Cascavel – Em vez das 14,6 milhões de toneladas de milho esperadas, as lavouras do Paraná devem gerar em torno de 6 milhões de toneladas, a menor colheita da última década. A principal consequência dessa perda é que, em vez de vender o cereal excedente para catarinenses e gaúchos ou mesmo para fora do País, o Paraná vai disputar com seus vizinhos espaço na corrida pela compra do cereal da Argentina, do Paraguai e de outros estados, como Mato Grosso e Goiás.
A produção de proteínas animais na Região Sul do Brasil tem no Paraná um pilar estruturante no abastecimento de milho. O cereal produzido em território paranaense, principalmente na segunda safra, é crucial para a alimentação animal, especialmente de suínos e aves, em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, além do próprio Paraná. Mas a seca e a geada foram implacáveis na temporada 2020/21 e as perdas nas lavouras se repetem em praticamente todas as regiões do Estado.
A principal consequência da falta do cereal é o aumento do preço, cuja saca já passou de R$ 100. Esse cenário preocupa quem atua na produção de proteínas animais.
Escassez
Flávio Turra, gerente de desenvolvimento técnico do Sistema Ocepar, calcula que o Paraná consome de 12 milhões a 13 milhões de toneladas de milho para abastecer as cadeias de proteínas animais. Somando a primeira safra (3,1 milhões de toneladas) com a safrinha (6 milhões de toneladas), o Paraná produzirá 9 milhões de toneladas em 2020/21. “Como se esperava que o Paraná fosse produzir 17,5 milhões, em tese, sobrariam cerca de 5 milhões de toneladas. Agora, estamos com déficit de mais ou menos 4 milhões de toneladas”, estima.
O especialista lembra que essa conta não é tão simples, já que sempre há movimentação de milho entre estados e as exportações, mas serve para ilustrar a escassez do cereal vivida pela agroindústria. “De fornecedor para Santa Catarina e Rio Grande do Sul e exportador, entramos na lista de compradores de milho para abastecer a nossa demanda interna. Em síntese, vamos ter matéria-prima disponível para atender a demanda, porém, com custo alto e com uma logística mais cara”, resume o gerente no Sistema Ocepar.
O presidente do Sindiavipar (Sindicato das Indústrias de Produtos Avícolas do Estado do Paraná), Irineo Costa Rodrigues, reitera que a escassez do cereal já é uma realidade e que deve se intensificar entre o fim de 2021 e o início de 2022: “Os estoques estão baixos e só temos perspectiva de melhora nesse aspecto com a colheita da próxima safra, isso se tudo correr bem. Vamos ter que importar. Com o dólar a mais de R$ 5, o produto vai chegar caro aos portos brasileiros”.
Rodrigues demonstra preocupação ainda com a interiorização do cereal, já que a estrutura do Paraná é para escoar grãos do campo para o porto, não o contrário. “A nossa logística não foi desenhada para isso. Os portos são especializados em embarque de grãos, não no desembarque. O desenho hoje é ir com soja e milho e voltar com fertilizante. Agora, além de voltar com adubo, os caminhões e os trens vão ter que voltar com milho, e o custo desse frete vai ser contabilizado no preço final pago pelas indústrias”, aponta.
A curto prazo, na opinião de Rodrigues, os aspectos práticos para a interiorização do milho precisam ser prioridade do governo estadual, em eventuais adequações de emergência. A médio e longo prazos, é preciso ampliar a capacidade de armazenamento de grãos para que seja possível ter estoques de passagem maiores. “Não é um problema de agora, mas temos que começar a resolver. A produção aumentou muito e a armazenagem não aumentou na mesma proporção”, avalia.
Importação de milho cresce 157%
De acordo com levantamento do DTE (Departamento Técnico e Econômico) do Sistema Faep/Senar-PR, de janeiro a julho de 2021, o Paraná já importou 670 mil toneladas de milho, o que representa um aumento de 157% em relação ao mesmo período do ano passado (260 mil toneladas). Isso pagando 39% a mais por tonelada (média de US$ 204,71 em 2021 contra US$ 147,33 em 2020).
