Cotidiano

Entrevista: entidades se unem para identificar preço mínimo do pedágio no PR

As entidades pretendem formar um consórcio, ou uma cooperativa, para disputar a licitação

Entrevista: entidades se unem para identificar preço mínimo do pedágio no PR

Entrevista: Cláudia Neis

Com 44 anos de existência e considerada a mais estruturada do País, a Caciopar (Coordenadoria das Associações Comerciais e Industriais do Oeste do Paraná) tem sido protagonista de uma série de ações, especialmente ligadas à infraestrutura. Agora, a entidade encabeça novo movimento com foco nas próximas concessões do pedágio.

Em entrevista ao Jornal O Paraná, Alci Rotta Junior, que termina agora seu mandato à frente da entidade, revela que um estudo está sendo organizado para levantar o preço mínimo das tarifas de pedágio em todo o Paraná. A partir dessa informação, as entidades pretendem formar um consórcio, ou uma cooperativa, para disputar a licitação. Confira a entrevista.

O Paraná – Para começar vamos falar sobre a pandemia. Como vocês veem lá no início e como estão vendo agora esse cenário?

Alci Rotta Junior – Lá no início, participamos de várias reuniões, principalmente do COE (Comitê de Orientação Estratégica) de Cascavel e percebemos que era um inimigo desconhecido. Ninguém tinha muita informação sobre ele [coronavírus] e o lockdown, estrategicamente, os países adotaram para ter tempo de entender, saber o que fazer, qual estratégia adotar. Somos entidades legalistas, jamais deixaremos de cumprir as leis. A instrução desde o início da pandemia foi de cumprir os decretos. Nós tivemos participação em decretos municipais e estaduais. A União não se manifestou e deixou esse assunto para responsabilidade de governadores e prefeitos. Desde o início a gente sempre deixou muito claro que, embora represente o setor produtivo, a questão da vida e da saúde sempre vai estar em primeiro lugar. É claro que gostaríamos muito que as empresas se mantivessem de pé e que os empregos fossem preservados. O fechamento de empresas não vai contribuir para amenizar a situação desta segunda onda. A gente sabe que a população e as empresas vão ter que fazer sua parte agora. O que a gente percebeu ao longo desses nove meses é que o excesso de confiança e a perda do medo pela população ocasionaram alguns excessos de aglomeração e isso, claro, contribuiu para aumentar a lotação das UTIs na região. A Caciopar representa 46 associações do oeste do Paraná e, desde já, a gente se colocou à disposição para levar informação às empresas. O poder público, principalmente municipal, deixou muito claro que vai fiscalizar e punir aqueles que não estiverem cumprindo as leis. Esse é o caminho. Nós temos que levar informação, evitar aglomeração, manter o distanciamento, usar álcool gel, porque sabemos que vai passar. A gente sabe da importância de dezembro para o comércio, a indústria, o serviço… Um fechamento ou qualquer tipo de restrição em dezembro seria gravíssimo para a economia.

 

O Paraná – Na sua opinião, diante dessa nova onda, o poder público não deveria que ter alertado a população um pouco antes, até para evitar uma situação que exija medidas mais restritivas?

Rotta – Com certeza! Acho que havia um desejo de boa parte da sociedade até de prorrogar as eleições deste ano. A gente sabe que alguns movimentos fizeram com que uma estratégia antecipada acontecesse. Eu não quero culpar os prefeitos ou o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), mas tenho que deixar muito claro que um dos anseios do setor produtivo era de que houvesse a unificação das eleições [municipais e nacionais], por isso acho que perdemos uma grande oportunidade de fazer isso. A gente sabe que o Brasil para de dois em dois anos, e acho muito frágil dizer que o cidadão teria dificuldade de digitar oito, nove candidatos… isso é um argumento muito frágil. A verdade é que a economia e o País dependem ou ficam muito reféns de atitudes e ações políticas de dois em dois anos.

O Paraná – Pesquisa recente da Fecomércio mostra que a intenção de compra do presente de Natal é maior que a do ano passado. Vocês já esperavam por isso ou foi uma surpresa?

