Educação

Sonho distante: Educação em tempo integral resiste a chegar às escolas

Apenas um em cada 150 alunos tem acesso à modalidade de ensino no Paraná

Sonho distante: Educação em tempo integral resiste a chegar às escolas

São Miguel do Iguaçu – Em tempos em que tanto se fala na qualidade de educação, sobre o que o educador deve ou não abordar, como os alunos se comportam, nada como o Dia da Educação, celebrado neste domingo (28) para pensá-la da forma mais estrutural, na formação adequada para alunos e educadores e do ciclo transformador do ensino e da aprendizagem.

Os números, por sua vez, indicam que governos ainda investem pouco em escolas em tempo integral.

Para se ter ideia, dos mais de 143 mil estudantes dos ensinos fundamental e médio na região oeste em 281 colégios, menos de mil alunos de apenas cinco unidades educacionais (uma em Jesuítas, uma em Lindoeste, uma em Santa Terezinha de Itaipu, uma em São Miguel do Iguaçu e uma em Terra Roxa) ficam durante todo o dia no ambiente escolar. Isso indica que apenas um em cada 150 estudantes regionais tem acesso a essa modalidade de ensino.

E a tendência é de que esse cenário regional não mude, ao menos não em pouco tempo.

Além de empenho, dedicação e envolvimento, a medida tem custo e precisa ser tratada como prioridade para deixar o papel. Aliás, essa ampliação foi uma das propostas de campanha do agora governador Ratinho Junior. A Secretaria de Estado da Educação disse que, das 29 escolas em todo o Paraná que ofertam educação integral em tempo integral no ensino médio, 18 começarão a implementação dessa modalidade agora, em 2019. Não houve confirmação se há alguma prevista para a região, mas os dados revelam que não.

Outro ponto que chama a atenção é que, de um total de 1,140 milhão de alunos no estado inteiro matriculados hoje, apenas 10,2 mil estão em estruturas onde permaneçam o dia todo. Média de um para cada 112 estudantes.

E onde eles estão? Em todo o Estado são 44 escolas com oferta exclusiva no ensino fundamental, três com oferta no ensino fundamental e no ensino médio e 26 escolas com oferta exclusiva no ensino médio totalizando assim 73 escolas com educação integral em tempo integral.

A implantação

Mas se os projetos não ganham expansão, o Jornal O Paraná foi a campo entender por que e ver como as estruturas regionais que oferecem essa modalidade de ensino estão se saindo.

As atuais escolas são recentes nessa formatação. As primeiras no atual ciclo iniciaram em 2017 e a implantação, dentro desses mesmos colégios, tem sido gradativa – ano a ano. Ou seja, a maioria das que oferecem a educação integral em tempo integral iniciou em 2017 com os sextos anos do ensino fundamental ou primeiro ano do ensino médio, em 2018 seguiram para o sétimo e segundo anos, e assim por diante.

Entre os fatos curiosos observados em todas as instituições ouvidas pela reportagem, é que nenhuma quer voltar atrás. E não é difícil de saber por quê.

Equitação para manter o equilíbrio e a disciplina

Outro exemplo regional está em Jesuítas, que pertence ao Núcleo Regional de Educação de Assis Chateaubriand, com a abrangência de sete municípios, com 29 colégios e 8.518 alunos.

Em Jesuítas o projeto envolve alunos dos 6º, 7º e 8º anos do ensino fundamental e 1º, 2º e 3º anos do ensino médio. O 9º ano do ensino fundamental deve ser inserido à grade integral em 2020.  À noite o ensino médio ocorre em turno único, já que recebe, em sua maioria, jovens que trabalham durante o dia.

E é na pequena cidade onde está a maior concentração regional de alunos estudando em tempo integral. São cerca de 360 de um total de 550 no Colégio Humberto de Alencar Castelo Branco.

A diretora Rosilene Lombardi Mezzon conta que eles chegam às 7h35 e ali permanecem por nove horas diárias, de segunda a sexta.

Como todos almoçam na escola, há um revezamento de funcionários e professores para acompanhá-los inclusive durante as refeições.

Entre os atrativos extracurriculares estão aulas de equitação que estimulam o equilíbrio e a disciplina. Em breve eles também contarão com aulas de natação, com uma piscina que já está sendo construída. “Esta formação em tempo integral atende todas as expectativas. Há uma diferença muito grande entre os que ficam na escola apenas um período e os que ficam o dia todo. Eles se apropriam do espaço escolar, das atividades é outro tipo de comportamento, de Vicência, de interação, de comprometimento, de aprendizagem”, segue a diretora.


