Agronegócio

Crise no campo: Em tom de apelo, produtores distribuem leite para idosos

Em carreata, produtores chamam atenção à crise do setor leiteiro

Crise no campo: Em tom de apelo, produtores distribuem leite para idosos

Toledo – O setor leiteiro, ao contrário da cadeia do agronegócio, tem passado seus apuros nessa pandemia. A desvalorização do leite no campo em maio – após altas consecutivas de dezembro de 2019 a abril de 2020 – esteve atrelada às incertezas no mercado de derivados em abril. Como forma de chamar a atenção da população para as dificuldades enfrentadas no setor e do poder público para o descumprimento de uma lei federal sancionada em 2012, quase 90 produtores de leite da região realizaram ontem (4) uma carreata pelas ruas de Toledo, onde distribuíram derivados de leite ao Lar dos Idosos e fizeram uma ação de doação de sangue no Hemocentro.

Segundo os pecuaristas, a produção não parou, mas a demanda de derivados caiu, derrubando o preço do leite. Com o fechamento de pizzarias, restaurantes e panificadores durante a pandemia, a produção de queijo muçarela caiu nos laticínios: de 46,5% do leite comercializado pelas empresas em março para 39,2% em abril.

“O preço pago pelos laticínios caiu. A queda em maio foi de 10% em relação ao mês anterior, quando o litro de leite foi comercializado a R$ 1,37”, explica o produtor Tiago Alexandre Flach, de Missal.

Sem demora

Uma das demandas dos manifestantes é a adoção prática da Lei 12.669, de 2012, que obriga o laticínio a informar ao produtor o preço pago pelo litro até o dia 25 do mês anterior à entrega. Em parágrafo único, diz ainda que “a não informação penalizará a empresa de beneficiamento e comércio de laticínios a pagar o maior preço praticado no mercado”. Hoje, a produção é paga no mês seguinte, pelo preço vigente.

“Sabendo o preço no dia 25 é um divisor de águas para a produção, porque, de certa forma, sabendo o preço, o produtor consegue calcular e gerenciar o custo. Seria como um funcionário, que tem salário fixo, no primeiro dia do mês saber quanto ele vai receber no fim do mês. Assim, ele vai saber manusear os custos dele, retendo custos se precisar, para fechar a conta e ter um lucro. Para nós [produtores] seria assim, porque conseguiríamos controlar os custos e ter um poder maior de negociação com as empresas de ração e de medicamento por saber quanto vamos receber pelo litro produzido. Assim, conseguiríamos até controlar a produção, para não ter prejuízo e ter uma segurança para poder trabalhar”, explica Flach.

Insegurança

Segundo os manifestantes, nas negociações hoje não há nada documentado “por escrito”, fica tudo no “verbal”. Ou seja, os produtores até sabem quanto vão receber, mas alegam não conseguir provar se os compradores não quiserem pagar no fim do mês ou no dia do pagamento. A reivindicação pelo cumprimento da Lei 12.669/2012 é essa, para que haja mais segurança nas negociações no setor, para que a produção entregue diariamente tenha valor jurídico, assim como o valor que o produtor vai receber por litro de leite.

Preços médios

De acordo com o Deral (Departamento de Economia Rural), da Secretaria da Agricultura e do Abastecimento, o preço médio pago por litro ao produtor no Estado em maio (referente a produtos recebidos em abril) foi de R$ 1,35, recuo de 2,5% em relação ao mês anterior (R$ 1,38) e de 4,5% em relação a maio/19 (R$ 1,41).

Já o Conseleite, que é o conselho paritário das indústrias e dos produtores de leite do Paraná, informou que só terá o valor de referência para maio no dia 16 de junho, data de sua próxima reunião, mas já projeta o litro a R$ 1,27 para a primeira quinzena de maio, tendência norteada a partir do desempenho no campo em abril, quando o valor de referência foi R$ 1,37. Em março, havia sido de R$ 1,33/litro.


Efeito estiagem e soja em alta afetam valor do leite

Apesar de o mercado do leite ter amargado prejuízos aos produtores em maio e abril, o setor leiteiro dá sinais de que terá os preços elevados nos próximos dias dado o aumento da demanda por derivados com a reabertura de pizzarias, restaurantes e panificadoras. Essa composição leva em conta ainda a estiagem, que compromete a quantidade e a qualidade da produção de silagem; a alta do valor da soja; e, o fato de as pastagens de inverno ainda não estarem prontas.

“Conforme o consumo suba gradativamente, a tendência é de que os preços subam também”, explica o técnico da área de pecuária de corte e leite do Deral, Fábio Mezzadri.

“O agro não para, pois o produtor está sempre em home office. Quanto aos laticínios, em vez de venderem queijo a pizzarias e restaurantes, passaram a vender a matéria-prima para outra indústria para a fabricação de outros derivados”, esclarece o técnico do Sistema Faep/Senar-PR responsável pela cadeia da pecuária de leite no Estado, Guilherme Dias.

Agrônomo e integrante da Câmara Técnica do Conseleite, o agrônomo José Manuel Mendonça acredita que os preços devem se elevar só a partir de agosto: “A situação ainda se agrava por dois ou três meses, pelas dificuldades enfrentadas pelo produtor e pela redução não voluntária da produção. De quanto vai ser a alta é que é a incógnita”.