Cotidiano

Após debate sobre proibição de crianças em restaurante, escritora fala sobre educação à mesa

Pamela Druckerman (credits cleared) - créd. Benjamin Barda.jpg

RIO – ?Gente, tanto rebuliço porque um restaurante no Brasil fez o que muitos
restaurantes franceses fazem há séculos: proibiu a entrada de crianças menores
que 14 anos?. Assim a discussão sobre a proibição à entrada de crianças em
estabelecimentos como restaurantes ganhou um novo capítulo no Brasil com uma
postagem no Facebook, no final de outubro, da blogueira e apresentadora Raiza
Costa, conhecida como Dulce Delight. Ela saiu em defesa do Brunch Cantareira, um
espaço em São Paulo cuja postagem no Facebook com a comunicação de que a entrada
de menores de 14 anos era proibida veio à tona naquela semana.

A discussão se ampliou e posições polarizadas sobre a restrição à presença de
crianças em restaurantes, aviões e hotéis se propagaram nas redes socias. Um
texto da bióloga Ligia Moreiras Sena no site ?Cientista que virou mãe?
representou, para muitos pais e mães, um apelo ao preconceito e à
discriminação que sofreriam as crianças nestas situações, com o título ?Não há
nada de dulce delight na discriminação contra as crianças?.

Autora do bestseller ?Crianças francesas não fazem manha?, a americana Pamela
Druckerman conversou com O GLOBO por e-mail sobre a educação à mesa na França e
nos Estados Unidos ? a dualidade entre as formas de educar nos dois países já
rendeu três livros de sua autoria. Casada com um britânico, Pamela vive hoje em
Paris. Como jornalista e mãe, ela conta nesta entrevista suas observações sobre
o ?overparenting? americano [algo como ?educar os filhos em excesso?] e uma
educação muito mais moderada entre os franceses. E não, não há restaurantes que
proibem a entrada de crianças na França ? ao menos não explicitamente, diz a
escritora.

Como você aborda, no seu livro, a ida de famílias francesas a
restaurantes?

Ser capaz de se sentar em uma mesa e desfrutar de uma refeição com outras
pessoas é considerada uma habilidade básica de vida na França, que as crianças
aprendem desde cedo. Elas são capazes de fazer isso em casa, na escola e em
restaurantes. Ir a um restaurante é um evento especial para a maioria das
crianças na França ? algo que elas fariam em uma tarde de sábado, por exemplo.
Dependendo do restaurante, os pais podem deixar as crianças caminharem um pouco
quando eles esperam a comida chegar. Mas eles normalmente não toleram gritos, ou
um comportamento que possa perturbar as pessoas em outras mesas. Você
normalmente não vê crianças jogando comida ou fazendo cena.

É realmente comum, em restaurantes franceses, proibir a presença de
crianças?

Crianças pequenas não são tecnicamente proibidas em
restaurantes de luxo na França, mas seria incomum vê-las lá. Entende-se que
certos lugares não são realmente apropriados para as crianças. Mas em
restaurantes casuais crianças são bem-vindas, especialmente na hora do almoço.

Americanos e franceses lidam com essa situação de formas diferentes?

Os pais franceses confiam que mesmo as crianças pequenas podem sentar-se em
uma mesa e apreciar uma refeição. Ajuda o fato de que as crianças francesas não
comem lanches entre as refeições, exceto no final da tarde, por isso, quando se
sentam para comer, eles estão com fome e ansiosos para isso. Os pais adaptam
isto à idade da criança ? não espera-se que as crianças muito pequenas consigam
ficar sentadas por horas.

Acho que os americanos tendem a ter expectativas mais baixas sobre o
comportamento dos seus filhos em restaurantes. Crianças americanas tendem a ter
mais restrições na hora de comer e não estão acostumadas a refeições em família.
Claro, isto no entanto não é verdadeiro para todas as famílias.

Considerando que depois que um restaurante brasileiro publicou no
Facebook sobre a proibição de crianças menores de 14 anos de idade houve uma
discussão enorme entre os pais sobre isso na internet, você acha que mesmo fazer
do assunto uma grande coisa é um sinal de um “estilo americano” de
educação?

Vivendo na França, posso atestar que é possível desfrutar de refeições no
restaurante com crianças, e até mesmo crianças pequenas, seguindo alguns
princípios básicos. Um deles é ter certeza de que as crianças estão com fome
quando você sai para comer. Outra é conversar com as crianças de antemão sobre
como você espera que elas se comportem, e praticar esse comportamento em relação
às refeições da família em casa.

Além disso, certifique-se que é um restaurante
adequado ? não é realmente justo esperar que as crianças se encaixem em um
lugar super chique. Dar-lhes alguma liberdade sobre o que eles vão pedir ajuda
também; eles se sentem autônomos e se esforçam para a ocasião. As crianças são capazes de se adaptar a diferentes contextos, dentro de uma
razoabilidade, e com alguma orientação amigável, mas firme dos pais. Uma das
principais mensagens que os pais franceses transmitem é que comer boa comida,
todos juntos, é um dos grandes prazeres da vida ? e que as crianças também podem
desfrutar!

Você acha que é correto lojas e restaurantes proibirem a presença de
crianças?

Eu precisaria entender o contexto para responder a
isso. O restaurante teve muitos incidentes em que as crianças foram disruptivas
com outros clientes ou com funcionários? Foram incidentes com crianças com até
13 anos? Isso é surpreendente. É também surpreendente que eles tenham a
segurança financeira para excluir famílias jovens como clientes.