A escola que fechou e que deu a volta por cima

 

Em Lindoeste está o único exemplo de escola com educação integral em tempo integral no NRE de Cascavel. O diretor do Colégio Estadual Cielito Lindo, Danilo Ribeiro, afirma que a implantação também tem sido gradativa e já chega ao 8º ano com a soma de 72 estudantes. Ali não existem estudantes do ensino fundamental, apenas do ensino médio, mas o exemplo merece amplo destaque.

A unidade chegou a ser fechada por um ano e a população local ficou desassistida. O envolvimento e o engajamento de educadores, pais e alunos fez com que ela reabrisse e desse esse salto que ele considera “qualitativo e indispensável”. A escola que chegou a ser fechada, hoje está com as portas abertas para os alunos ficarem o dia inteiro.

O diretor confessa: isso fez com que a instituição voltasse revigorada. “E após uma grande luta, de muito convencimento, conseguimos reabrir e colocar o tempo integral. É sensacional! Sou entusiasta do projeto, os alunos amam, todos gostamos muito e só temos ganhado com isso”, conta.

Entre as experiências extracurriculares estão apostas distintas como educação ambiental e o estímulo e o resgate à vida em sociedade em tempos de tanta tecnologia. “Se todos tivessem acesso [à educação em tempo integral], com certeza teríamos uma qualidade educacional diferenciada, superior. A escola tem sido extremamente importante para as crianças e os adolescentes se desenvolverem e se enxergarem como indivíduo e sociedade”, avalia.

O educador vai além: “Hoje, em torno de 70% das famílias que residem em Lindoeste trabalham em Cascavel e não tinham com quem deixar os filhos em um dos turnos. A escola veio também para contribuir com isso, tirar as crianças e os adolescentes das ruas. Sou apaixonado por esse projeto e penso que todos deveriam ter acesso”.

Além das três unidades citadas na reportagem, há ainda oferta de educação em tempo integral na região oeste do Paraná no Colégio Estadual Manoel Konner, em Santa Terezinha de Itaipu, e no Colégio Estadual Santa Rita do Oeste, em Terra Roxa.


Caminho inverso: alunos da cidade vão estudar no campo

 

No começo houve resistência dos próprios professores, dos pais, dos alunos… O trabalho foi intenso para transformar o Colégio Estadual Dom Pedro II, em São Miguel do Iguaçu, e este é um dos exemplos regionais que deu certo, aliás, muito certo.

A sete quilômetros da região central do Município, a unidade está no Distrito de São Jorge, onde vivem 900 famílias. Por ali a escola é protagonista de um caminho inverso. Em vez de as crianças e os adolescentes saírem do meio rural para estudar na cidade, ali, o Município precisou contratar ônibus para levar alunos da cidade para estudar no campo.

O mais impressionante: há uma longa fila de espera que gerou a necessidade de construção de uma nova estrutura que promete ser erguida a partir do próximo ano. “No começo não foi fácil, mas encaramos o desafio e aos poucos conquistamos a comunidade local, os alunos, os professores, conquistamos pessoas de outros lugares e temos hoje uma lista de espera graças ao bom trabalho e ao excelente desempenho”, conta o diretor Elsio Rosa.

Com a nova estrutura, o colégio deverá ser desmembrado da rede municipal que hoje funciona no mesmo prédio.

A exemplo das outras quatro escolas na região, ali o projeto foi implantado ainda em 2017. A diferença é de que, nessa unidade, as turmas não foram inseridas gradativamente: todas do ensino fundamental seguiram para o tempo integral de uma só vez e o planejamento é para que até 2021 o ensino médio também seja totalmente inserido nessa modalidade. “Hoje, dos nossos 152 alunos, 120 estão na educação em tempo integral”, conta o entusiasta do projeto.

E o que há de diferente no Colégio Estadual Dom Pedro II? Além de todas as disciplinas obrigatórias da base curricular, há uma estrutura diversificada com espaço cultural para estudos, aprofundamento esportivo, astronomia, dança e educação musical. “Há ainda disciplinas voltadas para a área externa, jardinagem, caratê… O aluno precisa ter aqui um espaço diversificado e atrativo, ele precisa pertencer a esse ambiente”, resume.