RIO – O que deveria ser considerado uma boa notícia tem como pano de fundo uma triste realidade. O trabalho infantil caiu 19,8% em 2015 porque a recessão penalizou todos os grupos com desemprego, inclusive os jovens de 5 a 17 anos. Reginaldo Porfírio, de 16 anos, é um deles. O garoto vive em uma família cuja renda total não ultrapassa o salário mínimo. Além de estudar, ele ajuda a família com ?bicos?, seja panfletando em sinais, montando treliças em obras ou como servente de construção. O dinheiro era sempre certo. Há três meses, contudo, não aparece trabalho.
? Quando eu panfletava, aparecia um monte de gente já me chamando para trabalhar, fazer o serviço de panfletagem, e eu ia emendando um emprego em outro. Mas agora está parado de tudo ? conta o morador de Fortaleza.
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (Pnad), os jovens de cinco a 17 anos trabalhando somavam 2,672 milhões no ano passado, o que significa 659 mil crianças e adolescentes a menos na passagem entre 2014 e 2015. O maior recuo ocorreu na faixa entre dez e 13 anos, de 31,1%, com 333 mil crianças trabalhando em 2015. Nessa faixa etária, o trabalho infantil é totalmente ilegal.
No grupo de 14 a 17 anos ? que é o maior contingente entre as crianças e jovens ?, o número de trabalhadores caiu de 3,778 milhões para 2,260 milhões em 2015, ou seja, uma redução de 518 mil pessoas ocupadas.
Com a crise, o mercado de trabalho ficou ruim para todo mundo, inclusive para essa faixa etária, diz Marcelo Neri, diretor da FGV Social:
? O pico do trabalho infantil foi no Plano Cruzado (em 1986, quando o PIB cresceu 7,45%). É uma boa notícia dentro da tragédia.
Efeito ?desproporcional?
Os jovens saíram do trabalho, e parte considerável foi para a fila do desemprego. A taxa de desocupação de 15 a 17 anos subiu de 25,7% para 32,5% de 2014 para 2015. O que representou mais 127 mil jovens desempregados.
? O quadro para os jovens é assustador. A queda de renda dos jovens de 15 a 19 anos já está acontecendo há três anos. Foi de 16% este ano e está se mantendo nessa média desde 2013, quando ninguém perdia renda. E o desemprego é o principal motivo desta queda. Os jovens estão pagando uma parte desproporcional da crise ? afirma Neri.
Na Granja Lisboa, periferia de Fortaleza, fica a casa de Reginaldo, onde ele mora com a avó, uma tia, o irmão e um primo. Hoje, todas as despesas são pagas pela avó, que trabalha como doméstica: seu salário, mínimo, sustenta os cinco moradores.
? O dinheiro que eu ganhava já ajudava para comprar o alimento, e também para eu poder comprar as minhas coisas, um chinelo, uma blusa ? conta Reginaldo.
Hoje, diferentemente de meses atrás, quando trabalhava três horas por dia, o adolescente divide o tempo entre as aulas de teatro da igreja, no período da manhã, e o colégio, onde cursa o 1º ano do ensino médio, à tarde.
As maiores reduções de trabalhadores infantis ocorreram no Nordeste (180 mil pessoas) e Sudeste (163 mil pessoas). O rendimento médio domiciliar per capita real das pessoas de 5 a 17 anos ocupadas foi de R$ 630 em 2015, enquanto o das não ocupadas ficou em R$ 687.