Agronegócio

Produtor deve segurar vendas de soja e milho

Cascavel – Em torno de 300 produtores rurais considerados empresários do campo em todo o oeste do Paraná e profissionais ligados a setores de crédito e do seguro rural participaram ontem em Cascavel do chamado Circuito Agro realizado pelo Banco do Brasil. Ao todo, são promovidos eventos similares em quatro municípios polo da agricultura em todo o Paraná e em 60 por todo o Brasil.

Na pauta estiveram temas como seguro rural, sucessão no campo e um dos mais aguardados: os cenários para o mercado econômico diante das mudanças estruturais de mercado, guerras comerciais e a postura comercial que promete ser adotada pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, e sua equipe econômica.

Para o analista de mercado da Agroconsult, Fábio Memeghini, o momento é de dar um voto de confiança ao novo cenário político e econômico brasileiro, mas reforçou que algumas condições devem servir como um alerta.

Segundo o consultor, a recomendação é para que os produtores interrompam as transações comerciais, guardem seus estoques e aguardem ao menos até a posse de Jair Bolsonaro, em janeiro próximo, para firmar novos contratos.

A orientação é analisar como o mercado deverá se comportar, quando o assunto é bascamente câmbio e reflexos das relações comerciais.

O consultor lembrou que o produtor plantou a atual safra – especialmente a oleaginosa, que ocupa 1,1 milhão de hectares no oeste – com custo de produção de 10% a 15% mais elevado que na safra 2017/2018. Isso por conta da valorização cambial, que levou a moeda morte-americana a passar dos R$ 4 neste segundo semestre. “O produtor gastou mais para plantar, mas também pôde se capitalizar um pouco mais na venda da safra passada com o dólar mais alto. Então conseguiu fazer um caixa. Neste momento, o câmbio está mais baixo [ontem fechou em R$ 3,74], o ideal é esperar mais um tempo, ao menos até a posse do novo presidente para ver como o mercado deverá se comportar”, destacou.

“Além do mercado econômico, devemos esperar o comportamento do clima. Quem já conseguiu vender um pouco [da atual safra] que espere um pouco até o início do próximo governo para avançar na negociação, vamos ver ainda como fica a guerra comercial que vem afetando o preço das commodities”, seguiu.

No oeste, cerca de 20% do que se espera colher foi comercializado nas chamadas vendas futuras. Isso representa cerca de 780 mil toneladas dos 3,9 milhões de toneladas de produção total.

Preços mais baixos

Por outro lado, o próprio mercado não vislumbra uma taxa de câmbio mais elevada para 2019. O Banco Central projeta a moeda na casa dos R$ 3,60 a R$ 3,70 para o fim deste ano, com a possibilidade de ele baixar mais ante a valorização do real no decorrer do próximo ano se as principais reformas forem tiradas do papel.

O mercado sabe e já trabalha com a possibilidade de preços das commodities agrícolas mais baixas no mercado internacional em 2019, “mas as margens continuariam em patamares confortáveis (…) o prêmio para embarque [nos portos] poderá aumentar”, estima o consultor.

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Chineses e árabes em posição de alerta

Outro aspecto que merece atenção do ponto de vista comercial são os riscos de se arranhar relações diplomáticas e comerciais com mercados como a China e o chamado mundo árabe.

No caso da China, a principal compradora de commodities brasileira, o recado veio em forma de alerta ainda semana passada quando o governo chinês afirmou por meio de editorial na imprensa local que, se o Brasil romper relações comerciais, as consequências podem “ser duras, severas”.

Na região oeste do Paraná a China responde por cerca de 20% das transações comerciais e só este ano já comprou cerca de US$ 300 milhões. “A China é nosso principal mercado e o presidente eleito falou em tom de campanha [quando se referiu em rever a relação comercial com os chineses e se aproximar do mercado americano]. Ainda estamos na segunda semana pós-eleição e o governo de transição está começando. Só agora é possível tatear melhor quem é quem no comércio internacional. Não vejo possibilidade de rompimento e a nossa relação com a China é uma simbiose, exportamos muita commodity e importamos muito produto industrializado. O Brasil se deu bem com a guerra comercial, os prêmios ficaram elevados para os portos brasileiros. Não se vê possibilidade de ter atrito com a China. Este é um momento de ter mais negócios com eles”, destacou Fábio Memeghini.

A regra também se aplica ao mercado árabe e às reações imediatas depois que Bolsonaro afirmou que vai mudar a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, o que contraria nações árabes. Por causa disso, o Egito cancelou uma visita que representantes das relações exteriores do Brasil fariam ao país árabe, tendo em vista que a comunidade considera uma afronta reconhecer Jerusalém como a capital de Israel, a exemplo do que fizeram os Estados Unidos.

Mais uma vez trazendo à realidade do oeste, o mercado árabe responde neste ano por pelo menos 16% das transações comerciais e se firma como um dos três principais compradores, na casa dos US$ 200 milhões, sobretudo com aquisição de frango e milho. “Tudo ainda é muito novo, mas serve de alerta. O governo precisa governar para todos, não importa quem votou e quem não votou, precisa de política de Estado e não mais de ideologia. Hoje o mercado árabe é o principal mercado para o frango brasileiro e vai para lá também muito milho. Com uma boa relação isso vai se resolver, pois nem sabemos ainda o nome do novo chanceler. É preciso um voto de confiança”, acrescenta Memeghini.