Rotta – Quando a pandemia começou, na segunda quinzena de março – acho que abril foi um dos piores meses -, ninguém imaginava que a gente pudesse recuperar parcialmente nossa economia. É claro que temos noção – e muita solidariedade – de setores e segmentos que até hoje sentem os impactos da pandemia, como turismo, eventos, agricultura, a própria educação privada… Mas, excluindo eles, claro que é uma surpresa positiva tudo isso que está acontecendo. Alguns dizem que o auxílio emergencial, que tem origem do governo federal, é um dos fatores que contribuem para isso.

“A gente sabe da importância de dezembro para o comércio, a indústria, o serviço… Um fechamento ou qualquer tipo de restrição em dezembro seria gravíssimo para a economia”

O Paraná – Maior poder de compra, não é?

Rotta – Exatamente! A economia está respondendo justamente porque existe o poder de compra do consumidor. A gente sabe que o maior programa de distribuição de renda é o emprego. Se a pessoa tem renda, ela consome do comércio e isso movimenta toda a economia local, seja comércio, serviço e até indústria. Mas a gente realmente tem que dizer que foi uma surpresa. Eu acho que ninguém esperava isso. E todos os índices deste fim de ano são melhores que os do ano passado. Claro que existe também muita preocupação para 2021, quando esse auxílio emergencial cessa, quando as parcelas do seguro-desemprego terminam e que vários setores da economia ainda estarão impossibilitados de retornar à normalidade. Também sabemos que várias vagas de emprego estão em aberto. Hoje faltam candidatos interessados em cumprir essas vagas e isso também é um fator positivo. Mas, resumindo: estamos muito contentes com essas informações. Acho que a gente não esperava isso e, ao mesmo tempo, a gente tem uma preocupação para que esses setores voltem e que, claro, essa boa onda continue e se perpetue em 2021.

 

O Paraná – A pandemia obrigou muitas empresas a se reestruturarem, a investirem nas vendas on-line, muitos até aumentaram o faturamento, e também evidenciou gargalos que talvez não fossem vistos, como a logística. Isso continua após a pandemia?

Rotta – Você citou um assunto muito importante, que é uma característica no novo normal. A gente entendeu, principalmente no início da pandemia, quando houve o lockdown, que as grandes plataformas de e-commerce do Brasil continuaram vendendo e que os hábitos dos consumidores mudaram muito. Hoje, grande parte dos consumidores acaba fazendo suas compras via internet e, baseado nessa nova tendência, a Caciopar e algumas outras associações, algo próximo a 15 associações, aderiram a uma plataforma de e-commerce regional, na qual vamos divulgar os produtos delas e tentar fazer com que esse dinheiro, que antes era direcionado a essas grandes plataformas, fique aqui, na região. Acho que essa foi uma das grandes ações que a gente fez durante a pandemia. Nós tivemos grande apoio do Sebrae, que tirou do stand by o Oeste Compra do Oeste, que é um programa – que eu achava fantástico – que incentiva as compras públicas de empresas regionais. A Prefeitura de Cascavel, por exemplo. Por ano, compra algo próximo a R$ 200 milhões e grande parte desse valor é comprada de empresas de fora do Estado. Então, o Sebrae, muito atento a toda essa organização, tirou o programa do armário. E isso teve uma repercussão muito positiva dentro da Caciopar, porque todos os municípios entenderam que é melhor divulgar as necessidades de compras dos municípios e tentar atendê-las, do que todo esse volume de dinheiro ser canalizado a outros estados. Paralelo a isso, a Caciopar, com uma empresa especializada em e-commerce, criou a plataforma Compras Oeste. É claro que temos ciência da dificuldade de concorrer com essas grandes plataformas nacionais, algumas delas com raio de atuação até fora do País, mas é um primeiro passo e, tudo aquilo que a gente conseguir segurar aqui, a chance de manter os empregos e as empresas em pé é muito maior.

 

O Paraná – Você finaliza agora três anos à frente da Caciopar. Além da pandemia, quais os problemas que conseguiu identificar?

