Pesquisa feita pela Universidade da Carolina do Norte trouxe à tona um assunto ainda tabu entre atletas de longas distâncias e que vem dividindo opiniões. Autor do estudo e professor de fisiologia do exercício e nutrição, o doutor Anthony Hackney afirma que atletas costumam ter uma diminuição na taxa de libido à medida que praticam esportes que exigem uma resistência maior.
?Não estamos falando de pessoas que passam 30 minutos na academia, mas sim de pessoas que correm 80 quilômetros por semana. Coloque um sedentário para praticar uma atividade física regular e perder um pouco de peso que a libido dele vai subir. Mas este estudo mostra que, se temos pessoas praticando grandes volumes de treinamento e em grande intensidade, ano após ano a libido vai caindo?, afirma o doutor, em artigo publicado no jornal britânico ?The Times?, na última quarta-feira.
Marcio Villar, de 50 anos, é um atleta que consegue passar sete dias inteiros consecutivos correndo (foi assim que bateu o recorde mundial de corrida em esteira em julho de 2015). Para ele, Anthony Hackney está equivocado.
? A ultramaratona (provas acima de 42,2km) aumenta o seu apetite sexual. O psicológico é mais importante do que o físico nas longas distâncias. Portanto, o ultramaratonista tem um psicológico muito forte a ponto de ter domínio total sobre o corpo. E isso ajuda na atividade sexual ? diz Villar, completando. ? Não é o meu caso porque sou casado. Mas os ultramaratonistas fazem sucesso. As mulheres ficam curiosas para saber de onde vem tanta energia.
Diego Costa, de 34 anos, faz eco ao amigo de corrida Villar:
? Acho que a libido aumenta de acordo com a quilometragem. No ano passado, fiz uma prova de 235km, na Serra da Mantiqueira. Quando cruzei a linha de chegada, meu corpo não se aguentava em pé, mas eu estava excitado.
Para o treinador de corrida Marcius Duarte, ainda há um tabu entre os homens sobre este assunto, enquanto ?as mulheres são mais sinceras?. Ele conta que, em 31 anos de profissão, nunca ouviu reclamações de diminuição do apetite sexual entre maratonistas, mas acha razoável que isso aconteça em pessoas que tem uma carga mais exaustiva de treino.
? Um ultramaratonista treina cerca de três horas por dia, e claro que existe um desgaste físico muito grande. Então, se essa pessoa vir uma cama, ela não vai pensar nada além de descanso ? analisa Marcius.
Rosália Camargo, de 38 anos, venceu os 50km das edições de Angra dos Reis e Tiradentes (MG) do XTerra, no ano passado. Ela é casada com um ultramaratonista e acredita ser uma prova viva de que quanto mais treino, menor será a libido.
? Eu engravidei quando tive uma lesão no joelho e fiquei meses de molho em casa. Nessa época, o apetite aumentou. Quando se está treinando para um grande desafio, o seu foco se volta todo para a prova. E o ultramaratonista é uma pessoa meio egoísta, que pensa apenas no seu corpo e no descanso ? revela Rosália.
CRÍTICA DE ESPECIALISTAS
Os médicos especializados em medicina do esporte procurados pela reportagem fazem duras críticas à pesquisa de Anthony Hackney. Claudio Gil atende atletas de diferentes níveis em seu consultório. Ele conta que nunca ouviu uma reclamação referente à queda de libido e afirma que ?biologicamente não há nada que comprove a relação apontada pela pesquisa americana?.
? A leitura da pesquisa é superficial, só foi analisada a taxa de libido do indivíduo que já faz atividades físicas. O correto seria fazer antes e depois de ele ter começado a prática para ter um resultado mais fidedigno ? pondera o médico. ? Fora isso, a leitura é equivocada também. No grupo entre 26 e 40 anos, temos 392 atletas com taxas normais ou altas e apenas em 8 elas pequenas. Podemos entender também que o exercício de resistência ajuda a combater a baixa taxa de libido, já que a maioria imensa dos atletas, neste caso, não tem problema com isso.
Para Fabiula Schwartz, cardiologista oficial da Maratona do Rio, o pesquisador ?extrapolou na conclusão?:
? O autor não leva em conta aspectos que podem confundir a conclusão. Por exemplo: já se sabe que ocorre um baixa na produção de testosterona nas pessoas que têm uma dieta com pouca gordura e tem baixo índice de gordura corporal. Isso não é levado em conta na pesquisa.