SÃO PAULO ? Criado em uma família católica, Rodrigo Santoro credita aos avós paternos, Eva e Salvador, imigrantes italianos que moram em Petrópolis, sua formação religiosa. Ele cita também a avó materna, Nete, espírita, como fundamental nesse sentido. O ator brasileiro, que interpreta Jesus Cristo em ?Ben-Hur?, filme com estreia prevista para o dia 18, diz ser mais ?espiritualizado? do que religioso. Santoro conta que já havia sido convidado para interpretar Jesus no passado, em uma encenação da Paixão de Cristo, mas não pôde aceitar por problemas de agenda. A oferta de participar da releitura do romance de Lew Wallace, sob direção do russo Timur Bekmambetov, com Jack Huston no icônico papel-título, causou-lhe sentimentos contraditórios: Links Santoro
? Fui invadido por uma série de sensações: vontade, estímulo e, ao mesmo tempo, receio. É um personagem incomparável. Fiquei com aquilo na cabeça. Independentemente de tudo, pensei: vou tentar me descolar do racional e me escutar. Foi quando eu me decidi. Eu quero passar por isso. Foi uma jornada, íntima, espiritual e transformadora. Transcendeu as minhas expectativas ? disse ele ao GLOBO nesta terça, no evento de promoção do longa, em São Paulo.
O Jesus de Santoro é muito diferente do que aparece na versão anterior do filme, dirigida em 1959 por William Wyler. Aparece várias vezes, pontua a narrativa, tem falas e interage diretamente com o personagem-título, o nobre Judah Ben-Hur (Jack Huston), que é traído pelo irmão de criação, Messala (Toby Kebbell), e mandado como escravo para as galés. Para criá-lo, ele iniciou um processo revendo filmes como ?Rei dos reis? (1961), ?O evangelho segundo São Mateus? (1964) e ?A Paixão de Cristo? (2004) e buscando as representações pictóricas, nas artes barrocas e renascentistas:
? Quanto mais eu ia buscar essas referências, mais percebia que era interessante, mas não ia me ajudar. Elas me alimentaram, mas não eram o fio inspirador que estava buscando. Encontrei isso meditando e praticando ioga, que faz parte da minha vida. Independentemente de como Jesus era, eu precisava me conectar com os valores que ele pregava, como o amor incondicional: ?Ama ao próximo como a ti mesmo?. Vamos ver como isso é de verdade.
Santoro rodou sua participação em ?Ben-Hur? na cidade de Matera, no sul da Itália, em fevereiro do ano passado, na semana do carnaval. Como previa, uma das cenas mais emblemáticas e significativas foi a da crucificação, que o exigiu fisicamente e foi emocionante para toda a equipe reunida. Literalmente esculpida nas pedras, a cidade fica no pé de um morro, onde as cruzes foram construídas. A filmagem foi feita na quarta-feira de cinzas, em um dia frio precedido por uma noite de nevasca.
? Eu cheguei ao set às 2h e saí da maquiagem às 8h, com o corpo todo preparado. Estava um frio tremendo e eu pedi para gravarmos sem cortar, que eu mesmo recomeçaria a cena do início se houvesse algum problema. Isso tudo ajudou muito, porque quando eu dizia as minhas três falas o pessoal da equipe e os extras ficavam emocionados ? explicou ele.
O ator britânico Jack Huston, que também veio ao Brasil para promover o filme, confirmou que foi um momento de catarse:
? Rodrigo é um ator muito devotado. Ele se entrega. Seja você religioso ou não, já que somos invadidos por essas imagens de Jesus desde pequeno, estar no meio dessa cena, com os soldados e os fiéis, foi uma emoção muito grande. Eu e muitas outras pessoas caímos em lágrimas literalmente. E olhe que não sou religioso, estou mais para uma pessoa espiritualizada. Mas aí está uma outra coisa que foi importante: não o tratávamos como Jesus, mas como um homem comum que ensinava as pessoas a se amar.
Huston também teve seu momento de mergulhar no personagem e se doar fisicamente. Toda a sequência da corrida de bigas, que é o ponto alto do filme de Wyller e abre o filme de Bekmambetov, foi feita sem o uso de computação gráfica ? a não ser para a construção dos cenários:
? Toda a parte da corrida para valer, com os cavalos e tudo, éramos nós. Timur (Bekmambetov) disse que, numa época em que temos filmes como (a franquia) ?Transformers?, é preciso imprimir realidade. Além do mais, o filme de Wyler (de 1959) não usou efeitos computadorizados ? brincou o protagonista.
POLÊMICA EM ‘WESTWORLD’
Santoro também estará em ?Westworld?, inspirada na ficção científica ?Westworld ? Onde ninguém tem alma? (1973), escrita e dirigida por Michael Crichton. Clássico da ?Sessão da Tarde?, o filme mostra a experiência de dois milionários em um parque de diversões para adultos que simula aventuras em ambientes como o Velho Oeste e a Roma Antiga. Na série, produzida pela HBO, com estreia prevista para 2 de outubro, o ator brasileiro faz uma nova versão do caubói interpretado por Yul Brynner no longa.
? Não posso dizer muito a respeito do personagem ? disse ele. ? Só que não é um caubói convencional e tem um humor muito peculiar. É uma espécie de ?caubói apocalíptico?. Ele tem um tom profético. Tem coisas do personagem do Yul Brynner, mas, como é uma série, vai muito além do filme. Eu adoro o personagem. Não sei o que esperar, mas acho que vai ser muito bom. Trailer de ‘Ben-Hur’
Sobre a polêmica recente em torno da excessiva exposição de violência contra mulheres na série, após a exibição de um capítulo para críticos, nesta semana, Santoro disse que, de fato, há muitas cenas fortes. Mas ele rejeita a ideia de que seja algo gratuito:
? Ela (a violência) existe, é verdade. É uma polêmica que não me surpreende. Mas não é exaltação, nem uma exploração da violência. Existe uma investigação do comportamento humano. As pessoas vão se surpreender com o resultado ? aposta ele.
Depois de retornar às novelas interpretando Afrânio na primeira etapa de ?Velho Chico?, Santoro disse que tem outros planos para voltar a atuar mais no Brasil, sem, é claro, esquecer a carreira internacional. Há convites para fazer filmes nacionais, que ainda estão em negociação, e um plano de voltar aos palcos.
? É um sonho meu ? diz ele. ? Estou cultivando com muito carinho. Já me convenci de que não precisam ser temporadas longas, podem ser curtas. E tem a ver com a ideia de voltar para as novelas, que é de reciclar e voltar a um meio que me é muito caro, o teatro. Ainda não sei se serão clássicos ou alguma coisa contemporânea. Estou lendo.