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Filho de ex-padeiro, Nenê quer mais títulos pelo Vasco e sonha com seleção

De origem humilde, filho de ex-padeiro e cuja mãe trabalhava com limpeza, Nenê desde cedo começou a driblar. Na adolescência, antes de trocar as quadras de futsal pelo futebol de campo, chegou a ajudar o pai, seu Valdir, a vender cachorro-quente na frente de casa, para aumentar a renda da família. Mas, hoje, diverte-se ao admitir que comia mais do que vendia o sanduíche. E é com fome de vitória e sob o comando de seu camisa 10 que o Vasco enfrenta o Brasil de Pelotas, neste sábado, às 18h30m, em São Januário, para tentar interromper a sequência de duas derrotas na Série B.

Em entrevista ao GLOBO, Nenê, que completa 35 anos no próximo dia 19 e tinha, no início da carreira, como ídolos Romário e Ronaldinho Gaúcho, relembrou momentos de sua trajetória nos gramados. Com 16 gols e 13 assistências em 34 jogos, o ídolo da torcida vascaína também falou de seus quase 11 meses no clube da Colina (sua estreia foi em 15 de agosto) e do sonho de voltar a vestir a camisa da seleção brasileira. Há 13 anos, o meia disputou um torneio pré-olímpico, no Qatar.

CASA PARA A MÃE

“Era meu maior sonho desde pequeno me tornar profissional e dar a casa para minha mãe, lembro das dificuldades que ela e meu pai passavam. Foi minha maior alegria no início da carreira dar a casa a ela. Depois comprei outra, graças a Deus, até melhor. Não tem preço ver a alegria dela por não ter mais que pagar aluguel”.

DORMIR NO CHÃO

“Meu pai trabalhava dia e noite na padaria. Apesar de difícil, era uma época bem engraçada, queria ajudá-lo, mas ele dizia: você vai fazer o quê? Tinha uns 13 ou 14 anos, eu acabava dormindo no chão da cozinha da padaria. Até que ele me disse que eu não precisava mais ir. Tinha muita admiração pelo quanto ele trabalhava para dar uma vida digna para a gente”.

TRAVESSURAS

“Em um dos meus primeiros anos no futebol de campo, ainda na base, fomos à Suíça jogar um torneio. Eu era bem sapeca, travesso. O treinador era brasileiro, de origem italiana, rígido. Eu era titular do time, e acabei conversando com uma moça da Islândia e o irmão dela, nem sabia o que estava falando, pois não falava inglês, era só na base da mímica. Ele me viu dando uns “amassos” e me tirou do time. Fiquei muito bravo, não tinha nada a ver. Tudo era novo, até viajar para outro país”.

TRANSIÇÃO DO FUTSAL PARA O FUTEBOL DE CAMPO

“No começo achei que fosse muito fácil, mas é totalmente diferente, achei que viria para o campo e continuaria driblando. O espaço era muito maior, tinha que correr mais, não gostava de correr. A adaptação foi difícil, mas depois foi tranquilo. No Paulista fiquei dois anos no profissional, depois fui ao Palmeiras. Depois para o Santos. Achei que poderia ir para o campo um pouco mais cedo, mas eu gostava mesmo era do salão, fazia mais gol, era mais dinâmico, eu era muito fominha”.

ERA UMA VEZ O FOMINHA

“O Biazotto (Marcos, técnico) me pediu para correr com uma bola embaixo do braço, porque eu era muito fominha. Ainda tinha a mentalidade do salão. Na época fiquei bem bravo, mas hoje a gente se diverte relembrando”.

INSPIRAÇÕES

“Gostava muito do Romário, antes mesmo de começar a carreira no campo. Ele ganhou a Copa sozinho, era meu ídolo. Depois, quando eu já estava jogando, era o Ronaldinho Gaúcho, que estava no Barcelona, craque, jogador completo, tinha tudo que um jogador precisava. Eu queria ser assim: completo. às vezes o cara sabe sabe driblar, chutar, correr, tem força, e eu queria ser o mais completo possível. Ele foi um cara que, nessa época, eu me espelhava muito”.

PRESENTES IDEAIS DE ANIVERSÁRIO

“Seria a gente ganhar a Copa do Brasil e ser campeão da Série B. Subir é obrigação, mas, como campeão, seria muito melhor. E uma convocação para a seleção. Seria a realização de um sonho ganhar esses três presentes de aniversário”.

TITE NA SELEÇÃO

“Posso ter uma esperança, sim. Quero continuar ajudando meu time a conquistar as vitórias e a seguir na liderança. Tenho que continuar no mesmo nível em que eu vinha, e aí será consequência. Se a chance aparecer, vou ficar muito feliz”.

PRÉ-OLÍMPICO EM 2003

“Disputei torneio no Qatar, os amistosos aqui, mas, no Pré-Olímpico o treinador do Mallorca na época, Luiz Aragonez, não me liberou, fiquei muito triste. Falava para o Ricardo Gomes (técnico da seleção) que queria ir. Acabei não indo e a seleção não se classificou. Era um timaço: Robinho, Diego, Kaká, Julio Baptista. Perdi essa chance, infelizmente.”

FUTEBOL BRASILEIRO NA OLIMPÍADA DO RIO

“Tem muita chance, ainda mais com a ajuda dos mais experientes, tem totais condições de ganhar este ouro inédito. Tenho alguns amigos lá, como o Neymar, o Luan, que fiquei muito feliz por estar lá. O Prass foi uma surpresa boa, ele merece, ele está sendo um dos melhores goleiros”.

