Policial

Após 30 horas, polícia estoura cativeiro e solta adolescentes reféns

Operação envolveu mais de 50 policiais, inclusive especialistas de Curitiba

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Após 30 horas, polícia estoura cativeiro e solta adolescentes reféns

Reportagem Cláudia Neis e Celso Romankiv

Cafelândia – Foram quase 30 horas de tensão e terror que transformaram a rotina da pacata Cafelândia, cidade de pouco mais de 18 mil habitantes distante 54 km de Cascavel. E foi preciso a intervenção rápida e ágil da polícia para que dois adolescentes fossem libertados das mãos do padrasto, que os manteve em cárcere privado, amarrados e ameaçados desde o início da tarde de segunda-feira (2).

Nem a polícia nem familiares souberam explicar as razões que levaram Ezequiel Basílio Mendes, 39 anos, a cometer tal crime. Mesmo durante as negociações, ele não explicava as razões de manter os enteados reféns.

Mais de 50 policiais militares, inclusive agentes do Choque e do Bope (Batalhão de Operações Especiais) de Curitiba, e socorristas do Samu ficaram mobilizados desde o início da tarde de segunda até o fim da tarde de ontem (3) à espera do fim do sequestro. Durante alguns períodos, o negociador acreditava que ele se entregaria. Mas então ele recuava e voltava a ameaçar a vida dos adolescentes.

O capitão Otavio Roncaglio, do Bope, conta que Ezequiel afirmou diversas vezes que iria matar as crianças e tirar a própria vida, o que fez com que a situação fosse conduzida com ainda mais cautela. “Em diversos momentos ele ameaçou tirar a vida dos menores, inclusive aparecendo para os policiais com a faca no pescoço de um deles. Por diversas vezes os dois choraram e pediram para que o padrasto, a quem chamam de pai, os libertasse também, tentando ajudar na negociação”, garante.

Do lado de fora, vizinhos e parentes especulavam o que poderia ter acontecido.

O que se sabe, é que Ezequiel havia saído em janeiro de um internamento para dependência química (era usuário de crack) e que teria ingerido bebida alcoólica, pois teria sinais de embriaguez, conforme o capitão.

Embora tivesse negado várias vezes a invasão ao cativeiro, por volta das 17h lonas pretas foram estendidas nas proximidades da residência, isolando completamente a área, impedido a visão do que acontecia ali. A ação sugeria uma intervenção.

Poucos minutos depois, um oficial da Polícia Militar confirmou que em meia hora o caso teria um desfecho e que, se Ezequiel não se entregasse, eles invadiriam. Por volta das 18h30, então, estouros, vidros quebrados e gritos foram ouvidos pela imprensa que acompanhava a mais de 50 metros de distância. A movimentação sugeria que os reféns haviam sido libertados e levados às ambulâncias do Samu. Em instantes o major Jorge Fritolla, responsável pela operação, confirmou a invasão da casa e ressaltou o sucesso da ação, sem nenhum ferido.

Os três foram atendidos pelos socorristas e encaminhados à Unidade de Pronto-Atendimento do Município. Ezequiel foi sedado e na sequência seria levado à cadeia pública de Nova Aurora.

A polícia também tenta descobrir os motivos do crime. A casa da família deve passar por perícia.

Familiares de Ezequiel, ainda sem entender os motivos do crime, afirmam que ele era calmo e que nunca havia maltratado os adolescentes, que ajudava a mãe a criar os filhos há cerca de dez anos, período em que são casados. Eles têm uma filha juntos.

As acusações contra Ezequiel ainda não foram divulgadas, mas inicialmente ele deve ser responder por cárcere privado e ameaça. De acordo com o advogado criminalista Luciano Katarinhuk, a acusação de sequestro poderia não ser sustentada porque a condição de padrasto dificulta a validação desse crime. As penas máximas para os crimes de cárcere e ameaça são de 1 a 3 anos e 1 a 6 meses de prisão, respectivamente. As penas podem ser diminuídas ou aumentadas dependendo da situação em questão.

Como funciona a negociação

A negociação com Ezequiel Basílio Mendes foi feita por um negociador do Bope e a técnica utilizada nesse caso foi a tentativa de conseguir a empatia do sequestrador. “Nós tentamos chegar ao sequestrador e ganhar a empatia dele para entender como proceder. Nesses casos, em que não há um motivo claro nem pedido de resgate, a negociação se dá para tentar mudar a ideia do sequestrador. Ele dizia que mataria os adolescentes e que cometeria suicídio na sequência. O trabalho foi negociador no sentido de mudar esse pensamento e fazê-lo se entregar”, explica o capitão Roncaglio.

A negociação acontecia sempre face a face: o sequestrador ficava no corredor da casa e o negociador ficava na janela, a uma distância de cinco metros.

Conforme o capitão, dos 14 policiais do Bope que vieram de Curitiba, cinco têm capacitação para atuar como negociador. “Cinco negociadores estavam aqui, mas apenas um deles teve contato com o sequestrador, justamente por conta da empatia criada no primeiro contato e para evitar qualquer alteração de humor ou comportamento do sequestrador”.

No Paraná há dez negociadores. O treinamento oferece base em psicologia e PNL (Programação Neurolinguística). Todos são acionados em crise como esse. “No primeiro momento, os policiais tentam o primeiro contato utilizando o protocolo. E, se não surte efeito, o Bope é imediatamente acionado. Em cerca de 70% dos casos a situação é resolvida com a intermediação dos policiais, mas, caso não haja avanço, os negociadores se deslocam imediatamente”, complementa Roncaglio.

E os casos são mais comuns que se pensa. Segundo ele, nos últimos 15 dias foram registrados 15 acionamentos da equipe.

Veja fotos do interior da casa.