Cotidiano

Espaços públicos, lojas e residências da Barra aderem à energia solar

2016 911032238-201605211530240094.jpg_20160521.jpg RIO – Em meio às más notícias para o meio ambiente, como o possível cancelamento do projeto de dragagem das lagoas da região, o morador da Barra tem pelo menos um motivo para acordar de bom humor hoje, Dia Mundial do Meio Ambiente. Até o fim do ano, nos tetos das casas e nas praias, a visão de painéis fotovoltaicos ? ou placas geradoras de energia solar ? se tornará mais comum. A estimativa é que eles estarão presentes em pelo menos 40 dos 98 quiosques da Barra e do Recreio. Nos parques da região, a energia limpa já é realidade. Enquanto isso, nas residências, desde março se tornou mais fácil instalar o sistema.

Há anos os quiosqueiros da Barra e do Recreio aguardavam uma reforma nos seus estabelecimentos. Após brigas judiciais e diversas propostas da concessionária Orla Rio, a prefeitura autorizou as obras. Enquanto trabalha em um contêiner provisório, Rosana Lameirinhas, presidente da Coopquiosque, cooperativa que representa os quiosqueiros da orla da cidade, espera seu novo espaço, equipado com placas fotovoltaicas, ficar pronto.

? Estamos todos com grande expectativa. Com os novos quiosques, o faturamento deve melhorar ? diz Rosana. ? E as placas vão ajudar a diminuir os gastos. A energia elétrica está muito cara.

Com isso, os quiosques vão entrar em uma lista crescente de estabelecimentos comerciais, residências e espaços públicos que são alimentados por energia solar na região. A tradição da Barra como polo gerador de energia limpa remonta à instalação do Parque Natural Municipal da Prainha (PNM), em 2001. Por questões estruturais, toda a energia gerada no local precisa vir dos painéis. Os outros três grandes parques da região, o Chico Mendes, o Bosque da Barra e o Parque de Grumari, são parcialmente alimentados com energia solar. Para Alexandre Chagas, gestor do Parque de Grumari, aproveitar a melhor a luz natural poderia ser uma solução para a região como um todo, desde que usada como complemento à energia elétrica tradicional, que vem pelo sistema da concessionária ? no caso do Rio, a Light.

? Todos os lugares deveriam ter sistema duplo. Assim, não se sobrecarrega a matriz energética. O nosso modelo chama a atenção; as pessoas costumam nos perguntar como funciona ? diz.

2016 911028729-201605211517370082.jpg_20160521.jpgA complementação é uma necessidade, diz Chagas. Ele conta que, em semanas nubladas, pode haver quedas de luz no PNM, onde também fica a sede do Parque de Grumari. Mas o fato de haver poucos eletrodomésticos no local ajuda na economia:

? Só temos um micro-ondas, que usamos pouco, e uma geladeira. Não temos chuveiro elétrico, por exemplo. No geral, dá supercerto. O pessoal também usa a energia com parcimônia; já existe essa conscientização.

Como não há residência com energia elétrica na Prainha, o parque já foi concebido com essa proposta de captar energia solar, explica Abilio Fernandes, gestor do PNM:

? Nos outros parques da cidade, existe o sistema inteligente. Ou seja, quando acaba o sol, entra a energia elétrica para compensar. Conseguimos armazenar energia solar para cerca de três dias, mas também estamos querendo adotar esse modelo.

Nos quiosques da Barra e do Recreio, o sistema será compartilhado, mas na Prainha os únicos dois quiosqueiros não têm essa opção. José Alla, proprietário do Soul Prainha Rio, usa o combo de placas solares com uma bateria para conseguir manter a operação diária.

? Se ficar nublado ou chover, tenho energia para cerca de dois dias por meio da bateria ? conta ele. ? Dá até para ver TV, mas, se fico sem luz, perco a configuração do sinal.

Alla instalou seu equipamento há três anos. Gastou cerca de R$ 25 mil:

? O mais caro foi a bateria, mas não dá para viver sem ela. Preciso de um suporte.

2016 913486935-201606021017179486.jpg_20160602.jpgAlla tem pelo menos a sorte de estar em uma das melhores áreas do Rio para se aproveitar a luz solar. Maurício Ribeiro, diretor da Green Solar, empresa de soluções sustentáveis na área de energia, explica que Barra da Tijuca, Recreio e Jacarepaguá são locais ideais para a instalação de painéis:

? A Barra tem muitos condomínios de casas, e os telhados são ótimos locais para a instalação de placas solares. Há também muitos condomínios de prédios com grandes áreas entre eles. Ou seja, há espaço para instalar o sistema e ratear a economia pelo condomínio.

O especialista compara a região a Copacabana:

? Lá é o contrário. Ali há muita sombra, e os prédios têm uma área limitada. Não são condomínios com cinco blocos e estacionamento. São prédios colados uns nos outros. Isso dificulta a instalação e diminui a efetividade das placas.

Para quem se interessa pela ideia de gerar parte de sua própria energia elétrica, o processo ficou mais fácil recentemente. A resolução normativa 482 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), assinada em 17 de abril de 2012, regulamentou como deve ser feita a microgeração de energia. E, em 24 de novembro do ano passado, a resolução 687 alterou o texto de 2012 e melhorou ainda mais as condições para quem quer gerar a própria energia. As mudanças começaram para valer em março deste ano.

