Política

Com a folha já estourada, prefeitos temem improbidade

Formosa do Oeste – Sem a possibilidade de realizar concursos públicos, Formosa do Oeste desafia a legislação para cumprir um direito básico à educação infantil: a administração do Município de 7,5 mil habitantes teve que contratar três professores para suprir o quadro e não deixar alunos sem aulas. “Faltam funcionários. Tivemos pedidos de aposentadorias e afastamentos. Prefiro responder judicialmente por isso do que deixar alunos sem aulas”, defende-se a secretária de Educação, Ângela Roberta Neves de Brito Pinto.

Até o início deste ano, a folha de pagamentos de Formosa consumia 60% do orçamento, enquanto o alerta do Tribunal de Contas do Estado é disparado a partir de 48,6%, sendo que a Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece limite de 51,3% da RCL (Receita Corrente Líquida) para gastos com pessoal. O caso foi para o Ministério Público e agora a secretária responde a uma ação civil pública.

Embora tenham cortado despesas, os municípios do oeste vivem um drama: suprir a demanda de serviços com orçamento em queda e sem funcionários suficientes. A situação de Formosa é apenas uma de pelo menos 42 dos 53 municípios que integram a Amop (Associação dos Municípios do Oeste do Paraná).

Diante do fechamento do primeiro quadrimestre do ano para a prestação de contas e as negociações para reposição de inflação do funcionalismo público, os gestores municipais enfrentam um agravante: queda no ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).

“De dezembro do ano passado a março deste ano tivemos queda na arrecadação. Não sabemos o motivo e estamos atrás de uma resposta. Já solicitamos à Secretaria de Fazenda do Estado os relatórios para que possamos identificar o gargalo desse repasse, que é determinante para equilibrar nossas contas”, afirma Anderson Bento Maria, presidente da Amop.

A queda na arrecadação do ICMS afeta diretamente a capacidade de contratação de servidores dos municípios, fazendo com que muitos descumpram a Lei de Responsabilidade Fiscal. É que os gastos com a folha se mantêm, ou crescem conforme o reajuste salarial, enquanto a receita tem queda, ou seja, a proporção cresce, aproximando-se ou até passando do limite prudencial.

Em Missal os gastos com a folha chegam a 53% do orçamento. Todas as medidas foram aplicadas na cidade de 10,4 mil habitantes: redução de horas extras, redução de setores e contratação de 23 comissionados, dos 60 permitidos. “Só tem uma solução: aumentar os impostos. Mas não posso nem pretendo penalizar a população”, diz o prefeito Hilario Jacó Willers, o Maneco (PP).

Para este ano, os servidores terão reajuste de 1,87%, referente à reposição da inflação. “Essa situação dificulta as ações em educação, saúde e melhorias na agricultura. Os investimentos ficam afetados e quem mais sofre é a população”, lamenta Maneco.

 

Consamu: um “dinossauro” para os prefeitos

Embora tenha uma função incontestável no serviço de emergência e urgência, o Consamu (Consórcio Intermunicipal Saúde Oeste) é considerado um vilão nas prefeituras, porque eleva o percentual de contratações. Como dizem alguns prefeitos: é um verdadeiro “dinossauro”, tamanho o problema.

As contratações de servidores – enfermeiros, médicos, motoristas e auxiliares – oneram as folhas de pagamentos das prefeituras, que rateiam o custo do serviço. O mesmo ocorre com outros consórcios intermunicipais de saúde, como Ciscopar (Consórcio Intermunicipal de Saúde Costa Oeste do Paraná) e Cisop (Consórcio Intermunicipal de Saúde do Oeste do Paraná).

 

Políticos querem revisão da lei

Neste ano, a Lei de Responsabilidade Fiscal alcançou a “maioridade” e os municípios continuam em apuros para fechar as contas, obrigados a aumentar impostos, travar contratações e a conceder reajustes cada vez menores aos servidores públicos do Executivo. Ela é considerada pelos gestores um entrave, “engessando” planos de investimentos, por isso, não restaria outra solução a não ser uma revisão: “Não podemos continuar com a lei como está. Ela foi implantada em 2000 e hoje a realidade é outra. Vivemos dificuldades diferentes de 18 anos atrás”, argumenta o presidente da Amop, Anderson Bento Maria.

 

Dinheiro em caixa x contratações impedidas

Imagine ter em caixa R$ 3 milhões e não poder usar contratar os professores que precisa para ampliar o atendimento em Educação Infantil ou mesmo mais médicos para abrir novas unidades básicas de saúde. Parece uma situação incoerente, mas esta é a situação de municípios do oeste do Estado. Exceções que a Lei de Responsabilidade Fiscal não prevê e impede o benefício social. “Temos vários municípios nessa situação, com dinheiro em caixa, mas impedidos de contratar em função da margem de 51,3% do limite prudencial. A lei está defasada”, diz Anderson Bento Maria, que é o representante dos municípios e também prefeito de Maripá – 5,8 mil habitantes e um dos Índices de Desenvolvimento Humano mais altos do Estado.

Embora esbanje qualidade de vida, a cidade também enfrenta esse entrave burocrático: tem R$ 320 mil reservados, mas reajustes salariais maiores ou contratações estão impedidas. “De tão incoerente, fica difícil de explicar ao cidadão. Na última negociação de reajuste, uma servidora questionou: ‘O que posso fazer para ajudar?’ Tive que pedir apenas paciência, pois não depende de ninguém, a não ser da lei”, explica o presidente da Amop.

 

Formosa tenta reverter situação

Em Formosa do Oeste, há 420 estudantes matriculados no Ensino Fundamental e outros 350 no Ensino Infantil. Para contratar professores, a prefeitura encaminhou à Câmara de Vereadores projeto de lei para chamamento suplementar de servidores na educação. Hoje seriam necessários mais cinco professores para Educação Infantil e quatro no Ensino Fundamental. “Estamos fazendo o possível. Não é má vontade. Tudo está documentado”, reafirma a secretária de Educação, Ângela Roberta Neves de Brito Pinto.

 

Toledo aperta o cinto

Em 2017, a Prefeitura de Toledo gastava 53,45% do orçamento com a folha de pagamento, o que lhe rendeu uma punição pelo Tribunal de Contas. Após ajustes, hoje está em 52,2%, o que ainda impede o reajuste de 1,2% para correção dos salários. A receita é “cinto apertado”: servidores de confiança são funcionários de carreira, horas extras estão cortadas e secretarias acumuladas. “Com todas essas medidas, reduzimos nosso índice, mesmo com a abertura do mini-hospital”, diz o prefeito Lúcio de Marchi (PP).