Rotta – Ao longo desse tempo, juntamente com nossa diretoria, a gente tratou de temas muito importantes, como a questão tributária, pois sabemos da importância de uma reforma tributária e de uma reforma administrativa. A Caciopar trabalha muito forte com o Programa Oeste em Desenvolvimento nas questões de infraestrutura, energia, pedágio… Dentro da infraestrutura, o que envolve? Nossa ferrovia, que o governo do Estado está pagando algo em torno de R$ 30 milhões para fazer um estudo de viabilidade partindo de Maracaju (MS), passando por Dourados, Guaíra, Cascavel até Paranaguá. De Cascavel a Guarapuava, o trecho é relativamente novo, só tem alguns trechos de melhorias, mas, de Guarapuava a Paranaguá, terá um traçado novo, uma descida nova da serra. Acredito que esse é um dos grandes gargalos de infraestrutura que estão se desenrolando. Essa semana o governador [Ratinho Junior] esteve aqui e falou sobre isso. Em novembro do ano que vem, se os estudos de viabilidade estiverem ok, essa nova ferrovia vai para leilão na B3 (Bolsa de Valores). A gente sabe que existem vários investidores interessados devido à força produtiva do oeste do Paraná, e também do Centro-Oeste, porque a gente pretende captar parte da produção do Mato Grosso do Sul e existe a possibilidade de um ramal de Cascavel a Foz, também pegando parte da produção do Paraguai, traçado de grande chance de ser muito viável… O governo do Paraná projeta uma movimentação de 80 bilhões de toneladas no Porto de Paranaguá daqui a dez anos. Este ano vai fechar em 55 milhões e só tem uma forma de ele chegar a esses 80 bilhões: reestruturar essa nova Ferroeste.

 

O Paraná – E os pedágios…

Rotta – Com relação aos pedágios, também estamos muito atentos. Temos trabalhado muito com o governo do Estado, apesar de existir uma concessão liderada pelo governo federal, mas a gente questiona muito a questão da outorga onerosa. O ministro Tarcísio Gomes tem feito algumas licitações nesse modelo híbrido, que é o pagamento de outorga e menor preço. Ponderamos que sempre se deveria usar o menor preço de tarifa e excluir a outorga onerosa porque sabemos que vai influenciar no preço do pedágio. Ponderamos muito que, na nova licitação, que vai ter o prazo de 30 anos, pelo modelo de contrato, serão priorizadas as obras nos cinco ou sete primeiros anos. Isso exige uma capacidade de endividamento muito grande das empresas. Questionamos também a questão da desapropriação das áreas para a duplicação. No contrato atual, as desapropriações são de responsabilidade do Estado e, na nova licitação, a empresa devedora terá de pagar as desapropriações. Isso também encarece o preço do pedágio. Inclusive, a gente está, juntamente com empresários e pessoas físicas da região, estudando pagar uma consultoria para entender qual seria o preço mínimo de pedágio do Paraná. Num segundo momento, de repente, até formar um consórcio, uma cooperativa, para compor [disputar] a licitação.

“A gente sabe que o primeiro contrato do Paraná foi um dos primeiros do Brasil, é considerado de primeira geração, e pagamos um preço muito alto. O Paraná perdeu muita competitividade”

O Paraná – Esse estudo seria imediato?

Rotta – Esse estudo seria imediato, sim! Na próxima semana, teremos uma reunião para definir isso. É um valor relativamente alto, algo em torno de R$ 3 milhões. Seria um estudo técnico de engenharia, mas seria um estudo jurídico também. Ele é importantíssimo para entendermos qual é o preço real do pedágio do Paraná nestes próximos 30 anos… porque estamos falando de 30 anos! Será uma nova geração e a gente sabe que o primeiro contrato do Paraná foi um dos primeiros do Brasil, é considerado de primeira geração, e pagamos um preço muito alto. O Paraná perdeu muita competitividade. A nossa preocupação é realmente com isso. A gente não quer mais errar e não podemos mais perder competitividade.

Não só a geração, mas a transmissão da energia. Agora com a venda da Copel Telecom, ficamos otimistas com os investimentos que a Copel já sinalizou em fazer, principalmente na área rural. Aqui, no oeste, são mais de 60 mil produtores que dependem demais da energia elétrica. A oscilação e a baixa qualidade da energia preocupam demais, principalmente a zona rural, e essa é também uma de nossas bandeiras.

Temos também uma das maiores entregas do POD (Programa de Desenvolvimento do Oeste), liderada por Elias Zydek, que é o atual vice-presidente do POD, e que traz uma nova luz ao Paraná. Em maio de 2021, o Paraná fica oficialmente livre de febre aftosa sem vacinação e isso abre uma série de mercados que até então o Paraná não experimentava, porque esse mercado ficava restrito a Santa Catarina.