Dentre as medidas está a redução da burocracia. Antes, a concessionária demorava até 90 dias para registrar um sistema de energia solar. Hoje, são 34 dias. Tornou-se possível também a chamada geração compartilhada, que é quando a energia gerada em uma casa abate o valor na conta de outra. É necessário apenas provar um vínculo entre as duas unidades. Um pai, por exemplo, pode abater parte de sua conta de luz com a energia gerada na casa de seu filho.

A principal mudança para a Barra é a possibilidade de se partilhar os créditos gerados por unidades dentro de um condomínio. Assim, os moradores podem instalar um grande número de painéis, rateando o custo dos equipamentos e dividindo a economia entre as residências.

Preço do painel ainda é entrave

Em setembro do ano passado, com a mulher grávida e trancada em casa, num condomínio da Taquara, com medo da zika, o engenheiro Felipe Rodrigues estava abusando do ar-condicionado. Cansado de receber contas de R$ 500 da Light todo mês, ele decidiu comprar um painel solar.

Na região de Jacarepaguá, os prédios costumam ter área limitada, mas são mais baixos, o que evita sombras, inimigas deste tipo de geração de energia. Rodrigues foi o primeiro no seu condomínio a instalar uma placa, e afirma ter percebido no bolso os benefícios.

? Por mês, eu tenho desconto de algo entre R$ 40 a R$ 50 na minha conta de luz ? conta ele.

Rodrigues comprou a placa por R$ 2.500. Como não tem permissão para instalar nada no telhado que cobre parte da sua varanda, toda manhã retira-a de casa e deixa-a até a noite no quintal em frente ao apartamento, sustentada por duas cadeiras. Conectada diretamente na rede elétrica, ela ajuda a suprir parte do gasto mensal de energia.

2016 911029732-201605211520230084.jpg_20160521.jpgPara Rodrigues, a solução funcionou tão bem que ele está em vias de instalar oito painéis na casa de sua sogra, também em Jacarepaguá, e, no início do ano, fundou uma empresa, a Xestec Energia Solar. Por meio dela, compra e instala painéis em moradias individuais. Conseguiu clientes na Praça Seca, no Tanque e no município de Bom Retiro, em Santa Catarina.

? Neste início, estou tentando comer pelas beiradas, atendendo quem não tem dinheiro para montar um sistema robusto e quer começar a gerar energia com apenas uma ou duas placas ? explica o engenheiro. ? Sou um peixinho nadando entre tubarões.

Ele está entrando em um mercado em franca expansão. Maurício Ribeiro, da Green Solar, fundou a empresa há quatro anos.

? Nos quatro primeiros meses do ano passado, tínhamos seis projetos de pequeno porte. Este ano, já temos 20, sendo três de tamanho médio ? contabiliza.

Para Ribeiro, o alto custo da energia está fazendo as pessoas recorrerem à microgeração para pagar menos. Em alguns casos, é possível até zerar a conta de luz.

? O que se faz é gerar energia e jogar no sistema da concessionária ? explica. ? A empresa então registra esse crédito e lança na sua conta de luz. Se você tiver um abatimento maior do que o seu consumo, o crédito em energia fica acumulado.

Uma casa de veraneio no Recreio, por exemplo, que passe a maior parte do ano vazia, poderia ter toda a sua conta abatida com a instalação de uma quantidade suficiente de painéis.

Nem tudo são flores, porém. O preço dos painéis ainda é uma barreira, mesmo o equipamento tendo isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do ICMS.

? Pode-se dizer que o projeto mais barato para uma residência sai por uns R$ 19 mil; depende de cada caso. O maior que fiz tinha 200 placas fotovoltaicas, e gerou uma economia de R$ 7 mil mensais na conta de luz da empresa que me contratou. Saiu tudo por uns R$ 400 mil, o que vai ser compensado em quatro a cinco anos ? diz Ribeiro.

Mesmo diante do custo, a designer de interiores Patricia Franco afirma que ela e a sócia, a arquiteta Claudia Pimenta, recebem cada vez mais pedidos para instalar painéis solares quando o cliente faz uma reforma em casa.

? De três anos para cá, vimos que há uma preocupação bem grande dos nosso clientes com sustentabilidade. Em muitos casos, a instalação é bem simples ? diz Patricia.

2016 913300681-casa na barra da tijuca com placas solares - projeto da dupla.jpgPara quem acha as placas feias, a designer afirma que é possível ocultá-las, mas isso demanda uma obra mais complexa. Para ela, o que move alguém a adotá-las é a economia de energia:

? Os clientes querem reduzir o gasto com energia, mas também estão preocupados em fazer um projeto que junte beleza e economia. Isso vai desde o reúso de água até uma iluminação eficiente, culminando na instalação das placas.

Muito mais do que a estética, a dona de casa Marluce Moser prezou a sustentabilidade e a economia. Na sua casa, a energia solar serve para aquecer a água da piscina e a do chuveiro:

? Além de ser correto ecologicamente, é menos custoso ? explica Marluce, que mora na Barra desde 2008. ? Já usávamos o sistema quando vivíamos em Brasília. Lá tem sol o dia inteiro, fazia sentido. Gostamos do resultado e trouxemos os aparelhos todos para o Rio. No início, as crianças até diziam que não iríamos precisar, por causa do calor da cidade. Mas no inverno cai bem.