CARACAS – Enquanto o desabastecimento e a escassez de matéria-prima para produtos básicos preocupam tanto o governo quanto a oposição na Venezuela, a população que passa horas nas filas volta a sofrer seus efeitos mais diretos ? e violentos. Somente ontem, uma série de protestos e saques terminou com ao menos um morto, vários feridos e a paralisação de vários serviços em cidades pelo país.
Em La Vega, na região metropolitana de Caracas, o motorista de um caminhão saqueado foi morto a tiros ao resistir ao roubo. Um policial e um soldado da Guarda Nacional também foram feridos. A tentativa de saque aconteceu durante a manhã. Segundo o dono da padaria e mercearia na qual o motorista e outros caminhoneiros descarregariam farinha e produtos, o episódio não parecia ter sido provocado pelo crime organizado.
? Aparentemente, uma multidão sequestrou um dos caminhões e o levou para a parte alta de La Vega, provocando confrontos. Houve tiros de outras pessoas que estavam próximas à padaria ? contou Fernando Correia, dono do estabelecimento.
Após os confrontos, que tiveram outros feridos, o comércio ficou fechado no local. De acordo com Correia, a situação na padaria e no município metropolitano tem sido dramática.
? Não temos açúcar para o pão nem para as tortas. O que aconteceu hoje é algo próximo do que se está vivendo no resto do país ? lamentou.
?Levaram até gás, mas não a comida?
A ONG Observatório Venezuelano de Conflitividade Social afirmou que há em média 19 protestos diários no país, e que nos cinco primeiros meses do ano foram registrados 146 saques e 108 tentativas de saque.
Enquanto agentes da Polícia Nacional e da Guarda Nacional acabaram feridos em La Vega, seus colegas em Mucuraba, em Mérida (Oeste), usaram gás de pimenta e cassetetes para afastar manifestantes que fecharam a estrada Transandina, exigindo a liberação da venda de alimentos em mercados locais. Venezuela cont
?Levaram até gás lacrimogêneo, mas não a comida?, ironizou pelo Twitter o jornalista Leonardo León, que acompanhou o protesto.
Mais cedo, a prefeitura local chegou a prometer cestas com comida para que não houvesse bloqueios nas vias. Outros protestos foram registrados ainda no estado Anzoátegui, no Nordeste do país, por dois dias consecutivos. Em uma marcha que passou por diferentes centros comerciais na cidade de Anaco, ontem, a população exigiu a venda e a distribuição de alimentos em armazéns e redes estatais de mercados, que passam por bloqueios diários.
? Queremos comida! Queremos comida! ? gritavam manifestantes pedindo a saída do presidente Nicolás Maduro.
Várias ruas e avenidas acabaram fechadas, e a polícia desmobilizou a marcha com bloqueios.
Num tom parecido, dezenas de manifestantes protestaram contra a escassez de alimentos no subúrbio caraquenho de El Valle. Um supermercado foi alvo de protestos, que forçaram o fechamento de uma importante estação de metrô na região da Grande Caracas, a Los Jardines.
Por causa da crise, a população enfrenta longas filas diárias para conseguir os produtos básicos à sobrevivência. Além disso, o país tem a inflação mais alta do mundo, que pode chegar a 700% em 2016, segundo projeções do Fundo Monetário Internacional.