Política

Em casa ou na escola?

O “Homeschooling” ou “Ensino Domiciliar” está permitido no Paraná desde que o governador Ratinho Junior sancionou a lei proposta pelo deputado estadual Marcio Pacheco, e pode ser aplicado para estudantes dos ensinos infantil, fundamental e médio

Em casa ou na escola?

“Famílias que vão se mudar para o Paraná para terem essa liberdade”

 

Cascavel – A prática do homescholling ou ensino domiciliar está permitida no Paraná desde a última segunda-feira (4), quando o governador Ratinho Junior (PSD) sancionou a lei que implementa esse modelo no estado. De acordo com a legislação, o modelo pode ser aplicado para estudantes dos ensinos infantil, fundamental e médio.

O projeto que deu origem a está lei é de autoria do deputado estadual Marcio Pacheco (PDT). A reportagem do jornal O Paraná conversou com o parlamentar para entender melhor o assunto, quais motivos levaram ele a propor a lei e se ele deverá optar por esse modelo para os filhos.

Pacheco denomina esse projeto de lei como “o maior” da sua vida política. O parlamentar define a lei como emblemática e diz que terá peso para todo o Brasil. “As famílias que já implementam ou que pretendam implementar o ensino domiciliar, terão segurança jurídica para fazer. Já temos informações que famílias de vários outros estados que vão se mudar para o Paraná para terem essa liberdade. Esse direto assegurado que é um direito constitucional, o Supremo Tribunal Federal se manifestou em 2018 e disse que o ensino domiciliar é constitucional, ou seja, a Constituição assegura esse direito às famílias, mas depende de regulamentação. O que nós fizemos aqui no estado do Paraná é isso, regulamentar para que as famílias tenham esse direito assegurado.”

De acordo com o texto, as aulas ficam sob responsabilidade dos pais ou responsáveis, com supervisão e avaliação periódica da aprendizagem por parte da Seed (Secretaria de Estado da Educação e do Esporte). A prática não é obrigatória, cabendo aos responsáveis legais optar por um modelo de ensino. A escolha deverá ser comunicada à Seed, nos termos do artigo 38 da Lei Federal nº 9.394.

“Se a família optar pelo ensino domiciliar ela será responsável em plenitude para promover o ensino, ou ela própria ou a muito bom diálogo entre as próprias famílias educadoras. Eu sou professor de português, e de fato sou. Então eu poderia, por exemplo, se implementasse o ensino domiciliar, dar aula para o meu filho e para o filho de um amigo meu. Então há esse bom entendimento entre as próprias famílias e há a possibilidade da própria família contratar professor particular dar aula de alguma matéria que não consiga implementar em casa. Mas, a responsabilidade plena para quem optar por essa modalidade é da família, o Estado não vai ceder professor.”

De acordo com Pacheco, no Brasil cerca de 20 mil famílias já adotam esse modelo de ensino, mesmo de forma não regulamentada. No Paraná, Cascavel seria uma das cidades onde as famílias mais optam por ensinarem as crianças e adolescentes fora da escola.   “A estimativa é de que no Paraná tenhamos pelo menos 3 mil famílias que já implementam o ensino domiciliar, mesmo sob esse risco de ter essa perseguição, ter essa coerção do Estado, por falta de regulamentação. No Brasil as estimativas oscilam entre 20, 30 mil famílias. Cascavel tem uma característica bem interessante também, das cidades do Paraná, a informação que temos é que Cascavel é uma ou a cidade com maior número de famílias educadoras, então é um número bastante considerável.”

Segundo ele, as famílias que irão aderir esse modelo são aquelas famílias que acreditam que educar em casa é melhor que a educação na escola.  “As famílias que defendem isso são pessoas que amam muito os seus filhos que entendem que podem fazer em casa melhor do que às vezes do que acontece na escola.”

O deputado ainda disse que o projeto vem sofrendo muitas criticas, além disso, a possível ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) contra o projeto não preocupa Pacheco.  “Eu acredito firmemente que a nossa lei prosperará e se manterá firme como foi aprovada. […] Tem sido uma prática em todo o Brasil, porque quem se opõe a esse projeto, de maneira especial na Assembleia Legislativa, o faz por uma questão ideológica, não por uma questão de avaliação de mérito por questão de honestidade intelectual, então se é contra vai contra até as últimas instâncias.” (Redação – Mateus Barbieri)

 

“Nossos filhos dependem de uma escola para conseguir ter o melhor”

 

Pacheco propôs a legislação como forma de defender a liberdade daqueles que desejam este modelo. “Esse é o papel do homem público, a pessoa ter capacidade de olhar para a realidade das outras pessoas, ter empatia, se colocar no lugar do outro. Não preciso eu estar vivendo aquela realidade para defender aquele direito. É justamente essa liberdade, que é o que o projeto prevê.”

O parlamentar acredita que, neste momento, o melhor para a família dele é manter os filhos na escola. “Hoje eu não tenho ainda essa segurança. Não tenho essa condição de acolher meus filhos em casa para promover o ensino domiciliar, então meus filhos continuam estudando na mesma forma de hoje. […] A nossa família entende que nesse momento, os nossos filhos dependem de uma escola para conseguir ter o melhor pra eles, porque eu desejo o melhor para os meus filhos. Neste momento eu entendo que o melhor para os meus filhos é uma escola e não em casa, para os meus filhos.”

