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Tarifaço: Nova ameaça preocupa o Oeste

O Tarifaço traz uma nova ameaça: descubra como a taxação de 100% dos produtos brasileiros pode afetar o comércio - Foto : Jonathan Campos / AEN
O Tarifaço traz uma nova ameaça: descubra como a taxação de 100% dos produtos brasileiros pode afetar o comércio - Foto : Jonathan Campos / AEN

Palotina e Paraná - Como se já não bastasse a tarifação de 50% sobre os produtos brasileiros a partir de 1º de agosto, anunciada pelo presidente americano Donald Trump, surge agora uma nova ameaça, ainda mais letal. A Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), defende a taxação de 100% dos produtos brasileiros exportados para o mundo. A declaração foi feita pelo secretário-geral da aliança militar, Mark Rutte, em virtude de o Brasil manter relações comerciais com a Rússia. Segundo ele, Brasil, China e Índia também têm uma coparticipação, mesmo que indireta, nas mortes de ucranianos por conta da guerra travada com a Rússia. Ao comprar gás e petróleo dos russos, o Brasil estaria fortalecendo ainda mais a Rússia e por isso, deveria sofrer tais sanções.

O pronunciamento elevou ainda mais a tensão no setor produtivo e principalmente, a cadeia de pescados. Em entrevista concedida à equipe de reportagem do Jornal O Paraná, o presidente do Sindicato Rural de Palotina e também produtor de tilápia, Edmilson Zabott, teme o pior se essa medida de taxação total dos produtos brasileiros de confirmar.

Foto: Jaelson Lucas/ Arquivo AEN

Por trás dos tanques e viveiros que movimentam a piscicultura brasileira, especialmente no Paraná, cresce a preocupação com os rumos do setor diante da decisão dos Estados Unidos de impor uma tarifa de 50% sobre as importações de produtos brasileiros, incluindo pescados.

“Essa taxação vai ser extremamente grave, com reflexos econômicos e gerando desemprego”, resume Edmilson Zabot. O Paraná é responsável por mais de 40% da produção nacional de tilápia e pilar central para que o Brasil ocupasse o posto de quarto maior produtor mundial de pescado.

A preocupação de Zabot reflete um cenário que vem se desenhando há meses, mas que agora toma contornos mais dramáticos. Segundo ele, o impacto não se limita à perda de competitividade. O risco maior está no desmantelamento de uma cadeia que ainda busca se firmar como alternativa econômica, com investimentos pesados e financiamentos que ainda estão longe de serem quitados.

Produção em risco

“O mercado americano está sendo um excelente mercado. Com a taxação, outros países deverão assumir esse mercado americano no lugar do Brasil e, para recuperar isso depois, vai custar muito caro”, alerta Zabot.

A cadeia da tilápia vive um paradoxo: apesar do crescimento contínuo da produção, o consumo interno segue estagnado, pressionado pela queda no poder aquisitivo da população e pelo elevado custo de produção. A alternativa natural, portanto, passou a ser a exportação — especialmente para os mercados mais exigentes, como Estados Unidos e Japão. No entanto, o setor agora se vê encurralado.

“Os produtores de pescados se endividaram, e muito, para atender o exigente consumidor dos Estados Unidos e agora vê tudo isso ruir”, lamenta Zabot. “O consumo do mercado nacional está muito baixo por causa do pífio poder aquisitivo da população. Agora, temos a alta do IOF, para encarecer ainda mais a produção. Não há como viabilizar a atividade pesqueira sem recorrer aos financiamentos. A situação é grave.”

A possibilidade de perder o mercado americano é ainda mais sensível porque o setor já havia enfrentado dificuldades para acessar o mercado europeu, hoje praticamente fechado para a tilápia brasileira. “Conseguimos abrir o mercado americano e japonês, e agora podemos perder esse espaço também”, pontua.

Efeitos imediatos

Apesar de a tarifa ainda não ter entrado em vigor, seus efeitos já começam a ser sentidos na prática. Empresas que atuam diretamente com a exportação relatam cancelamentos de contratos e insegurança em ampliar a produção ou manter empregos. “Estive em uma empresa que trabalha com exportação de peixes que já cancelou vários contratos”, relata Zabot. Outras empresas estão dando férias coletivas aos funcionários por conta da redução da produção para fins de exportação.

A pressão sobre o setor é agravada por uma série de fatores que vão além do comércio exterior. “A atividade já sofre há anos com o preço elevado da energia elétrica, das crises atribuídas às intempéries climáticas, Covid-19, alto custo da ração, falta de mão de obra, pagamento de encargos e licenças, e por aí vai”, salienta Zabot.

Nesse contexto, uma nova taxação torna o produto brasileiro mais caro e, portanto, menos competitivo frente aos concorrentes. Países asiáticos, como Indonésia, Vietnã e Tailândia, já se preparam para ocupar o espaço que o Brasil deixará nos Estados Unidos, oferecendo preços mais atraentes e cadeias produtivas igualmente estruturadas para atender o padrão americano.

A saída desse mercado não só compromete o presente da piscicultura brasileira, como dificulta qualquer retomada futura. “O mercado americano é o mais exigente para a tilápia. Se sairmos, dificilmente voltaremos nas mesmas condições”.

Emprego e economia comprometidos

A piscicultura brasileira, e especialmente a paranaense, criou nos últimos anos uma estrutura robusta, com milhares de empregos diretos e indiretos em torno da criação e processamento da tilápia. O impacto econômico da nova tarifa pode romper esse ciclo.

“Caso venhamos a sofrer ainda mais taxação, a cadeia produtiva do pescado ficará inviável”, alerta Zabot. Na avaliação dele, o país corre o risco de ver produtores abandonando a atividade, endividados e sem alternativas para escoar sua produção. “A tragédia será maior pois é uma cadeia ainda em formação, com alto grau de endividamento dos produtores”.

Enquanto o governo brasileiro avalia possíveis medidas para contestar a decisão americana em órgãos internacionais, produtores seguem à espera de soluções. Por ora, a perspectiva é de incerteza.

Em um cenário de baixa demanda interna, custos elevados e mercado externo ameaçado, a piscicultura brasileira enfrenta seu momento mais desafiador em décadas. O temor maior não é apenas perder espaço. É ver um setor inteiro, construído com esforço e investimento, desmoronar antes mesmo de alcançar a maturidade.