Líder de uma entidade que visa pensar a região e destravar demandas reprimidas, Rainer Zielasko inicia o mandato à frente do POD (Programa Oeste em Desenvolvimento) com um grande embate: a luta contra a modelagem proposta para as próximas concessões das rodovias que cortam o Paraná.
O POD encabeça petição contrária ao modelo híbrido, com outorga, insistindo na redução das tarifas. “O oeste perde muito em competitividade com o modelo proposto”, alerta. “O POD é contrário ao pagamento da outorga onerosa. Nós queremos lutar por um desconto maior por ocasião da licitação e que depois o degrau tarifário não seja de 40%, seja menor e diluído ao longo dos anos, porque, senão, nós vamos perder de novo competitividade, vai ser difícil sobreviver aqui, no oeste”. E sentencia: “Nós vamos pagar o pedágio mais caro do Brasil de novo!”
O Paraná – O senhor assume o POD num momento em que o mundo tenta sobreviver a uma pandemia, com redesenhos em diversas atividades econômicas e até desafios para as grandes nações. Qual o papel de uma entidade regional neste momento da história?
Rainer Zielasko – O POD é uma ação de governança territorial regional que tem como objetivo promover o desenvolvimento econômico do território oeste do Paraná por meio da sinergia das instituições e integração de iniciativas, projetos e ações. O POD estabelece estratégias de desenvolvimento para a região de maneira organizada e participativa para a tomada de decisões. Seu foco de atuação está no incentivo e na proposição de ações capazes de aumentar a competitividade do território. O oeste, através do POD, é uma experiência única de engajamento e organização da sociedade. O nosso papel é defender os interesses do setor produtivo e, por extensão, dos cidadãos do oeste do Paraná.
O Paraná – Nos últimos anos, talvez décadas, a região oeste ficou relegada a segundo plano quanto a investimentos e demandas, e a concessão das rodovias é só um dos exemplos. O que fazer para que a região comece a ser ouvida e atendida?
Zielasko – O POD foi criado em 2014, tendo como pano de fundo exatamente este conceito: conhecer os gargalos que travam nosso crescimento econômico e competitividade e viabilizar soluções através da sinergia de atores (pessoas e instituições). O Programa capacitou agentes de desenvolvimento territorial para compreender o tema e a amplitude pretendida pelo programa, contribuindo para sua sustentabilidade. O foco é claro: desenvolvimento econômico sustentável do território oeste do Paraná. O objetivo sempre foi organizar as demandas, conhecer os gargalos da região de forma contextualizada e tecnicamente responsável, elencar prioridades e ser articulador de ações e projetos que mitiguem estas necessidades. No nosso entender, ser ouvido por quem decide passa necessariamente por: organização, diálogo, conhecimento e engajamento das lideranças e das instituições para impulsionar decisões políticas que atendam às reais necessidades e expectativas. Como você disse, o pedágio é um dos exemplos de atuação do POD na defesa dos interesses do oeste do Paraná.
O Paraná – O assunto do momento é a próxima concessão das rodovias, quesito que o oeste vem sendo severamente penalizado nos últimos 20 anos, com tarifas altas e sem investimentos. O senhor poderia deixar clara qual a posição e o pedido do POD para essa nova concessão?
Zielasko – Nossa bandeira amplamente defendida e divulgada nos meios sociais, inclusive através de uma petição eletrônica disponível para assinatura de todo e qualquer cidadão interessado em aderir aos argumentos do POD, é, sinteticamente: • NÃO ao modelo de outorga onerosa, seja parcial ou total, pois isso se trata de um tributo disfarçado ou ágio; • aplicação do maior desconto no preço do pedágio, a exemplo de outros estados brasileiros; • Menor degrau tarifário de reajuste das tarifas de pedágio após a duplicação das rodovias.
O Paraná – A polêmica sobre a outorga já tem alguns meses, mas agora a nova proposta sugere que ele seria uma “terceira alternativa”, usada apenas em caso de desempate. Isso não parece uma armadilha?
