Policial

72ª fase da Lava Jato investiga propina de mais de R$ 40 milhões em contratos de construção de navios da Transpetro

Provas apontam para a existência de grande estrutura corporativa no exterior utilizada para a prática de crimes

72ª fase da Lava Jato investiga propina de mais de R$ 40 milhões em contratos de construção de navios da Transpetro

Foi deflagrada nessa quarta-feira (19) a 72ª fase da operação Lava Jato, resultado de investigação conjunta da força-tarefa Lava Jato no Paraná e da Polícia Federal, com o cumprimento de dois mandados de prisão preventiva e seis mandados de busca e apreensão nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Alagoas. As medidas objetivam aprofundar as investigações a respeito do envolvimento de dois empresários em esquemas de corrupção na Transpetro, relacionados a contratos de construção de navios firmados pela estatal com o estaleiro EISA – Estaleiro Ilha S.A.. São alvos dos mandados de busca e apreensão os endereços dos investigados e de quatro empresas do grupo econômico. 

Apuração interna da Transpetro indica que a atuação dos executivos do estaleiro EISA junto ao então presidente da estatal e agora colaborador, Sérgio Machado, causou prejuízos da ordem de R$ 611.219.081,49 à Transpetro, em razão da entrega irregular de um dos navios Panamax encomendados, da não entrega dos outros três navios Panamax, de dívida trabalhista indevidamente suportada pela Transpetro e de adiantamento de recursos da Transpetro ao EISA, garantidos pessoalmente por um dos empresários presos com a emissão de duas notas promissórias que nunca foram pagas.

O juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba decretou a prisão preventiva dos investigados e, posteriormente, substituiu por prisão domiciliar com monitoramento eletrônico a pedido do Ministério Público Federal (MPF), em razão de riscos decorrentes da pandemia de Covid-19. A Justiça Federal também determinou o bloqueio de R$ 651.396.996,97 das pessoas físicas e jurídicas envolvidas e fixou outras medidas cautelares, como proibição de movimentar contas no exterior, proibição de realizar ato de gestão societária ou financeira em empresas no Brasil e no exterior, ou qualquer forma de ocultação de provas, e proibição de contratar com o Poder Público.

Conforme destacou a procuradora da República Luciana Bogo, integrante da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, esse é mais um caso em que a sofisticação para esconder o pagamento de propina chama a atenção. “As provas apontam que contratos sem lastro na realidade, envolvendo investimento em campos de petróleo e empréstimos com empresas em paraísos fiscais, foram usados em um esquema que causou prejuízo estimado em mais de 600 milhões de reais. A continuidade dos trabalhos da força-tarefa, mesmo após 6 anos de seu início, permite que as investigações se aprofundem cada vez mais, de forma que pessoas envolvidas em grandes casos de corrupção no sistema Petrobras ainda sejam responsabilizadas”.

Histórico – As apurações começaram após a entrega de informações e elementos de prova pelo colaborador Sérgio Machado, que à época dos fatos era presidente da Transpetro, e por seu filho, Expedito Machado, que auxiliava o pai no gerenciamento do patrimônio familiar ilícito decorrente do recebimento de propina. A investigação revelou que Sérgio Machado favoreceu o estaleiro EISA na celebração e na execução de contratos para a construção de navios Panamax e navios de produtos.

Machado relatou que, em 2008, após contratação direta do estaleiro EISA para a construção de quatro navios Panamax, solicitou a um dos executivos submetido hoje a prisão domiciliar o pagamento de propina equivalente a 2% do valor dos contratos. Na ocasião, foi proposto a Machado um acordo de investimento em campos de petróleo no Equador, operacionalizado por empresa de sua titularidade. O contrato trazia cláusula que facultava ao empresário cancelar o negócio, mediante o pagamento de multa de R$ 28 milhões, que correspondia ao valor da vantagem indevida solicitada. Machado nunca investiu qualquer valor nos campos de petróleo e o executivo do estaleiro EISA exerceu a opção de cancelamento, efetuando o pagamento da propina disfarçada de multa contratual por meio de 65 transferências bancárias no exterior realizadas entre 2009 e 2013, período que coincide com a execução do contrato firmado com a Transpetro.

A investigação também apura indícios de ilicitude em outro ajuste, ocorrido em 2013, quando o estaleiro EISA foi contratado para a construção de oito navios de produtos. Machado formalizou um empréstimo para empresas dos executivos presos hoje e repassou a quantia de US$ 4.500.000,00 por meio de offshore no exterior. Apenas dez meses depois, recebeu o montante de US$ 8.464.209,28, o que sugere o possível recebimento de propina de US$ 3.964.209,28 camuflada na forma de ganho de capital decorrente do empréstimo.

As provas colhidas, em especial um relatório de investigação patrimonial encomendado pela Transpetro, indicam a existência de uma grande, complexa e sofisticada estrutura corporativa internacional arquitetada pelos empresários para ocultação e blindagem patrimonial, fraude contra credores e possível prática de corrupção e de lavagem de dinheiro. Conforme demonstram os extratos bancários e os negócios celebrados, várias empresas do grupo econômico foram utilizadas para o repasse de valores à Machado.

O procurador da República Felipe Camargo, membro da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, afirmou ainda que “a análise de provas colhidas em medidas investigativas anteriores, como afastamento de sigilo bancário e cooperação internacional, continua permitindo que novas fases aconteçam. A forma de organização de uma força-tarefa, combinando o esforço conjunto de procuradores, que atuam com independência funcional, servidores do MPF e de outras instituições, é fundamental para que casos complexos, com diversidade de provas e grande poder econômico e político de investigados, possam ser desvendados”.