Cascavel e Paraná - O mês de agosto foi marcado por um mercado de boi gordo pressionado pela maior oferta de animais, cenário que se estende para setembro e mantém os preços da arroba contidos. Apesar do bom desempenho das exportações brasileiras de carne bovina, a realidade interna segue ditada pelo volume elevado de confinamentos e pelo enfraquecimento do consumo doméstico.
“O mercado ficou um pouco pressionado em agosto, e isso inibiu o preço da arroba devido à oferta de animais”, analisa Roberto Barcellos, consultor e uma das principais autoridades em carnes no Brasil, em entrevista concedida com exclusividade ao Jornal O Paraná, em recente viagem feita ao Canadá na companhia do presidente da Padrão Beef, Lindonez Rizzotto.
Segundo Barcellos, a maior parte do gado ofertado tem origem em confinamentos ou em lotes vindos das pastagens, fator que amplia a disponibilidade e sustenta a atual fase de preços acomodados.
Na avaliação de Barcellos, mesmo com recordes nas exportações, a indústria tem conseguido alongar suas escalas de abate, aproveitando-se do aumento na quantidade de animais terminados. “Não acredito em alta de preço em função da escala alongada das indústrias, devido ao maior número de animais confinados. Nesses níveis, ainda é viável para o confinador, e vemos um movimento muito grande de confinamentos operando em sua capacidade máxima. Isso vai pressionar o preço”, explica.
Tarifaço: Volatilidade no comércio exterior
O consultor lembra ainda que a volatilidade recente no comércio internacional, com o chamado tarifaço, gerou um breve susto no setor, mas sem impacto duradouro. “Imaginamos que iríamos perder mercado, e a indústria se aproveitou desse receio dos pecuaristas para alongar as escalas. Mas logo percebemos o retorno aos preços originais. Hoje, 35% da produção vai para exportação, mas é o mercado interno que continua determinando os preços — e ele está sem poder de compra”, destaca.
Com a proximidade do último trimestre, tradicionalmente o período de maior consumo de carne bovina no Brasil, as expectativas de valorização são cautelosas. Barcellos acredita em alguma recuperação, mas limitada pelo cenário econômico doméstico. “Outubro, novembro e dezembro são meses de maior consumo, principalmente dos cortes nobres. Existe uma tendência de alta, mas uma limitação em função do mercado interno. Talvez se trabalhe com valores 5% acima dos atuais. Esse é o teto que enxergo para este ano: entre 5% e 10% de valorização”, projeta.
Outro ponto de atenção é o avanço do abate de fêmeas, que já supera o de machos. Para o consultor, esse movimento caracteriza a fase final da inversão do ciclo pecuário e deve gerar efeitos em breve no mercado de reposição. “O volume de fêmeas abatidas passou o de machos, o que deixa claro que estamos na última etapa da inversão do ciclo. Muito em breve a reposição vai começar a subir de preço, em função desses abates massivos dos últimos anos”, afirma.
A consequência, segundo ele, será a valorização dos bezerros de melhor qualidade. “Vai começar a faltar animal de reposição, e os preços vão subir. Vamos aprender que o único bezerro que consegue ter preços altos e ainda assim trazer viabilidade para quem compra é o que tem genética superior. Isso vai gerar uma corrida por animais de melhor qualidade”, ressalta.
Entre pressão de oferta, exportações em alta e consumo interno enfraquecido, o mercado pecuário caminha para o fim do ano com expectativas moderadas. A análise de Roberto Barcellos mostra que, embora exista espaço para ajustes positivos nos preços, a realidade de curto prazo ainda é de margens pressionadas e desafios de mercado — um reflexo direto do ciclo pecuário e da relação de forças entre oferta, demanda interna e desempenho das exportações.