MUDANÇA NO FUTEBOL BRASILEIRO APÓS 12 ANOS NO EXTERIOR

“Taticamente, a intensidade hoje é muito grande. Voltou a época com pontas, não tinha mais no Brasil. Está sendo um jogo muito rápido, jogadores mais organizados taticamente, está muito parecido com a Europa. Tinha muita diferença porque taticamente tinha que se organizar, jogadores mais abertos. A intensidade aumentou muito, está muito parecido com o futebol europeu”.

O PORQUÊ DE TER RECUSADO PROPOSTAS DE OUTROS CLUBES

“Foi por uma série de fatores: o tratamento da torcida, da comissão, da diretoria, do Eurico, a referência que eu poderia ser no clube. Foi um pouco de tudo e também pela possibilidade de me tornar ídolo de um clube com uma história tão bonita como a do Vasco. Além disso gostei muito do Rio, minha esposa e meus filhos também. A gente nunca tem absoluta certeza no futebol, mas a prioridade é continuar por bastante tempo”.

11 MESES DE VASCO

“O balanço é muito positivo. Voltei ao nível de quando jogava no Paris Saint-Germain (de 2010 a 2013). Está sendo muito bom ser reconhecido num clube da grandeza do Vasco. Ter o reconhecimento e respeito de todos, não só do Vasco, é muito gratificante. E também não penso em voltar para a Europa, quero ver o crescimento dos meus filhos, que moram em Jundiaí”.

DUAS DERROTAS SEGUIDAS

“É uma coisa que pode acontecer. A gente está no final da primeira parte do ano, alguns jogadores machucados e, às vezes, cansa mesmo. São muitas viagens, você vai de Norte a Sul em poucos dias, sequência muito dura. Perdemos um pouco da intensidade. Mas temos que resgatar o mais rápido possível, já no próximo jogo, sem desculpa, mesmo cansados. E essa semana de trabalho foi boa por causa disso. Já deu uma recuperada, o time estava sem treinar. Esperamos o apoio da nossa torcida.”

JOGO CONTRA SANTA CRUZ, QUARTA, PELA COPA DO BRASIL

“É uma maneria de mostrarmos que temos condições de ganhar a Copa do Brasil, de jogar com qualquer clube. É um time que joga e deixa jogar mais. Creio que vai ser um jogo mais aberto, vamos ter mais aberto. Acredito que vai ser um bom teste para mostrarmos nossa força, que a gente quer ir até a final”.

A IMPORTÂNCIA DE JORGINHO NO VASCO

“Muito grande, ele acertou o time, deu identidade ao clube, está buscando sempre o melhor, nunca está satisfeito, a gente, de uma maneira geral, relaxa muito fácil, às vezes inconscientemente. Achando que uma hora ou outra vai resolver e não é assim. Tem que ter muita dedicação, trabalho. Ele resgatou a confiança dos jogadores. O time tinha uma qualidade muito boa, mas não tinha confiança. Ele deu essa continuidade no trabalho, identidade para o clube, brigou para a gente ter todas as estruturas possíveis. O Eurico (Miranda) e a diretoria fizeram um esforço muito grande para a gente ter essa regularidade”

IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA

“É tudo, a base, a gente ter estrutura familiar é uma das coisas mais importantes para base para não oscilar. Nos momentos bons e ruins, está lá pra te apoiar. A gente trabalha para deixar a família bem, deixar meus pais orgulhosos. Hoje, ouvir que meus pais, meus filhos, minha esposa e meus amigos se orgulham de mim é muito emocionante. O reconhecimento do trabalho é muito importante, e a família ajuda nisso”.

ARTILHEIRO DE FÉ

“Eu me converti no começo da carreira, tinha de 18 para 19 anos, estava para ser mandado embora do clube. O Fábio Gomes, que jogou comigo (no Paulista, de Jundiaí), me convidou para a igreja e senti algo diferente. E Deus me mostrou em pouco tempo o que Ele poderia fazer. O treinador Luis Carlos Ferreira me levou para concentração, mesmo não sendo titular. Lembro-me até hoje que era uma quarta-feira e, à noite, contra o Madureira, fiz dois gols, pela Série C, e não saí mais do time. Deus estava querendo me mostrar que, se eu andasse no caminho certo, ele poderia me abençoar muito. Nunca mais quis fazer asneira, mas claro que a gente não é perfeito e tentei seguir um caminho certo para mim. Na minha carreira se não tomar cuidado com meu corpo, não iria longe”.

LONGEVIDADE NO FUTEBOL

“Minha ideia é jogar, no mínimo, até os 38 e parar com 40. Se chegar com 40 bem, vou estar feliz. Sempre falo do Zé Roberto (do Santos), que está com 42 e bem, é um exemplo pra mim”.

JOSÉ ALDO

“Somos amigos. Fui na pré-estreia do filme dele, que é muito bom. Ele é flamenguista roxo, mas diz que gosta do meu futebol desde a época que eu jogava no Santos. Ele tem uma história de vida incrível, é um cara humilde, sou fã. Falei para ele trazer pra mim o cinturão”.

O QUE PRETENDE VER NAS OLIMPÍADAS

“Conheço o Nadal (Rafael), joguei com o tio dele (Miguel), na Espanha. Quero ver tênis, atletismo, natação, o Bolt (Usain, jamaicano), que é um cara em quem a gente se espelha muito. Também gosto de basquete. Em Londres (há quatro anos, nas Olimpíadas), eu e minha esposa vimos um jogo. Ginástica artística também é bem legal, mas os horários nem sempre se encaixam com os nossos. Também queria ver os caras da NBA, o Lebron James não vem mais, mas tem o Kevin Durant, Golden State”.