O tempo tem corrido mais depressa no Brasil. É como se nos guiássemos por um relógio sem ponteiros, como o do filme famoso de Ingmar Bergman. A consciência de que temos um novo governo, e de que ele ainda não completou sua primeira semana, é essencial para que se estabeleça um horizonte para o que deve ser cobrado de quem acaba de assumir a missão de reconstruir uma economia em frangalhos. Falando de forma mais direta: a hora não é de olhar para o próprio umbigo, mas para o interesse maior do país.
É uma hipocrisia, um contrassenso, fazer oposição aberta a esta ou aquela iniciativa quando se tem exata noção do caos instaurado por anos de irresponsabilidade fiscal, negligência no combate à inflação e uma quebra de confiança internacional que não se via há 30 anos. Nunca é demais lembrar que o governo Dilma enviou ao Congresso Nacional uma peça orçamentária com 30 bilhões de reais de déficit e que, na sequência de tal iniciativa, sobreveio a perda de grau de investimento do Brasil. Somos hoje 11 milhões de desempregados. O PIB despencou quase 10% num tempo que apenas situações de guerra explicariam.
A conjuntura econômica e social requer união, apoio e colaboração do conjunto da sociedade. O presidente Michel Temer é um homem aberto ao diálogo, que compreende o momento histórico em que assume os destinos da nação. Uma agenda de reformas será implantada. São mudanças no arcabouço institucional do país pelas quais clama o setor privado há pelo menos duas décadas. Precisamos das reformas previdenciária, trabalhista, tributária e política. Agora há a perspectiva concreta de que tomem corpo. Ninguém tem dúvida da urgência de atacar o desequilíbrio fiscal. É o maior desafio. Finalmente, ele será encarado sem medidas paliativas ou factoides. Temos defendido a adoção de uma ?regra de ouro? que torne obrigatório manter o crescimento dos gastos correntes sempre abaixo do crescimento do PIB. É muito bom ouvir o ministro Meirelles falar em teto de gastos.
A propósito, o currículo de Henrique Meirelles o credencia como o nome certo para a Fazenda. O mesmo vale para o Banco Central, uma vez confirmado Ilan Goldfajn. Ou para as Relações Exteriores, com um nome do porte de José Serra. É um claro sinal de que voltamos a encarar o Itamaraty como um instrumento de formulação e execução da política externa brasileira (e de que pretendemos estar sentados às mesas de negociações políticas e econômicas internacionais). De forma mais ampla, o Ministério de coalizão que se formou em torno da base de sustentação do novo governo revela uma composição de forças que, sob o ponto de vista pragmático, conferirá a indispensável governabilidade ao país.
Pela primeira vez em anos, os empresários são chamados a contribuir. Uma agenda de desenvolvimento poderá ser construída a quatro mãos. O novo governo também já sinalizou o que espera do papel do Estado. O país poderá estar diante de um programa de concessões e alienação de ativos públicos capaz de promover a retomada do investimento e do emprego. Medidas duras serão tomadas? Antipáticas aos olhos do contribuinte? Certamente. Mas elas serão temporárias. O Brasil tem tudo para inspirar uma reversão de expectativas nos agentes econômicos diante da certeza de que haverá estabilidade de regras, estabilidade fiscal, estabilidade política. Só é preciso que todos estejam conscientes de que não se supera sem sacrifício um quadro de tamanha gravidade.
Nunca é demais lembrar: o novo governo ainda não completou uma semana à frente dos destinos do país. Podem parecer anos, mas são poucos dias. O certo é que, ajustados todos os ponteiros, o país terá condições de avançar muito em pouco mais de dois anos.
Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira é presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro