas, outros as levaram por outros caminhos e eu detestei e não consigo nem mais ouvir. Arranjo é um perigo!

Gravado ao longo de cinco dias, praticamente sem emendas, no estúdio da Acosutic Music (gravadora do violonista Peter Finger, velkho amigo de Guinga), na cidade de Osnabrück, ?Canção da impermanência? tem duas músicas com letras escritas e cantadas pelo compositor: a faixa-título e ?Lacrimare?.

No início da carreira, recorda-se o músico, era ele mesmo quem rascunhava os versos para as suas canções. Mas aos 18 anos, ele conheceu outro menino prodígio, Paulo César Pinheiro, que virou seu letrista. Aos 36, foi a vez de engatar parceria com Aldir Blanc. E mais recentemente, Guinga chegou Thiago Amud, com quem já tem umas 15 músicas compostas.

? Mas com a idade em que estou, já posso agir como criança de novo! ? graceja ele, que até hoje não se considera um letrista, e que já deu uma das faixas do álbum, ?Tom e Vinicius? para o compositor Zé Miguel Wisnik letrar. ? Quase tudo que está no disco pode ser letrado, mas minha preocupação é que as melodias das minhas canções tenham vida autônoma.

Nos dias 25 e 26, Guinga apresenta o show de ?Canção da impermanência? em São Paulo, no Sesc Santana (não há datas para o Rio ainda), e até o meio do ano ele lança mais um álbum, ?Avenida Atlântica?, com o Quarteto Carlos Gomes, que sairá pelo selo Sesc. Lá, além da faixa-título (parceria com Amud), estará a versão letrada de ?Meu pai? (faixa do ?Canção da impermanência?, no qual entrou apenas com um vocalise) e uma releitura de ?Odalisca?, parceria com Aldir Blanc, que ele gravou em 1991 em seu álbum de estreia, ?Simples e absurdo?.

? Eu não a tocava desde 91, tive que reaprendê-la ? confessa.