Foto: João Guilherme Clos

Veja a entrevista com o Deputado Marcio Pacheco na íntegra:

 


“Negar a escola e negar o professor é desvalorizar a educação”, diz Lemos

Na contramão do pensamento de Marcio Pacheco, está o também cascavelense e deputado estadual Professor Lemos (PT), que defende que a prática de educar uma criança fora das instituições de ensino formais poderá acarretar em um prejuízo para todo o ensino público, além de desvalorizar a escola e a própria educação.

“Teremos menos pais cobrando do Estado ensino de qualidade. Essa ideia de que você vai colocar a criança em uma redoma e não deixá-la ter contato com a diversidade, com a escola, que é a responsável por formar a diversidade, é ruim. Além de retirar um direto que é fundamental, impedir que a criança vá para escola é segregar. E tem outra coisa que é muito grave: a violência contra a criança. O Brasil tem índice muito alto de violência contra a criança e adolescente e muitas dessas crianças só foram salvas dessa violência porque a escola identificou interviu e protegeu. Isso nos preocupa muito”, avalia Lemos.

De acordo com o parlamentar, no cenário atual, a maioria da população entende que a vivência da criança ou adolescente na escola é fundamental e de extrema importância para o desenvolvimento social. “Meus filhos frequentaram escolas e universidade. Eu frequentei escola e universidade. Para mim foi muito importante, para eles também. A maioria dos pais querem que o Poder Público continue provendo a educação, querem que os filhos tenham acesso escola e possam ter esse convívio com outras crianças. Eles têm o direito de frequentar escola e interagir com outros estudantes, convivendo com a diversidade, pois a escola reproduz a sociedade plural que temos. A escola proporciona a formação plena ao estudante, o que o ensino domiciliar não é capaz.”

Lemos avalia o projeto sancionado pelo governador Ratinho Junior como “absurdo” e diz que a lei desvaloriza a educação. “O ensino domiciliar nega a escola e nega o professor, isto contribuirá para a desvalorização do professor e da escola. O que está proposto na lei é negar a escola e negar o professor. Quando se nega a escola e o professor está desvalorizando a educação. Do jeito que foi proposto nessa lei do Paraná é um absurdo. Basta o pai ou o responsável comunicar à escola que ele vai ser responsável pela educação da criança e pronto. É genérico e é sem nenhum critério que garanta que essa criança terá ensino de qualidade.”

Segundo ele, países que já adotaram essa prática estão repensando o homeschooling. “Na França, por exemplo, o presidente mandou para o Congresso um projeto de lei para alterar o homeschooling. A Inglaterra está reestudando isso e tem países, como a Alemanha, que não permitem e não estão dispostos a permitir.”

A lei aprovada na Assembleia não é exclusiva no Paraná. Em 2020, a Câmara de Vereadores de Cascavel aprovou um Projeto de Lei autorizando o homeschooling no âmbito municipal. Na época, a lei foi promulgada pelo legislativo municipal, pois o prefeito Leonaldo Paranhos (PSC) não se manifestou sobre a questão.

O deputado professor Lemos, então, propôs uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) contra uma lei municipal. Em junho deste ano, o Tribunal de Justiça do Paraná acatou a ação de Lemos e julgou inconstitucional a lei de Cascavel. Segundo o parlamentar, outra ADI será proposta contra a lei aprovada pela Assembleia e sancionada pelo governador Ratinho Junior.

“Já estamos com a ação praticamente pronta. Junto com a Fetepar (Federação dos Trabalhadores na Educação no Estado Paraná) e com a CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), nós, deputados da oposição, estamos assinando a Ação Direta de Inconstitucionalidade para solicitar a revogação dessa lei, do mesmo modo que fiz com a ação que foi vitoriosa em Cascavel.”

De acordo com Lemos, a lei é inconstitucional por alterar diretrizes bases da educação brasileira. “Vamos alegar a inconstitucionalidade porque a lei de diretrizes e bases da educação brasileira não pode ser alterada por Lei Estadual e não permite essa pratica. Além disso, é clara ofensa ao Estatuto da Criança e do Adolescente ao privar a criança ou adolescente de frequentar escolas.”

A defesa da bandeira contra o homescooling não é exclusiva de Lemos, entidades importantes também defendem que essa prática vai à contramão da formação de cidadãos tolerantes e respeitosos com a diversidade, como é o caso do Todos pela Educação, que é manifestamente contra esse modelo. (Redação – Mateus Barbieri)

 

 

Foto: Deputado Professor Lemos
Créditos: Dálie Felberg/Alep

55% dos alunos confiam no ensino

Um estudo realizado pelo Instituto Crescer entre abril e agosto deste ano, que contou com 2.312 adolescentes, pais e professores de escolas públicas e privadas, mostrou que 55,2% dos estudantes confiam totalmente na qualidade da educação ofertada no Brasil e 72% deles avaliam que os professores fazem um bom trabalho. Entre os pais, esse percentual é de 74,6%.

Para dar sequência às suas formações, 71,7% dos estudantes creem que a melhor opção seja fazer um curso superior; 12,9% acreditam que sejam os cursos livres e 10,8% dão preferência aos cursos técnicos.

Confiança no futuro

Para 19% dos alunos, apesar do cenário de incertezas, é possível confiar no futuro do Brasil. Entre os pais esse percentual é de 31,2% e entre os professores, de 33,3%. Dos 51,8% dos pais que não confiam no futuro do país, 65% têm filhos matriculados na rede pública e 35% na rede particular. Informações: (Agência Brasil)