Zielasko – No modelo em vigência, o oeste do Paraná ficou 23 anos pagando e esperando por obras que não aconteceram. Uma enorme soma de recursos foi deixada nas praças de pedágio, e praticamente nada foi feito em favor dos usuários. Há preocupação com a nova proposta do governo federal de outorga onerosa. O contrato realizado em 1997 era da mesma forma, com outorga, que, na época, não era em valores à União, mas em obras adicionais ao PER (Plano de Exploração Rodoviária) original. Porém, o tempo deixou claro que a outorga pouco influenciou na garantia da execução das obras. As tarifas foram preservadas na sua totalidade e isso não garantiu as obras. A captura do sistema pelas empresas e interessados foi algo cinematográfico, tanto que foram pegos pela operação Lava Jato e desmantelou um dos maiores absurdos em concessões de rodovias já registrados no País.
Os preços do anel de integração e tudo mais, descontos que varia de 30% a 65% sobre os preços atuais. Mas existe alguma dúvida de que os preços atuais estão inchados, que estão inflados? Se houve desvio de verbas, o Ministério Público comprovou que houve roubalheira, tiveram que devolver dinheiro. Claro que essas tarifas são caras, porque estão infladas, excessivas. E é lógico que, pra começar uma nova licitação, tiveram que ajustar isso para baixo, mas ajustaram num valor e daí limitam o desconto em 17% e depois joga um degrau tarifário de 40%. Onde vai parar esse negócio todo? Nós vamos pagar o pedágio mais caro do Brasil de novo!
O Paraná – O senhor faz uma análise interessante sobre os valores envolvidos na proposta, contas que parecem não fechar. Poderia explicar esses números?
Zielasko – Nós participamos da reunião do G7, na qual o Ministério da Infraestrutura apresentou esse plano para a concessão das rodovias do Paraná. E nós, olhando o plano com outras entidades, associações comerciais, sindicatos e conselhos de desenvolvimento dos municípios, começamos a nos debruçar um pouco sobre esses números e algumas coisas nos preocupam. Por exemplo, esse projeto estipulou um preço base para todas as praças de pedágio do Paraná, então, se pegarmos a praça de Cascavel, na saída para Curitiba, só para nós termos um exemplo: essa praça hoje cobra pedágio de R$ 14 [para carro], esse valor no novo mapa dos pedágios do Paraná passa a ser R$ 9,62. E esse preço de R$ 9,62 vai para o processo de licitação e aí começam as nossas dúvidas. Porque a empresa concessionária que vai participar da licitação só pode, pelo processo licitatório, dar desconto máximo de 17%. Esse percentual está dentro do processo licitatório. Se a empresa quiser dar desconto de 20% ou 25%, ela não pode. Só pode 17%. Eles nos falaram na reunião que esse 17% é o máximo que se pode dar de desconto porque, se a empresa der mais desconto, ela pode não executar as obras, ou ela pode judicializar o contrato ou pode querer paralisar tudo. Então, para que não se corra esse risco, o desconto máximo é 17%. Muito bem, desses R$ 9,62, tirando 17%, vou para R$ 8. A empresa ganhou e é R$ 8 o pedágio ali, na saída de Cascavel. Aí ela executa a duplicação da rodovia, concluiu a duplicação nos próximos seis, sete anos, ela tem o direito de colocar degrau tarifário de 40%. Então esses R$ 8, mais 40%, vão para R$ 11,20. E aí nós vamos ficar 25 anos pagando R$ 11,20 mais as correções normais que tiverem ao longo do período, que são contratuais. Aí você pega uma duplicação que aconteceu no segundo semestre do ano passado, lá no Rio Grande do Sul, de 230 quilômetros, a empresa que participou do processo, que era pelo menor preço, não tinha essa limitação de 17%, deu um desconto de 57% e o preço do pedágio lá vai ser R$ 3,50. Então nós vamos estar num estado pagando, com base nesse exemplo, R$ 11,20, enquanto no RS estão pagando R$ 3,50. Aí eu pergunto para vocês: onde o investidor vai investir em novas empresas? Onde as pessoas vão ter capacidade competitiva maior? Onde as empresas vão se desenvolver mais? Lá, com R$ 3,50, ou aqui, com R$ 11,20? É isso que tem que ser olhado. É isso que nós estamos querendo olhar. O processo de só dar 17% de desconto é porque algumas empresas que vão participar, uma, duas, três ou quatro, darão os 17% de desconto. Quem é que vai vencer a licitação? Aí vem o segundo passo: que é aquela que pagar a maior outorga onerosa, pagar a joia para o governo. E de onde vai sair esse dinheiro? A concessionária vai tirar do bolso dela? Não! Ela vai cobrar de nós, usuários. Então, se o processo licitatório não quer que a empresa dê mais que 17% de desconto, porque senão coloca a empresa em risco de não executar as obras, como ela vai tirar dinheiro para pagar a outorga onerosa? Tem gordura aí pra queimar… Essas questões que têm que ser muito bem explicadas.
