Cotidiano

No Rio, Irvine Welsh dá detalhes sobre 'Trainspotting 2'

59694350_SC Rio de Janeiro 04 de julho de 2016 Escritor irvine Welsh Foto Antonio Scorza- Ag.jpgRIO – Apresentado a boa parte de seus fãs brasileiros a partir do sucesso do livro “Trainspotting” (1993) e do filme homônimo dirigido por Danny Boyle, em 1996, o escritor escocês Irvine Welsh abriu a série Encontros O Globo ? Especial Pós-Flip na noite desta segunda-feira, na livraria Travessa do Shopping Leblon, com uma conversa com o público mediada pelo jornalista e crítico de cinema do GLOBO André Miranda. No papo, Welsh falou da sua carreira, do processo criativo que gerou seu mais recente romance, ?A vida sexual da gêmeas siamesas? (Rocco), e das paixões que impulsionam até hoje a sua escrita e a sua vida, como a música, o futebol, além do universo das drogas e da cultura urbana. Pouco antes de vir ao Brasil, o escritor estava acompanhando as filmagens de “Trainspotting 2”, e falou um pouco sobre o desenvolvimento do longa e dos icônicos Spud, Begbie, Renton e Sick Boy, os famosos personagens do seu primeiro livro.

? O novo filme se baseia no livro “Porno”, que veio na sequência de “Trainspotting”, e o que fizemos foram algumas mudanças para tornar a trama um pouco mais contemporânea ? disse. ? No primeiro filme eu fazia um traficante, mas agora esse cara subiu de vida. Ele continua um negociador, mas agora ele vende carros de luxo, mas também vende algumas drogas, e coisas como Viagra etc.

Quando perguntado sobre a importância do uso das drogas para seu processo criativo e para a sua escrita, Welsh frisou que a sua relação com as drogas segue “experimental”, enfatizando caráter de experiência episódica, e não constante:

? Eu sempre achei importante experimentar, mas de algum modo como uma forma de acumular mais experiências, mas saí dessa fase dos 20 e dos 30 anos em que consumia muito mais droga ? disse.
Welsh também ressaltou que as drogas estão presentes na sua literatura sempre relacionadas a certo contexto cultural, como um elemento que revela algo sobre um ambiente e as pessoas um círculo social específico:

? Eu não escrevo sobre as drogas exatamente, com um desejo de investigar processos psicoativos, mas investigo o lugar e a função da droga em certos contextos ? disse. ? Quando eu tinha trinta e poucos anos eu usei bastante droga, muita cocaína e ecstasy, mas isso acontecia porque eu estava trabalhando numa boate, e essas drogas diziam respeito àquele ambiente. Mas depois que saí de lá, perdi um pouco interesse. Experimentei outras coisas, ainda experimento, mas quando você fica mais velho, o ritmo é outro. As ressacas são piores, o cansaço, então chega num ponto em que não faz mais sentido.

Ao invés de viciados em heroína, alcoólatras e psicopatas violentos, a obra é guiada por instrutores de fitness, exibicionistas em geral e outros tipos anabolizados. Busca por fama, dinheiro e visibilidade são traços que rondam os personagens, entre eles a personal trainer Lucy Brennan, que ganha fama ao ter um ato heróico registrado por um celular e disparado na web — ela interfere em uma tentativa de assassinato e imobiliza um homem armado. No dia seguinte ao ato, ela amanhece como uma das grandes sensações midiáticas, atrás apenas das gêmeas siamesas de 15 anos do Arkansas que dividiram a nação com seu dilema moral: o que fazer quando uma quer sair para namorar e a outra prefere ficar em casa?

? São personagens que, de certa forma, estão presas numa espécie de loop, de um ciclo repetitivo de comportamento, mas elas estão tentando fazer alguma coisa ? disse. ? E isso é importante, porque geralmente gostamos de personagens que estão em movimento, tentando, buscando ir de uma situação para outra, mudar alguma coisa.

E quando perguntado sobre suas atuais motivações e buscas, o autor concluiu dizendo que sua nova trama busca superar algo que sempre o incomodou.

? Essas personagens nos ajudam a ver e a pensar sobre uma espécie de lacuna ou falta de sintonia entre as artes e os esportes, algo que sempre marcou a minha experiência de vida na Escócia ? disse. ? Eu sempre amei esses dois mundos, e essa união é, em alguma medida, a base desse livro. As artes e os esportes como uma forma de completar as pessoas.

Nesta terça-feira será a vez de Leonardo Cazes comandar um bate-papo com o escritor norueguês Karl Ove Knausgard, que acaba de lançar no Brasil ?Uma temporada no escuro? (Companhia das Letras), quarto volume da série ?Minha luta?, colossal romance autobiográfico de mais de três mil páginas no qual o escritor narra sua vida. Na quarta-feira, a jornalista Mariana Filgueiras conversa com o humorista português Ricardo Araújo Pereira, que fala do novo “A doença, o sofrimento e a morte entram num bar” (Tinta da China Brasil), sobre a escrita do texto de humor.