Opinião

Quando o cônjuge é pai ou mãe

A radical igualdade da relação de casal é o que a diferencia da relação entre pais e filhos.

Quando o cônjuge é pai ou mãe

A relação de casal é caracterizada pela igualdade essencial entre marido e esposa. Não há direito nem obrigação que não seja recíproco. Pode haver acordos entre eles no sentido de cada um assumir determinadas funções, mas nenhum direito prévio que possa ser reivindicado.

A radical igualdade da relação de casal é o que a diferencia da relação entre pais e filhos. Nesta, com efeito, os direitos e as obrigações são específicos para cada parte.

Acontece que, por vezes, formam-se casais que mantêm entre si uma relação muito mais parecida com a de pais e filhos do que a de parceiros. Os modos como se expressa essa relação são bem variados e vamos examinar alguns a seguir. Pois, como se trata de uma violação de ordem, isso costuma gerar consequências graves na relação de casal.

Uma primeira modalidade de violação da igualdade pode acontecer antes mesmo de a relação propriamente dita se efetivar. Trata-se da ideia bastante difundida de que, em uma relação de casal, o amor deve ser incondicional. Ocorre que amor incondicional é próprio da relação pais-filhos, mas não da relação de casal. Somente um filho pode esperar ser amado para sempre de modo incondicional. Assim, quando alguém entra na relação com essa expectativa, está, na verdade, à procura de um pai ou de uma mãe, mas não de um parceiro ou uma parceira.

Uma segunda modalidade de violação é o padrão segundo o qual a esposa “repreende” o marido constantemente como se fosse um menino travesso pelos motivos mais triviais. Enquanto a esposa viola a igualdade ao repreender, o marido a viola ao consentir com isso.

Uma terceira modalidade de violação ocorre quando há chantagem, como quando um diz ao outro: “Sem você, não consigo viver”; “Se você for embora, eu me mato”; “Minha vida sem você não tem mais sentido”. A reivindicação de ser cuidado para sempre, de não ser abandonado, é um direito exclusivo de um filho, jamais de um parceiro. Pais e filhos estão ligados por laços indissolúveis enquanto o casal se une por um pacto ou um contrato dissolúvel.

Uma quarta modalidade de violação é a que acontece quando só um dá e o outro só toma. A relação pais-filhos funciona assim, pois os filhos jamais conseguirão devolver aos pais o que deles tomaram. A relação de casal precisa se dar no equilíbrio de troca. Aquele que quer unicamente dar e não aceita receber se considera melhor e não quer se comprometer. Aquele que aceita apenas tomar, assume a função de filho, não a de parceiro.

A quais consequências conduz essa forma de relação? O mais comum é um casamento que o casal mais parece uma relação de irmãos: não se percebem calor e emoção, e sim o costume de viverem juntos. Algumas vezes, porém, aquele que está na posição de filho se irrita por receber demais e vai embora. É uma situação frequente em muitas separações.

Tem tratamento? Sim, desde que o casal se disponha a uma terapia. A conversação terapêutica de base sistêmica utiliza dinâmicas específicas para levar a esposa a tomar a força da mãe e o marido, a do pai.

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JOSÉ LUIZ AMES E ROSANA MARCELINO são terapeutas sistêmicos e conduzem a Amparar.

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