Por isso o POD é contrário ao pagamento da outorga onerosa. Nós queremos lutar por um desconto maior por ocasião da licitação e que depois o degrau tarifário não seja de 40%, seja menor e diluído ao longo dos anos, porque, senão, nós vamos perder de novo competitividade, vai ser difícil sobreviver aqui, no oeste. Os insumos nossos que vêm de fora serão muito mais caros e os nossos produtos para serem levados pra fora também.
Quando é normal em licitações que se pague a outorga onerosa? Quando você recebe a rodovia pronta do governo federal e você devolve o dinheiro público investido naquela obra para os cofres públicos e passa a fazer só a manutenção daquela estrada.
Outra coisa que ficamos impressionados. Quando você olha os números do pedágio, você vê que o faturamento ao longo de 30 anos é de R$ 156 bilhões, e vamos investir em obras já do terceiro ao nono ano R$ 42 bilhões. Poxa, que coisa linda! Duplicar tudo, ter rodovia com wi-fi, local de descanso para motorista, trevos de acesso a cidades iluminados, tudo isso fantástico. Mas veja bem: de R$ 156 bilhões, R$ 42 bilhões serão para execução dessas obras e mais R$ 34 bilhões para manutenção das rodovias, então, 156 menos 42 e 36, sobram R$ 80 bilhões, o que será feito com esses R$ 80 bilhões ao longo de 30 anos?
O Paraná – O governo estadual defende o modelo proposto, alegando que seria a garantia para que os investimentos saiam do papel. Isso não poderia ser garantido de forma clara nos termos do contrato?
Zielasko – Se essas empresas, durante o período de suas concessões, tiverem problemas de fluxo de investimento, falta de cumprimento de contrato por incompetência de gestão ou envolvimento em escândalos de corrupção, entendemos que o Estado é responsável por arguir nulidades ou anulação de contratos, e que faça novas licitações em que seja garantida a menor tarifa possível. Concessões rodoviárias são negócios como quaisquer outros. O que estão tentando colocar é que nunca exista o risco ao licitante. Ora, os riscos de variações de fluxos momentâneos, crises ou descontos excessivos na licitação não podem ser mitigados em sua totalidade. Se a empresa participante da licitação, no processo de concessão, na busca de vencer, dá descontos demasiados que a coloquem em risco, ela mesma deve arcar com as consequências. A população deve, e merece, permanecer com a tarifa baixa até que o governo resolva a problemática jurídica.
O Paraná – Em fevereiro começam as audiências públicas. O senhor acredita que o posicionamento das entidades possa mudar a proposta das novas concessões?
Zielasko – Acreditamos que as audiências públicas são um modelo constitucional de participação da sociedade e transparência nas ações do governo. Elas viabilizam ouvir a sociedade e seus anseios. Neste quesito, o POD visa ao engajamento e à informação da sociedade sobre qual é a proposta do governo e qual é o posicionamento do POD. Nosso papel neste momento é informar o cidadão oestino – e por extensão os paranaenses – sobre o tema, dando-lhes condições de opinar e participar de forma consciente do debate em torno do tema.
