RIO – Apenas um dia sem dormir bem é suficiente para afetar o funcionamento do sistema cardiovascular. A constatação é de um estudo de pesquisadores da Universidade de Bonn, Alemanha, apresentado nesta sexta-feira durante a reunião anual da Sociedade de Radiologia da América do Norte (RSNA). Embora já se soubesse que a fadiga extrema pode afetar muitos processos fisiológicos, cognitivos e mesmo emocionais, este estudo é o primeiro a focar diretamente os efeitos na função cardíaca da privação de sono de curto prazo típica de profissionais que trabalham em regimes de plantão de 24 horas, como bombeiros, policiais e profissionais de saúde em emergências hospitalares, período no qual têm poucas, ou mesmo nenhuma, oportunidades de dormirem.
– Pela primeira vez, mostramos que a privação de sono de curto prazo no contexto de turnos de 24 horas podem levar a significativos aumentos na contratilidade cardíaca, pressão sanguínea e frequência de batimentos ? resume Daniel Kuetting, médico e professor do Departamento de Diagnóstico e Radiologia Interventiva da universidade alemã, que apresentou no estudo na reunião da RSNA, um dos maiores encontros médico-científicos do mundo.
Para o estudo, Kuetting e colegas recrutaram 20 radiologistas saudáveis (19 homens e uma mulher) com idade média de 31,6 anos. Todos eles foram submetidos a exames de ressonância magnética cardiovascular (CMR, na sigla em inglês) com análise de estresse antes e depois de plantões de 24 horas nos quais só conseguiram dormir, em média, três horas. Os pesquisadores também colheram amostras de sangue e urina dos participantes, além de medirem sua pressão sanguínea e frequência cardíaca, nas duas ocasiões.
Segundo os cientistas, em todos recrutados as avaliações após a privação de sono detectaram elevações significativas no estresse sistólico, pressão sistólica e diastólica e na frequência cardíaca. Além disso, seus exames de sangue depois do plantão apresentaram níveis mais altos de hormônio estimulador da tireoide (TSH), dos hormônios tireoidianos FT3 e FT4 e de cortisol, hormônio liberado pelo corpo em resposta ao estresse.
– Este estudo foi desenhado para investigar a privação de sono relacionada ao trabalho na vida real ? justifica Kuetting. – E embora os participantes estivessem proibidos de consumir cafeína ou alimentos ou bebidas contendo teobromina (um alcaloide estimulante com efeitos similares ao da cafeína), como chocolate, nozes ou chás, não levamos em conta fatores como níveis individuais de estresse ou outros estímulos ambientais.
Kuetting destaca, porém, que devido à amostra limitada do estudo ainda são necessárias pesquisas mais amplas, em coortes maiores, para se saber se estes efeitos são disseminados. E diante de uma população global que trabalha cada vez mais horas ou em mais de um emprego para conseguir pagar as contas, o pesquisador defende a realização de mais estudos dos impacto na saúde do excesso de trabalho e da falta de descanso. Ele também acredita que os resultados deste estudo piloto podem ser aplicáveis a outras profissões que exigem longas horas de trabalho.
– Estes achados podem nos ajudar a entender melhor como o fardo laboral e a duração dos turnos afetam a saúde pública ? conclui.