Por outro lado, as exportações de milho pelo Paraná praticamente pararam desde maio. Somando maio, junho e julho, foram exportadas 120 toneladas, contra 70,8 mil toneladas em 2020 e 1,6 milhão de tonelada em 2019.
Perspectivas: produtor segura estoque
Analista de inteligência de mercado da StoneX, João Lopes avalia que o principal impacto da quebra da safrinha de milho será a pressão sobre os preços, com potencial para ficar acima dos R$ 100 a saca de 60 quilos. Outro ponto é a redução das exportações de milho pelo País, que no ano passado ficaram em 35 milhões de toneladas. “Nesse ano deve fechar em 19 milhões de toneladas”, projeta Lopes.
Por outro lado, o analista projeta o dobro das importações de milho no Brasil, podendo passar de 3 milhões de toneladas. “Eu acho difícil faltar milho, mas, por ora, pode ser que a gente siga com um mercado pouco aquecido internamente, com poucas negociações. O produtor está esperando um pouco antes de vender para ver se o preço vai subir mais”.
Ana Paula Kowalski é técnica do DTE do Sistema Faep/Senar-PR e avalia que a demanda interna e a queda da estimativa de produção a cada nova divulgação de números são fatores de alta no preço do milho no mercado interno. Porém, o limite será sempre ditado pelo mercado internacional. “É preciso ficar de olho na Bolsa de Chicago e no dólar, componentes do cálculo da paridade de importação do milho”.
Ela observa que o preço de Chicago teve queda expressiva desde o início de julho e que a situação agora depende da divulgação de novos relatórios de produção e produtividade da safra americana, especialmente.
Setor apostas em alternativas para amenizar a crise
No médio prazo, uma das tentativas para reduzir os efeitos da crise é o incentivo aos produtores rurais a plantarem um pouco mais de milho na safra de verão, no lugar de soja. Segundo o gerente de desenvolvimento da Ocepar, Flávio Turra, o governo federal ampliou o limite de financiamento de crédito de custeio, de R$ 3 milhões para R$ 4 milhões a produtores maiores, na tentativa de obter esse resultado. Aos médios, o aumento foi de R$ 1,5 milhão para R$ 1,7 milhão.
Hoje, o preço do milho tem uma relação favorável em relação à soja. Nesse cenário, do ponto vista financeiro, em condições ideais de clima, o cereal é mais rentável do que a oleaginosa, segundo o gerente no Sistema Ocepar. “Mesmo assim, o aumento não deve ser tão expressivo. A safra de milho de verão é de 3 milhões de toneladas. Se aumentarmos, vamos para algo em torno de 3,5 milhões de toneladas. O crescimento não deve passar disso”.
O presidente do Sindiavipar, Irineo Costa Rodrigues, confirma a importância do aumento na área dedicada ao milho verão. Para isso, o Sindiavipar tem incentivado que as agroindústrias façam contratos de garantia de preço mínimo ao cereal, mesmo que o preço esteja menor na hora da colheita. “Mesmo que seja necessário pagar um pouco a mais pelo milho, a depender das condições de mercado, para as empresas vale a pena oferecer esse tipo de contrato porque ficará mais barato do que importar”, aponta.
As agroindústrias de modo geral estão sendo incentivadas a complementar seus portfólios de produtos, com apoio a plantas como trigo, triticale, aveia e sorgo, todos com potencial para substituir em parte o milho. “Esses outros grãos podem ir para a pecuária. Isso ocupa menos milho, que pode ser destinado a frangos e suínos. Temos que incentivar o plantio, principalmente em regiões que não são adequadas para o milho segundo safra”, propõe Rodrigues.
Fonte: Faep