Cotidiano

Erro de cálculo pode ter custado bilhões aos motoristas do PR

O DER terá de refazer todos os cálculos relacionados ao sistema estadual de pedágio, desde o primeiro mês de concessão

Erro de cálculo pode ter custado bilhões aos motoristas do PR

Curitiba – Os motoristas do Paraná podem ter pago bilhões de reais a mais em tarifas de pedágios desde o início da concessão, em 1998. A Agepar (Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Paraná) acredita ter encontrado uma falha na forma como as contas foram efetuadas ao longo dos anos. Agora, o DER (Departamento de Estradas de Rodagens) do Paraná terá de refazer todos os cálculos relacionados ao sistema estadual de pedágio, desde o primeiro mês de concessão. A reportagem é de Katia Brembatti, da Gazeta do Povo.

A questão foi levantada por Thiago Petchak Gomes, gerente de Regulação Econômica e Financeira da Agepar, economista aprovado no concurso feito pela agência no ano passado.

Embora prevista na assinatura dos contratos, a Agepar só foi formalmente criada em 2011 e, oito anos depois, ainda está em processo de estruturação. Por isso, só recentemente passou a regular os contratos de pedágio e de outros serviços delegados, como água e esgoto e transporte público intermunicipal. Até então, quem deveria fiscalizar os contratos era o DER.

A Agepar acaba de publicar uma resolução normativa alertando para a necessidade da revisão das contas do pedágio a partir do degrau de pista dupla, e também uma nota técnica detalhando o entendimento sobre o caso.

Os técnicos da agência reguladora destacam que há situações, também, de desequilíbrio a favor das concessionárias, como é o caso da isenção de eixo suspenso de caminhões, que devem ser compensadas, mas seriam proporcionalmente menores que as supostas distorções causadas pelo degrau de pista dupla.

O diretor-geral do DER-PR, Fernando Furiatti Saboia, não contesta a decisão da Agepar, partindo do princípio que se tratava de algo conceitual, na área econômica, que precisa ser verificado. “Já que a Agepar chegou a esse entendimento, nos cabe fazer os cálculos.”

Força-tarefa

Uma força-tarefa foi escalada para começar as contas com os técnicos disponíveis no DER, mas Furiatti vai incluir a demanda no termo de referência de uma licitação que deve ser publicada em setembro, visando contratar uma empresa para avaliar diversos aspectos do contrato de concessão de rodovias. O trabalho deve levar meses com os servidores, como economistas e contadores, e a contratada só auxiliará a partir de 2020. O problema é que os contratos vencem em novembro de 2021.

Sobre o passado, o DER informa que os responsáveis pelos cálculos não fazem mais parte do Departamento – ou foram presos ou se aposentaram. O trabalho também foi feito, em alguns períodos, por funcionários terceirizados, de empresas contratadas, que não estão mais acessíveis.

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A polêmica e discutível TIR

A questão envolve uma complexa engenharia matemática, a partir de conceitos contábeis, econômicos e financeiros, como fluxo de caixa e TIR (Taxa Interna de Retorno).

Essa TIR, inclusive, foi objeto de discussão desde o princípio, especialmente devido ao alto valor.

Em 1997, as TIRs ficaram entre 16,43% e 19,29% (variando em cada um dos seis lotes de concessão). A partir de aditivos contratuais, nos anos de 2000 e 2002, as taxas passaram a patamares entre 17,40% e 20,15%.

Para se ter uma ideia, os pedágios federais implantados no Paraná em 2007 (dez anos depois dos contratos do Anel de Integração) tiveram TIR de 8,65% – a metade do percentual mais barato praticado no sistema estadual.

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Bonificações irregulares

Estimativas preliminares da Agepar indicam que, caso a falha se confirme nos patamares aparentes, o valor devido pelas empresas seria superior a R$ 3 bilhões, mais do que o faturamento de um ano inteiro. Em 2018, por exemplo, as seis concessionárias informaram faturamento de R$ 2,4 bilhões.

Se houvesse mais tempo de contrato, a compensação dessa diferença poderia ser feita por meio de antecipação ou inclusão de obras. Contudo, no cenário atual, só haveria prazo para a “devolução” de dinheiro, por meio de redução de tarifa ou, eventualmente, depósito bancário, compensação em bens ou prorrogação da prestação de serviços sem cobrança.

Um dos erros mais gritantes são as bonificações em caso de realização de algumas obras pré-definidas. O anexo 8 dos contratos de concessão estabelecia que, se uma obra específica (geralmente duplicação, daí o nome degrau de pista dupla) fosse realizada até um determinado ano, a praça de pedágio mais próxima receberia uma bonificação, em forma de aumento da tarifa básica. Mas a maioria das obras acabou não sendo realizada – portanto, a elevação prevista não foi aplicada. O que pareceria uma “punição” para as empresas acabou sendo vantagem.

De acordo com o entendimento da Agepar, as concessionárias foram contempladas com uma compensação nos processos de reequilíbrio econômico-financeiro, com aplicação de um reajuste maior para atingir o fluxo de caixa previsto inicialmente. Assim, a bonificação que seria dada na tarifa básica apenas da praça próxima à obra estipulada era distribuída, de forma diluída, por todas as praças da concessionária, mesmo que o projeto esperado não tivesse sido executado. Boa parte das obras que gerariam bonificação foi alvo dos aditivos contratuais feitos durante a gestão Jaime Lerner, nos anos de 2000 e 2002. As duplicações foram excluídas, adiadas ou trocadas por outras obrigações.

O que acontece agora?

A revisão sobre o degrau de pista dupla atingirá cinco das seis concessionárias que atuam no Anel de Integração. Somente a Ecovia, responsável pela BR-277 no trecho entre Curitiba e o Litoral é que não tinha grande obra listada no anexo 8. O documento que embasa o questionamento, e que faz parte do conjunto do contrato assinado em 1997, só foi divulgado no site do DER agora.

A Agepar vai contratar uma empresa para fazer uma auditoria no contrato das concessões, incluindo questões como os itens considerados no reequilíbrio econômico-financeiro. O objetivo da contratação é ter um check list completo do que precisa ser cobrado das concessionárias para garantir o encerramento adequado dos contratos.