O oeste perde muito em competitividade com o modelo proposto. Nosso olhar é para o presente e para os próximos 30 anos, e agora é o momento certo de nos mobilizarmos e agir de acordo com nossas convicções que atendam de forma pacífica, democrática, cívica e consciente às necessidades de toda a população do oeste do Paraná.
O Paraná – Como vocês avaliam o papel da agência reguladora (Agepar) na condução dos atuais contratos de pedágio? Há de se mudar algo para as próximas concessões?
Zielasko – A Agepar (Agência Reguladora do Estado do Paraná) tem a função de acompanhar a finalização desses contratos para que as rodovias tenham todas as obras do contrato concluídas. Entendemos que, nos futuros contratos, o órgão regulador seja a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), salvo se houver alguma delegação à Agência Estadual, informação esta da qual não dispomos até o presente momento.
O Paraná – Além dos pedágios, quais as principais demandas ativas do POD e qual a previsão de que evoluam?
Zielasko – O POD elegeu ações prioritárias de trabalho em 2020 e é nisso que viemos trabalhando. São sete câmaras técnicas que vêm atuando de forma sistêmica no território com ações voltadas aos objetivos traçados.
SANIDADE AGROPECUÁRIA
Objetivo: Garantir a Sanidade Agropecuária do Oeste do Paraná
1 – Estruturar e fortalecer os Conselhos Municipais de Sanidade Agropecuária (CSA); 2 – Fomentar o monitoramento e o controle da Biosseguridade Agropecuária; 3 – Manter o oeste do Paraná como área livre de endemias/ doenças da agropecuária.
INFRAESTRUTURA E LOGÍSTICA
Objetivo: Reduzir o custo logístico com maior eficiência e competitividade para o Paraná.
1 – Implementar o novo modelo de integração ferroviária do Paraná; 2 – Implementar o novo modelo de concessões rodoviárias do Paraná; 3 – Buscar maior eficiência e modernização dos portos do Paraná para ampliar o escoamento da produção; 4 – Apoiar a implantação do Aeroporto Regional.
PLANO ENERGÉTICO DO OESTE
Objetivo: Fazer com que a região oeste obtenha infraestrutura energética adequada às demandas dos setores produtivos.
1 – Utilizar o indicador de demanda de energia elétrica do oeste do Paraná para planejar os investimentos na região; 2 – Articulação do POD no ambiente institucional para simplificação, desoneração e facilitação de negócios com energia; 3 – Apoiar os municípios do oeste do Paraná no desenvolvimento da cultura de gestão de energia.
SISTEMA REGIONAL DE INOVAÇÃO (SRI)
Objetivo: Promover um ambiente favorável à inovação por meio da cooperação para o desenvolvimento regional.
1 – Criar fundos de inovação; 2 – Consolidar o movimento Iguassu Valley; 3 – Ser reconhecido pelo Mapa como Polo de Inovação Agropecuária; 4 – Ampliar redes de habitats de inovação.
EDUCAÇÃO
Objetivo: Estimular a implantação de propostas educacionais inovadoras e de novas metodologias de ensino voltadas para a formação de cidadãos capazes de transformar o meio em que vivem.
1 – Formação docente; 2 – Implantação de legislação favorável para projetos na educação; 3 – Empreendedorismo e inovação nas instituições de ensino.
SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL
Objetivo: Fomentar e incentivar ações de sustentabilidade ambiental.
1 – Fomentar a busca de soluções para dejetos criatórios e destinação de lixos urbanos; 2 – Estimular programas de conservação dos solos e das águas.
PEQUENOS NEGÓCIOS
Objetivo: Desenvolver um ambiente favorável ao desenvolvimento de pequenos negócios como forma de dinamizar a economia regional.
1 – Mobilizar entes públicos para a criação de políticas de incentivo e apoio aos pequenos negócios; 2 – Sensibilizar para a modernização da gestão dos pequenos negócios para o aumento da competitividade econômica; 3 – Mobilizar os municípios para a adoção de conceitos de Cidades Inteligentes.