Cotidiano

Retirada de servidores da reforma da Previdência surpreende governadores

BRASÍLIA – A decisão do presidente Michel Temer de tirar os servidores estaduais e municipais da proposta de reforma da Previdência pegou os governadores de surpresa. A medida encontrou o apoio de alguns, e a resistência de outros. O governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (PMDB), por exemplo, se posicionou contra a retirada. Já o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), se colocou claramente a favor. E Robinson Faria (PSD), do Rio Grande do Norte, admitiu que Temer passou para os governadores o ônus político da aprovação da reforma, que encontra oposição em vários setores.

O plano do presidente é que a reforma alcance apenas os servidores federais e trabalhadores da iniciativa privada, deixando para os estados e municípios a tarefa de promover mudanças nas regras da Previdência de seus servidores, o que inclui, por exemplo, policiais e professores.

Os governadores participaram da cerimônia de posse de Alexandre de Moraes, novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), ocorrida na tarde desta quarta-feira, em Brasília. Em entrevista após o evento, Pezão disse que foi “pego de surpresa”, argumentando que não houve conversa com Temer a respeito.

? Pelo menos comigo, ele não falou. A questão da idade é uma questão que está na Constituição. Todos os governadores foram pegos de surpresa ontem à noite. Na discussão que a gente vinha tendo com o governo federal nunca foi tratado (retirar servidores estaduais e municipais da proposta) ? disse o governador do Rio.

Wellington Dias discordou de Pezão:

? Esse ponto da previdência deve ser discutido por cada estado.

O governador do Paraná, Beto Richa (PSDB), e o vice-governador de São Paulo, Márcio França (PSB), minimizaram o impacto da decisão de Temer, lembrando que seus estados já promoveram reformas previdenciárias. Mas Richa admitiu que não esperava essa mudança.

? Não esperávamos que acontecesse isso. Mas já que aconteceu, é cada um cumprir com sua obrigação. É atribuição dos governadores também fazer sua parte. Hoje não tem mais espaço para demagogia, populismo. É preciso coragem para tomar medidas que garantam o equilíbrio das contas públicas ? afirmou Richa.

Márcio França afirmou que a retirada dos servidores estaduais e municipais ajuda a aprovar a reforma da Previdência.

? O presidente Temer quis dizer: vou fazer a federal, se é difícil fazer com todo mundo, cada uma faz a sua. É o possível neste momento. A gente costuma dizer o seguinte: quando você manda um projeto desse nível, e precisa de 308 votos (dos 513 deputados na Câmara), você manda 100%, aprovou 30%, tem que comemorar. Não dá para fazer grandes mudanças no supetão. Tem que ser realista. E ele tem noção disso ? disse França.

O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), disse que a mudança foi um movimento natural e previsível, mas também admitiu ter sido pego de surpresa. Assim como Márcio França, ele afirmou que a reforma começa num tamanho, e termina menor.

? A tradição brasileira nesses temas da reforma da Previdência é nessa direção. Começa-se num programa máximo e termina-se com um programa mínimo. Tem sido assim desde o governo Fernando Henrique. Então eu acho que é um movimento natural ? afirmou Dino.

Segundo ele, o quadro de recessão e eleição no ano que vem podem atrapalhar a aprovação da reforma da previdência.

? Num quadro de ultra recessão, que podemos ir para o terceiro ano seguido de queda do PIB (produto interno bruto), é claro que é mais difícil ainda, porque você já tem dificuldades práticas com falta de emprego e fechamento de empresas. Aprovar uma reforma da previdência com esse quadro em ano pré-eleitoral é implausível, é improvável ? avaliou o governador do Maranhão.

O governador do Rio Grande do Norte, Robinson Faria (PSD), também disse que foi uma decisão inesperada. Reconheceu que Temer passou para os governadores o ônus político, mas que isso não vai impedi-lo de negociar com a sociedade e os sindicatos.

? Foi uma decisão inesperada. Geralmente essas decisões que mexem com previdência de servidor são de Brasília. Então é um caso inédito. Mas eu vou voltar para o meu estado e vou me posicionar. Não vou dizer hoje qual é a posição do estado, mas eu vou dialogar. Cada estado tem um posição, pensa um pouco diferente, se vai ser escalonado ou não, se vai ser de uma vez. Uma coisa para discutir. Eu vou discutir com os sindicatos ? disse o governador potiguar.

AÉCIO DEFENDE MUDANÇA

O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), defendeu a retirada dos servidores estaduais e municipais.

? Olha, a política é a arte do possível. O que o presidente busca fazer é trazer ao país avanços na questão previdenciária. Eu estive ontem com ele tratando longamente tratando do tema. Tenho reunião amanhã meio-dia com o relator, da reforma, o deputado Arthur Maia (PPS-BA), para vermos as questões centrais, o que é possível fazer. A questão da idade mínima me parece algo inegociável. Ele compreendeu que transferindo aos estados a responsabilidade de cada um fazendo ajustes no que diz respeito a seus servidores facilitaria a tramitação da matéria no Senado ? argumentou Aécio.

O senador disse ainda que o PSDB deverá apresentar emendas em relação a dois pontos:

? O PSDB que eu presido tem duas preocupações específicas, com dois segmentos importantes da sociedade. Aqueles que são beneficiários pela prestação continuada, que foi criada na Constituição de 1988 e regulamentada pelo presidente Fernando Henrique. São os brasileiros com mais de 65 anos que recebem no máximo um terço do salário mínimo. Nós não queremos mexer nesses benefícios. E também temos que ter um tratamento diferenciado para os trabalhadores rurais que trabalham sem carteira assinada. Esses dois segmentos deverão ter, por parte do PSDB, emendas que permitam que eles possam continuar sobrevivendo sem pagar o ônus de uma nova previdência.

Os ministros da Defesa, Raul Jungmann (PPS), e da Educação, Mendonça Filho (DEM), também presentes no STF, elogiaram a decisão do presidente Temer.

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que reúne quase 15 mil juízes, voltou a criticar a reforma da Previdência e passou a atacar também a decisão de retirar servidores estaduais e municipais. “Como é de conhecimento geral, o regime jurídico da Previdência dos servidores é único e pouco ou nada poderá ser alterado por Estados e municípios, servindo a iniciativa oficial apenas como forma de aliviar a ampla rejeição social pela proposta original”, diz trecho da nota da AMB.