 

O Paraná – E a questão da tarifa rural noturna, que corre o risco de ser extinta?

Rotta – Ficamos sabendo recentemente da suspensão para 2021 da tarifa noturna, que é uma tarifa subsidiada pelo governo no meio rural. Estamos muito atentos a isso e ponderando com o governo para mantê-la. Toda a cadeia de frango e suíno depende muito da rede elétrica…

 

O Paraná – Pode-se dizer que você deixou tudo encaminhado, os principais gargalos foram organizados?

Rotta – É claro que a luta sempre continua. Eu acho que a gente tem que avançar muito na questão da qualidade das estradas rurais, as reformas… A gente tem que estar sempre atuante, atento e vigilante, porque tem muitos gargalos que nos fazem sofrer e o objetivo de todo esse nosso trabalho é de tornar nossas empresas mais competitivas. Tudo o que tiver relação e interferir na competitividade das nossas empresas a gente procura intermediar e avançar. Essa é basicamente a nossa preocupação.

 

O Paraná – Pretende assumir outro cargo de liderança na região?

Rotta – Eu faço parte da Fecomércio, sou vice-presidente do Sindilojas e fui convidado a fazer parte da mesa diretora do POD. O Danilo Vendruscolo termina o mandato dia 17 e assume o toledense Rainer Zielasko, que também é uma pessoa fantástica, já presidiu a Faceaba, nossa federação. Então, vou ajudar o Rainer na administração do POD como vice-presidente.

“A política partidária tem um papel fundamental, mas, curiosamente, grande parte das pessoas que passa por esses cargos ligados ao associativismo dificilmente tem alguma pretensão política”

 

 

O Paraná – Alguma pretensão política para o futuro?

Rotta – Não tenho. Já me perguntaram e até a gente falava com o Michel [Lopes, presidente da Acic] que é interessante. Acho que tudo passa pela política. A política partidária tem um papel fundamental, mas, curiosamente, grande parte das pessoas que passa por esses cargos ligados ao associativismo dificilmente tem alguma pretensão política. Não digo que seja uma vantagem, acho que é até um ponto negativo nosso, mas realmente não tenho [vontade].

 

O Paraná – Para encerrar… Quais as expectativas para o ano que vem?

Rotta – Ao longo deste ano, a gente percebeu o aumento de preço de muitos produtos, principalmente da cesta básica, derivados da soja, trigo, milho… e isso tem um impacto contundente no IGP-M (Índice Geral de Preços Mercado) e as chances de termos inflação são grandes. Alguns contratos até sugerem que sejam indexados pelo IPCA (Índice de Preço ao Consumidor Amplo) e não pelo IGP-M, em função dos altos índices de inflação que podem acontecer. Muitas indústrias ainda – isso foi uma pesquisa que a CNI (Confederação Nacional da Indústria) fez -, 75% das indústrias, sofrem com o desabastecimento de algum tipo de insumo e isso é muito preocupante porque pode levar a índices de inflação maiores ainda e esse consumo desenfreado também pode levar à inflação. As indústrias podem, em função da dificuldade de produzir, aumentar preço para regular mercado, e isso pode ocasionar inflação. Mas o que realmente esperamos é que não haja especulação e sim bom senso. Que as vagas de trabalho sejam preenchidas, que as empresas voltem a operar, que esses segmentos penalizados voltem à normalidade e que consigamos segurar nossa inflação. A Taxa Selic, que também é um fator muito importante para investimentos, a tendência é de ficar entre 2% e 3% ao ano, um índice muito favorável a investimentos. Se a gente conseguir passar as reformas [tributária e administrativa], vamos ter um ano excepcional em 2021. Acho que o investidor de fora volta a olhar para o Brasil com bons olhos, o mercado imobiliário [ganha] com essa taxa do Selic baixa, pois aquelas pessoas que poupam começam a olhar para outros investimentos menos conservadores e mais rentáveis e isso também é muito positivo porque a gente sabe que a construção civil e imobiliária tem um peso muito grande na economia… Então, acreditamos que, se a gente conseguir as reformas, a segurança da vacina, o retorno da cadeia de turismo, conseguiremos fazer um 2021 muito bom. As expectativas são muito boas!