Cotidiano

Chafik Benazzouz, designer: ?O Rio convida a viver a espiritualidade?

?Nasci na Normandia, na França, em 1970. Aos 17 anos, mudei-me para Paris,
onde estudei Arquitetura e Design. Em 2000, visitei o Brasil pela primeira vez.
Sou apaixonado pelo Rio e amo trabalhar aqui. Hoje, ofereço um programa de
residência para incentivar o diálogo inter-religioso através da arte.?

Conte algo que não sei.

O Rio é uma cidade que o convida a viver a
espiritualidade. E muitos não têm consciência disso. A espiritualidade permite
que você se desconecte do mundo. Seja em um banho de mar ou numa trilha na Pedra
da Gávea, são muitas as possibilidades para as pessoas terem o seu próprio
momento. E independe da classe social da pessoa. Já viajei muito e não encontrei
isso em nenhum outro lugar.

Por que a decisão de trabalhar no Brasil?

Sempre tive vontade de conhecer o Rio, principalmente por causa da música
brasileira. A primeira vez que visitei a cidade foi no réveillon de 2000. Passei
duas semanas e me apaixonei. Há uma espiritualidade que não existe em nenhuma
outra cidade, onde diferentes religiões têm a permissão de se expressar. O
Brasil precisa exportar essa liberdade de cultos, que ajuda a construir a
fraternidade.

Você chama seus centros de design de abadias. Por quê?

As abadias são grupos de fé, geralmente cristã, onde as
pessoas trabalham, residem e utilizam o espaço para meditação. Eu busquei criar
uma comunidade internacional onde os membros têm o objetivo de usar o design
para desenvolver o humanismo e a fraternidade como ferramenta de transformação
social. O trabalho manual do artesão pode ser considerado um tipo de meditação.
A abadia carioca recebe artistas do mundo todo. Além disso, o casarão é uma
vitrine da criação brasileira.

E onde entra a religiosidade nessa iniciativa?

Não gosto muito do termo religiosidade. Prefiro
espiritualidade. A abadia é um local de encontro inter-religioso. A fé não é
para separar as pessoas, mas para uni-las. Esse casarão era um antigo retiro
franciscano, e uma frase estava presente em todos os cantos, nas gavetas, nas
paredes e nos móveis: ?O que faria Jesus no meu lugar??. Ela foi a origem da
comunidade, com um sentido de libertação e de questionamento da fé. O que teria
feito Jesus como arquiteto, designer, artista, pedreiro ou marceneiro?

Qual a principal característica do design brasileiro?

O que o identifica é o reaproveitamento de materiais, o que não é encontrado
em nenhum outro país. O design brasileiro é muito ligado à natureza: madeira,
folhas, couros. Sempre quis mostrar objetos bem feitos e produzidos a partir de
materiais exclusivos, naturais e sustentáveis. É uma nova proposta de produtos
de luxo, um luxo brasileiro que poucas pessoas conhecem lá fora.

Após 17 anos trabalhando nos dois países, quais as principais
diferenças entre o design francês e o
brasileiro?

Considero o mercado brasileiro mais desenvolvido. A França tem projetos
bacanas, mas geralmente públicos, como museus e escolas. Já no Brasil, as
pessoas têm o costume de contratar um designer para projetar o quarto dos
filhos, por exemplo.

Quais são os seus projetos futuros?

Vamos inaugurar uma nova abadia em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, até
2024. Será um projeto desenvolvido em parceria com a arquiteta carioca Flavia de
Faria. O objetivo é criar vínculos entre a América Latina e o Oriente Médio. O
design brasileiro precisa estar presente lá.