Cotidiano

Donos de imóveis na Zona Sul resistem às ofertas de compradores

2016 904304706-201604210028231139.jpg_20160421.jpgRIO? Não importa o tamanho da oferta. Certos imóveis não estão à venda. Mesmo cercados por grandes prédios e com propostas batendo literalmente à porta, os donos de algumas residências não abrem mão de lares que contam, em grande parte, a história de gerações de proprietários.

É o caso de Péricles Memória Filho, o Pekito. Para conhecer a história de sua casa na Rua Canning, em Ipanema, é preciso viajar no tempo, mais precisamente para 1910, quando seu avô, Archimedes Memória, saiu do Ceará para estudar arquitetuta na Escola Nacional de Belas Artes no Rio. A trajetória de Archimedes fez dele um grande nome da arquitetura eclética. Em 1920, ele assumiu o escritório de seu falecido sogro, Heitor de Melo, ao lado do sócio Francisque Cuchet. No currículo do ?Escritório Técnico Heitor de Mello, Archimedes Memória e Francisque Cuchet? há projetos como o do Palácio Tiradentes. Mas aos olhos de Pekito, o mais bonito deles parece ser a casa projetada pelo avô há 90 anos, onde ele vive com a família até hoje.

? Tem teto afresco, colunas toscanas. Eu nasci aqui, tenho honra e carinho imensos pela história. Digo que a casa foi tombada por mim. É invendável ? diz o também arquiteto.

No mesmo bairro, uma imponente casa de pedra, de 1938, se destaca na Redentor 64. Tudo graças à resistência de Anna Saraiva, que viveu ali por 60 anos, até falecer recentemente. Sua filha, Lívia Mourão, conta a história e relata como preserva a vontade da mãe:

? Na década de 1980, com o boom mobiliário, as ofertas eram ostensivas, semanais. Depois diminuiu. Minha mãe chegou aqui criança. Ficou traumatizada quando meu avô vendeu a casa anterior, uma chácara na Joaquim Nabuco, ponto de encontro de amigos. Ela não aceitava vender essa. Nosso interesse é mantê-la para os filhos e netos ? conta.

Hoje, Lívia aluga o espaço para eventos, como exposições e lançamentos de livros. No interior ainda se conservam fotos da família em porta-retratos. Os vitrais do artista Gastão 2016 907779896-201605071640135543.jpg_20160507.jpgFormenti dão ar iluminado ao local. A casa foi tutelada, o que impede mudanças na parte de fora, mas ainda permite a venda. Apesar de dores de cabeça, como o portão enferrujado e a procura por maçanetas parecidas com as que caem, Lívia diz que não pretende vender.

Na Rua Prudente de Morais 1.132, o morador cansou de gastar saliva. Colocou uma placa avisando que a casa não está à venda, com um recado claro: ?Não insista?.

A varanda da bela casa da José Linhares 75, no Leblon, dá a impressão de não pertencer ao conjunto. É um elemento isolado no meio da correria dos alunos do Santo Agostinho e do entra e sai dos estabelecimentos. Ao bater, quem atende é Maria José, funcionária desde 1965. Ela não diz muita coisa, só que a dona ?está dormindo? e deixa claro o óbvio:

? Já ofereceram muito dinheiro. Ela jamais aceitou.

2016 901450514-201604080808237048.jpg_20160506.jpgO pesquisador Rafael Bokor, autor de ?Rio e prédios antigos”, completa:

? A proprietária chegou na casa em 1935, com menos de 10 anos, e está lá até hoje. É a casa mais bonita e impressionante do bairro.