SÃO PAULO ? Atual secretário-executivo do Ministério da Cultura, o cineasta mineiro João Batista de Andrade, de 77 anos, afirma que resistiu ?o quanto pôde? às investidas do ministro Roberto Freire para assumir a presidência da Agência Nacional do Cinema (Ancine). Ao fim de três meses, Andrade finalmente cedeu e, na tarde de anteontem, comunicou a Freire que aceitaria a missão ? a informação foi antecipada ontem pelo colunista do GLOBO Ancelmo Gois, em seu blog. O atual diretor-presidente da agência, Manoel Rangel, fica no cargo até o dia 20 de maio.
? Não era o meu projeto (ir para a Ancine). Agora, o ministro tem as razões dele, achava que o nome para o cargo era o meu. Eu tentei desviar o quanto pude, sugeri outros nomes, disse para esperarmos. Não adiantou. Depois de três meses, resolvi aceitar ? disse ele, que na última terça-feira participou, ao lado de Freire, do secretário de Fomento e Incentivo à Cultura, José Paulo Martins, e da secretária do Audiovisual, Mariana Ribas, da entrevista coletiva que anunciou as mudanças da Lei Rouanet.
A indicação de Andrade segue um rito. Primeiro, será levada para sanção do presidente, Michel Temer. Depois, ele será sabatinado por uma comissão do Senado, e, mais tarde, sua nomeação deverá passar por aprovação dos senadores em plenário. Esse processo deve coincidir com a saída de Rangel da agência.
Antes de assumir a secretaria-executiva do MinC, o cineasta foi secretário de Cultura do Estado de SP, entre 2005 e 2006, no governo Alckmin. E também foi presidente da Fundação Memorial da América Latina, de 2012 a 2016. Uma das razões pelas quais Andrade resistiu tanto a aceitar o cargo na Ancine foi justamente a experiência diversa que acumulou como gestor:
? Desde que fui para a secretaria de Cultura do governo Alckmin, fiquei com vontade de lidar com todas as formas de arte ? justificou ele.
Com um extenso currículo como cineasta, Andrade dirigiu, entre outros filmes, ?Doramundo? (1978), suspense político sobre uma série de mortes na cidade de Paranapiacaba, e o clássico ?O homem que virou suco? (1980), com José Dumont no papel de um poeta nordestino que vai a São Paulo sobreviver de sua arte, além de ?O país dos tenentes? (1987), que coloca em discussão o fim da ditadura militar.
Em 2005, realizou o documentário ?Vlado, trinta anos depois?, sobre a morte do jornalista Vladimir Herzog em 1975, após ser torturado por agentes da ditadura militar.
? Não posso negar que minha ligação com o cinema é mais forte ? assumiu ele.
LEGISLAçÃO ATrASADA
À frente da agência, Andrade disse que pretende investir nas novas tecnologias e na adequação da legislação para acomodar as modernizações pelas quais passam o audiovisual:
? Eu acho que tem que modernizar muito. A política cinematográfica precisa se atualizar, diante das transformações pelas quais estamos passando, diante de tantas mudanças tecnológicas. Tem essa história do VoD (video on demand) e o papel das teles na distribuição de audiovisual. Está mudando o panorama no mundo inteiro. A própria legislação está atrasada e precisa mudar ? disse ele, que não deu detalhes sobre sobre seu sucessor na secretaria-executiva.
Ao falar de seus antecessores, Andrade adotou um tom conciliador. Elogiou as gestões de Augusto Sevá e Manoel Rangel, dizendo que fizeram um ?trabalho extraordinário?. Sobre Rangel, disse ainda que ambos têm uma relação muito boa.
? Não me ouviram fazer críticas diretas a eles. Mas acho que a gestão tem que ser mais democrática. E tem que olhar para a frente, não ficar remoendo o que está atrás.
Andrade nega que sua indicação à presidência da Ancine seja uma resposta à nomeação do jornalista Sérgio Sá Leitão a uma diretoria da agência, como chegou a ser sugerido por fontes ouvidas pelo GLOBO. Se tiver seu nome aprovado, Sá Leitão substituirá Rosana Alcântara, cujo mandato terminou em fevereiro.
? Não tem isso. Até porque o meu nome começou a ser considerado para a presidência da Ancine antes da indicação do Sérgio para a diretoria. Não o conheço pessoalmente, mas sei do seu trabalho como secretário de Cultura e à frente da RioFilme ? disse ele.