POLÍTICA

Licenciamento ambiental: Embate sobre Mata Atlântica e terras indígenas esquenta na Câmara

Foto: José Fernando Ogura/AEN
Foto: José Fernando Ogura/AEN

Brasília - O Congresso Nacional deve viver nesta quarta-feira (13) mais um embate entre governo e oposição, desta vez em torno do projeto de lei que flexibiliza as regras de licenciamento ambiental no país. O relator da proposta, deputado federal Zé Vitor (PL-MG), anunciou que vai propor a derrubada de ao menos quatro dos 63 vetos feitos pelo presidente Lula na semana passada. A iniciativa, que ele só detalhará no dia da votação, deve mobilizar a base governista para tentar manter os pontos barrados pelo Planalto.

Segundo Zé Vitor, alguns dos cortes feitos por Lula já eram esperados, mas outros representam uma “discordância conceitual” com o que foi aprovado pelo Congresso. Entre as prioridades para reinclusão no texto, o parlamentar citou o veto à transferência de responsabilidades de licenciamento para os estados. Lula barrou 12 dispositivos que previam a possibilidade de estados e municípios criarem regras próprias, sem padronização nacional, alegando risco à segurança jurídica e à preservação ambiental.

O relator discorda. Para ele, a medida não estimularia empreendedores a buscar regiões com normas mais brandas, e caberia aos órgãos estaduais definir os critérios. Já o governo e ambientalistas dizem que essa mudança abriria espaço para uma “competição antiambiental” entre entes federativos.

Mata Atlântica e Funai

Outro ponto que Zé Vitor quer reverter é o veto à retirada da proteção especial à Mata Atlântica. Lula justificou que o bioma está em situação crítica — com apenas 24% de vegetação nativa preservada — e que suspender o regime especial de licenciamento poderia acelerar a degradação. O relator, contudo, argumenta que construções na área deveriam ser autorizadas ou não pelo órgão ambiental estadual, sem exigências adicionais.

Também está na mira do relator o veto que manteve a obrigatoriedade de consulta à Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) em casos de empreendimentos que afetem territórios indígenas. O governo sustenta que o texto aprovado pelo Congresso deixava de fora povos e terras em processo de reconhecimento, o que poderia contrariar a Constituição. Zé Vitor defende que a consulta não seja obrigatória nesses casos.

CAR

O deputado ainda quer derrubar o veto que impediu a dispensa automática de licenciamento para produtores rurais com CAR (Cadastro Ambiental Rural) aprovado por órgãos estaduais. O Planalto manteve a exigência de que o CAR esteja validado, e não apenas aprovado, para garantir a proteção ambiental.

Repercussão pública

A proposta, aprovada com ampla maioria na Câmara e no Senado, indica que o governo enfrentará dificuldades para manter todos os vetos. Apesar disso, fora do Parlamento, a repercussão pública tem sido majoritariamente negativa. Um levantamento da Quaest, divulgado na segunda-feira (11), mostrou que o debate sobre o projeto gerou 64 mil menções nas redes sociais nos 11 primeiros dias de agosto, com alcance médio diário de 11,4 milhões de pessoas.

O pico ocorreu na sexta-feira (8), quando Lula anunciou os vetos. Do total de menções, 70% foram negativas, 19% positivas e 11% neutras. Segundo a pesquisa, a discussão atingiu audiência massiva, chegando a mais de 50 milhões de usuários por dia.

A votação desta quarta-feira promete ser um teste de força para a articulação política do governo no Congresso e para a capacidade da oposição de mobilizar apoio para reverter as decisões do Planalto. Se os vetos forem derrubados, pontos centrais da flexibilização no licenciamento ambiental voltarão a valer, reacendendo o debate sobre o equilíbrio entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental no Brasil.

FAEP critica vetos ao novo licenciamento

O Sistema FAEP tem preocupação em relação à decisão do governo federal sobre os vetos ao projeto por entender que a proposta era importante para destravar investimentos, reduzir a burocracia e garantir segurança jurídica aos produtores rurais que atuam dentro da legalidade.

“Com esses vetos, o governo fecha os olhos para a realidade do campo. Ao invés de construir um caminho viável para a regularização, prefere manter um modelo ultrapassado, que trava o desenvolvimento, alimenta a insegurança jurídica e burocratiza até mesmo o básico”, critica o presidente interino do Sistema FAEP, Ágide Eduardo Meneguette. “O novo licenciamento não significa afrouxar regras, mas dar clareza e agilidade a um processo historicamente travado, que há anos coloca empecilhos para quem quer produzir dentro da lei”, complementa.

Segundo a entidade paranaense, um dos pontos de maior preocupação é a LAE (Licença Ambiental Especial), que tinha como objetivo agilizar os procedimentos para as atividades e empreendimentos considerados estratégicos. Com o veto para a forma monofásica da LAE, não é mais possível a autorização da emissão de todas as licenças ao mesmo tempo, burocratizando o processo.

A expectativa é que o governo federal apresente um Projeto de Lei para suprir as lacunas dos 63 vetos. “Agora, o setor aguarda a análise do Congresso sobre os vetos, com a expectativa de que deputados e senadores reconheçam o esforço por um licenciamento mais moderno e alinhado à realidade do campo e da produção brasileira”, resume Meneguette.

Marina busca acordo difícil

A ministra Marina Silva terá de enfrentar um Congresso historicamente resistente para sustentar o que considera o “melhor caminho” no licenciamento ambiental. Após duas décadas de discussões, a proposta foi aprovada com regras mais flexíveis, mas recebeu vetos de Lula e originou um novo projeto de urgência. Entre os pontos polêmicos estão a LAC (Licença por Adesão e Compromisso), que dispensa análise prévia para empreendimentos menores, e a LAE (Licença Ambiental Especial), que prioriza projetos estratégicos, como a exploração de petróleo na Foz do Amazonas. Ambos foram vetados, mas reaparecem, com ajustes, no novo texto. Lula acelerou a LAE por medida provisória, permitindo aplicação imediata. Marina admite “avanços conceituais” vindos do Congresso e defende conciliar agilidade, preservação ambiental e segurança jurídica, mas reconhece que o acordo com parlamentares será difícil.