Cotidiano

Intransigência e ideologia decretam o fim do bloco econômico

Mercosul é retrato da falta de planejamento e de compreensão entre governos

Toledo – Na tentativa de driblar o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e garantir o mínimo de governabilidade ao País, o presidente do Senado, Renan Calheiros, e a presidente da República, Dilma Rousseff, compactuam esboço de um programa que consideram vital para tirar o País de uma de suas mais duras crises.

Um ponto em particular chama a atenção, o fim do Mercosul, o Mercado Comum do Sul, oficializado com pompa em 1991. Líderes da região Oeste que conhecem o bloco, mais por suas limitações do que por suas virtudes, dizem que o Mercosul, caso seu fim ocorra mesmo, não vai deixar saudades.

O consenso é de que, a exemplo do que já ocorreu em outras regiões do globo – essas composições entre países vizinhos chegam a uma centena -, a falta de compreensão sobre o que é e a função de um mercado comum enfraqueceu a existência do Mercosul.

“A intransigência condenou essa experiência à morte”, diz o presidente do Conselho Superior da Faciap (Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Estado do Paraná), Rainer Zielasko.

Por mais bela e inspiradora que fosse a proposta no papel, na prática o Mercado Comum do Sul só faz patinar há mais de duas décadas.

“No fundo, penso que o Mercosul nunca existiu, porque ele jamais alcançou plenamente aos objetivos alfandegários e tarifários aos quais se propunha”, afirma Rainer.

Argentina

Um dos grandes entraves para o sucesso do Mercosul, de acordo com especialistas, foi a atitude da Argentina.

“Se teve um país que lucrou com o bloco esse não foi o Brasil, e sim a Argentina”, afirma o presidente da AMP, a Associação dos Municípios do Paraná, o prefeito de Assis Chateaubriand, Marcel Micheletto.

Várias pautas comerciais ao longo dos últimos anos foram muito mais favoráveis aos argentinos do que aos brasileiros. Exemplos disso estão em acordos automotivos e também associados a produções primárias, a exemplo do trigo.

Um projeto tão amplo e com tantas variáveis como esse, segundo Marcel, só dará certo e terá longevidade quando todas as partes ganham e percebem que a associação é um bom negócio ao conjunto. Entretanto, a intransigência falou mais alto e nem mesmo pontos importantes dos acordos alfandegários foram colocados em prática.

Um dos setores com as queixas mais contundentes é o de transportes. Em vez de facilitar e de tornar mais fáceis os trâmites aduaneiros, a Argentina em nenhum momento afrouxou as regras como deveria. O transporte pelo modal rodoviário é o mais caótico, com exigência de até quatro paradas para a inspeção de cargas, atrasando viagens e elevando custos da operação.

Opção pelos acordos bilaterais

A proposta de fim do Mercosul não vem sozinha no pacote em estudo entre Renan Calheiros e Dilma Rousseff. A parceria de pouco êxito seria substituída por uma fórmula há muito defendida principalmente nos meios produtivos, a do acordo bilateral.

Nos últimos 12 anos, parcerias que injetavam grandes somas de recursos na economia brasileira foram enfraquecidas, a exemplo de acordos com os Estados Unidos.

Com a opção por esse formato de parceria, o Brasil, segundo líderes empresariais, terá chances de recuperar terreno e sair de uma das mais profundas crises de sua história.

“Devemos sim, com ou sem Mercosul, ter uma relação de respeito e produtiva com nossos vizinhos. Todavia, o que deve prevalecer são os interesses nacionais, de promover acordos que se mostrem lucrativos e instigadores de desenvolvimento”, conforme o presidente do Conselho Superior da Faciap, Rainer Zielasko.

A manutenção do bloco promove fragilidades que podem custar caro especialmente ao Brasil, aponta o presidente da AMP, Marcel Micheletto. Mesmo com todo o cuidado de técnicos, autoridades sanitárias e pecuaristas, o Brasil enfrenta um perigo adicional que vem do Paraguai.

No país vizinho, com casos recentes de aftosa, os pecuaristas não se preocupam tão seriamente em imunizar os rebanhos e, com a imensidão da fronteira entre os dois países, esse é um risco potencial permanente. Sem os arranjos do bloco, o Brasil poderá ampliar ainda mais os cuidados para manter sadios os seus plantéis.

(Com informações de Jean Paterno)