LONDRES – O governo da premier Theresa May sofreu sua primeira derrota na Câmara dos Lordes, numa decisão que deve atrasar o início da saída britânica da União Europeia (o Brexit). A maioria dos membros da Câmara Alta do Parlamento votou a favor de uma emenda à lei ? o que obrigaria o governo a apresentar sugestões para proteger os direitos dos cidadãos da União Europeia residentes no Reino Unido, no espaço de três meses após a ativação da saída do país do bloco.
Com o resultado, a emenda terá que voltar à Câmara dos Comuns, de maioria governista. Mesmo assim, é o primeiro grande baque do governo, que disse estar ?desapontado? com a derrota.
A saída da União Europeia foi aprovada com maioria na Câmara dos Comuns, mas, para receber o carimbo que a torna lei, precisava passar pelas duas câmaras. O processo legislativo faz com que propostas de alteração funcionem como uma bola de pingue-pongue ? termo pelo qual é conhecida a alternância ? até ser encontrado um consenso. Agora, a ativação do Artigo 50 do Tratado de Lisboa, que deveria acontecer até o fim do mês, deve atrasar pelo menos uma semana.
A emenda, apresentada pela trabalhista Dianne Hayter, mas também apoiada por liberais, independentes e alguns conservadores, exige que os cidadãos europeus que já vivam legalmente no Reino Unido continuem a ser tratados da mesma forma depois do Brexit. A proposta venceu com 358 votos a favor e 256 contra ? uma diferença de 102 parlamentares.
Keir Starmer, responsável pelo Brexit na oposição, lembrou que há um consenso crescente sobre a questão:
? A primeira-ministra está cada vez mais isolada. Os trabalhistas continuarão apoiando a mudança na Câmara dos Comuns ? ressaltou.
De acordo com a emenda legislativa, ?os ministros devem trazer propostas para garantir que os cidadãos de outros países da União Europeia e seus familiares que residirem legalmente no Reino Unido no dia da aprovação do ato continuem a ser tratados da mesma forma no que diz respeito a seus direitos enquanto cidadãos europeus?.
Ao longo de três horas de debate, muitos lordes defenderam que o Parlamento deveria garantir que os três milhões de cidadãos da UE que residem no Reino Unido possam ficar. Hayter abriu a discussão, alegando que o governo tinha o poder de agir agora sobre a questão:
? Em 1985, meu amigo Neil Kinnock disse a seu próprio partido: ?Você não pode jogar a política com o empregos das pessoas? ? lembrou, pedindo que governo aja imediatamente para acabar com a incerteza. ? Os residentes europeus no país precisam saber agora, não dentro de dois anos ou de 12 meses, qual será sua situação. Eles precisam fazer planos para a escola dos filhos, para mudar de emprego, alugar ou comprar uma casa. Muitos precisam de tratamento e muitos outros trabalham inclusive na saúde pública.
O ex-ministro conservador Douglas Hogg pediu que o governo adote uma ?posição moral na campanha?, e advertiu que atacar os direitos dos residentes europeus pode levar a uma longa disputa legal.
? Uma garçonete francesa no Parlamento me perguntou o que iria acontecer com ela. Eu lhe dei minha opinião pessoal, dizendo que achava que não haveria nenhum problema após o Brexit, mas disse não ser capaz de lhe dar a garantia que acho que ela merece.
O ex-juiz Harry Woolf também afirmou ser uma questão moral.
? É melhor ser resolvida no Parlamento e não nos tribunais.
Os apoiadores do governo argumentaram que se tratava de uma ?simples lei? e que a melhor opção era aprová-la o mais rapidamente possível.
? Temos que aprová-la o quanto antes para para ativar o Artigo 50 ? defendeu o arcebispo de York, John Sentamu.