RIO ? O Brasil nunca teve tantos desempregados. São mais de 12 milhões à procura de ocupação. É como se toda a população de São Paulo, a maior cidade do país, estivesse sem trabalho. Pelo segundo ano seguido, foram extintas mais de um milhão de vagas com carteira assinada: 1,5 milhão em 2015 e mais 1,3 milhão em 2016, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Mesmo com a recessão que, pelas estimativas, deve ter sido de 3,5% no ano passado ? os números oficiais calculados pelo IBGE só serão conhecidos em 7 de março ? 2.141 cidades conseguiram criar vagas, mas, somente em dez a geração foi acima de mil empregos, de acordo com levantamento inédito do GLOBO.
O leitor poderá saber quantas vagas foram cortadas ou abertas em sua cidade, estado e por tamanho da população num infográfico interativo, no primeiro dia do especial multimídia sobre os caminhos para conseguir emprego com o mercado de trabalho tão desfavorável. Mudar ou não de carreira, usar as redes sociais, onde encontrar vagas, as alternativas no serviço público são temas que serão tratados ao longo da semana.
Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, destaca-se entre os 5.539 municípios acompanhadas pelo cadastro. Foram geradas 3.506 vagas na cidade que mais criou emprego em 2016, bem acima da segunda colocada. Campo Redondo, no Rio Grande do Norte, abriu 1.990. No lado oposto da lista está o Rio de Janeiro. Houve perda de 142.480 vagas, maior até que a de São Paulo, que tem o dobro da população e fechou 135.093 postos. As Olimpíadas, que ajudaram o Rio a sofrer menos com a crise no mercado de trabalho em 2015, foram as responsáveis pelo corte mais forte em 2016, segundo especialistas. As capitais dominam a lista das cidades que mais perderam ocupações protegidas.
A agroindústria explica o desempenho mais favorável de Três Lagoas. A cidade, que fica a 338 quilômetros da capital Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, concentra a cadeia de celulose, desde o plantio de eucalipto à fabricação de papel. Segundo o professor de Economia da Faculdade de Administração do Campus da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul na cidade, Marçal Rizzo, várias indústrias se instalaram no município nos últimos anos, o que a levou a ter o segundo maior PIB do estado, atrás apenas da capital. Como a maior parte da produção vai para o exterior, a crise interna afetou menos a cidade:
? Somos a capital mundial da celulose. Desde a década de 1970, a cidade tem plantação de eucalipto, que sucedeu a criação de gado na região. Vieram para cá a Eldorado Brasil e a Fibria, ambas em expansão. Ainda temos a International Paper. A geração de emprego veio por meio das commodities. Isenção de impostos, abundância de área e de água e logística, além de posição geográfica privilegiada explicam essa atração de empresas.
A cidade, que tem 115 mil habitantes, concentra 13 cursos universitários, entre eles, Medicina e Engenharia de Produção.
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Ano sem Olimpíada, fim de obras de mobilidade e a crise do estado, que está atrasando pagamento de servidores, derrubaram o emprego formal no Rio de Janeiro.
Segundo Manuel Thedim, diretor-executivo do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), afirma que os Jogos amorteceram o peso da recessão de 3,8% de 2015. São Paulo, ao contrário, sofreu mais em 2014 e 2015. A região é o berço da indústria, que começou a encolher o quadro desde 2012.
? A massa salarial dos ativos e inativos no Rio de Janeiro beira R$ 37 bilhões por ano. Não só o mercado está ruim, o funcionário público fica na incerteza, o consumo retrai bastante. O resultado era esperado, não é surpresa. A crise em São Paulo começou antes por causa do peso da indústria, já em 2014.
A crise na Petrobras também destruiu empregos, diz Thedim. Foram dezenas de milhares de demitidos, principalmente terceirizados. A queda no preço do petróleo, que já chegou US$ 40 o barril e agora está cotado na faixa dos US$ 55, agravou a situação da estatal. Em 2011, o barril de óleo chegou a valer US$ 100:
? Por isso somos muito dependentes dos leilões do pré-sal.
RECUPERAÇÃO SÓ NO SEGUNDO SEMESTRE
A leve recuperação esperada para economia este ano, de 0,5% de alta do Produto Interno Bruto (PIB), não deve mudar muito o cenário de competição acirrada no mercado de trabalho. A taxa de desemprego, atualmente em 11,8%, deve subir para 13,4%, de acordo com as projeções do Bradesco, engrossando em um milhão a massa de trabalhadores em busca de uma vaga. João Saboia, professor da UFRJ, acredita que o mercado vai melhorar somente no segundo semestre, mas pouco, ficará quase estável:
? Não tenho qualquer expectativa otimista para o primeiro semestre do ano. Há muita incerteza. Deve piorar um pouco no início do ano, com alguma recuperação no segundo semestre, mais para o fim do ano. O mercado de trabalho reage com atraso tanto na piora quanto na reação. É claro que ninguém mais está esperando que este ano seja tão ruim quanto em 2015 e 2016. Espera-se estabilidade.
E a reação deve vir das áreas de comércio e serviços que respondem por quase 70% do emprego, com baixa remuneração e produtividade. A indústria deve reagir antes e começar a contratar, mas tem pouca capacidade de absorção de mão de obra, diz Saboia.
Thais Marzola Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados, diz que a taxa de desemprego segue em alta até o segundo trimestre do ano e fecha 2017, na média, mais alta que em 2016, em 12%. Como Saboia, a analista também vê o comércio e serviços gerando mais vagas quando a recuperação do mercado de trabalho vier:
? A indústria também deve mostrar alguma recuperação ao longo do ano.
Thais acredita que a tendência de formalização do mercado de trabalho se mantenha:
? Pode haver algum aumento de informais e sem carteira, mas em uma proporção menor do que vimos em outras épocas. Mas a melhora mais efetiva somente em 2018.
Nos salários, a disparidade persiste com a crise. A menor renda do trabalho é a do Maranhão. Na média, os trabalhadores recebem R$ 1.122, enquanto no Distrito Federal, R$ 3.695, mais de três vezes o salário no estado nordestino. Houve dispersão grande nas variações. Houve alta de 8,1% no Amapá e queda de 8,7% no Amazonas, onde os salários são de R$ 2.034 e R$ 1.598 respectivamente.
Em 2017, os salários não devem subir, segundo Thais. A oferta grande de mão de obra vai impedir valorização dos salários, mas a perda do poder aquisitivo será menor, com a inflação mais baixa. Em 2016, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou em 6,29% e espera-se que o índice caia para 4,71%.
? Altas reais (acima da inflação) somente em 2018 ? diz a analista.
Info – Taxa de desemprego 3tri/2016 – estados
A recessão foi mais dura para alguns grupos. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, a taxa de desemprego, as maiores taxas de desemprego são as das mulheres, jovens, negros e os que têm ensino médio incompleto. Enquanto 10,5% da força de trabalho masculina está sem emprego, essa taxa sobe para 13,5% entre as mulheres. Entre os negros, o desemprego é ainda maior: atinge 14,5%. Entre os brancos, a taxa cai para 9,6%. Mas os jovens têm sido os mais afetados. Um em cada quatro jovens de 18 a 24 anos está à procura de ocupação.